Debate sobre os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na Rio+20 envolve da geopolítica à mudança nos hábitos de consumo
POR CARLOS TAUTZ
As intenções são nobres, porém vagas. “O mundo enfrenta uma gama mais ampla de desafios ao desenvolvimento sustentável (…) e uma ação coordenada é necessária.” As áreas a serem cobertas, amplas demais, como sempre convêm aos textos diplomáticos: segurança alimentar, água, energia, empregos “verdes”, trabalho decente e inclusão social, consumo, produção e cidades sustentáveis, mudanças climáticas, diversidade biológica e oceanos, redução de riscos de desastres e resiliência.
Apesar de fazerem parte de problemas que envolvem da geopolítica à economia, da ciência à mudança de hábitos, esses temas constam dos chamados Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) sugeridos pelo Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global, que assessora o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. (acesse o documento em un.org/gsp e leia mais em Entrevista com Fernando Lyrio)
Em 30 de janeiro, Ban divulgou o relatório Pessoas resilientes, planeta resiliente: um futuro que vale a pena escolher, calhamaço de 99 páginas produzido pelo painel que servirá de base para discussões preparatórias à Rio+20, conferência da ONU que será realizada de 20 a 22 de junho no Rio. Os ODS seriam uma espécie de continuação dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), o amplo e controverso leque de propostas que a ONU lançou em julho de 2001 para reduzir a pobreza.
“Os ODM tiveram muito sucesso em galvanizar apoio para a redução da pobreza global – provendo metas claras para o avanço e estimulando tanto a produção de novos dados relacionados à pobreza quanto compromissos adicionais”, diz o documento, que aponta a necessidade de os governos assumirem novos encargos para o pós 2015, quando já deveriam ter sido implementados todos os oito ODM. O texto do painel sobre sustentabilidade desconsidera as críticas sobre a extrema limitação dos ODM, que seriam destinados a apenas parte dos pobres do mundo, caso fossem transformados em ações concretas.
Se adotados, os ODS, por sua vez, deverão ser aplicados a todos os países, e não somente àqueles em desenvolvimento talvez, como lição aprendida com a crise financeira, que em 2008 atingiu indistintamente tanto as nações ricas quanto as pobres –, e terão metas intermediárias até o horizonte final de 2030. O contexto da realização da Rio+20, entretanto, não gera otimismo. “Os chefes de Estado estarão mais interessados em tratar da crise financeira imediata do que debater o modelo civilizatório”, observa o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense Carlos Walter Porto Gonçalves. “Todo o documento é vago”, critica o professor, que na década de 1980 trabalhou com Chico Mendes. “É sintomático que o relatório pouco se refira ao Protocolo de Kyoto, que ainda tinha consensos, metas e princípios razoáveis”, observa.
Aron Belinky, coordenador de processos internacionais do Instituto Vitae Civilis, e membro da organização da “Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental”, que reunirá milhares de ativistas no Aterro do Flamengo de 15 a 23 de junho, concorda que é grande o grau de abstração do texto do painel da ONU. “Além disso, o tempo para debater questões tão diversas será muito pequeno”, completa. Para Belinky, é necessário priorizar temas, métricas e indicadores de progresso dos ODS, tendo claro que o processo não será concluído no Rio. “O horizonte para a conclusão das negociações é mesmo 2015”, opina. “Também precisamos definir objetivos mensuráveis e tempos de mudança, além de indicar qual será o arranjo institucional que tratará da implementação dos ODS”, completa.
Esta última discussão, aliás, remete à ideia da criação de uma espécie de “organização mundial do meio ambiente”, mas Belinky lembra que, neste caso, o debate terá de ser muito mais amplo e não será fácil. “Afinal”, diz, “os ODS não tratam apenas de temas ambientais. É preciso que o arranjo institucional seja qualificado e tenha representatividade para monitorar o cumprimento de metas e responsabilidades”.
Nesse contexto, o Brasil sugere à conferência, em documento de 1o de novembro de 2011, 25 temas para o debate, incluindo a erradicação da pobreza extrema, passando pelo reforço do multilateralismo com participação da sociedade civil e chegando à biodiversidade e ao “empoderamento” das mulheres. Essas propostas, também com enorme grau de generalidade, compõem o que o País chama de “Dez Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”. Mas seu tom é tão genérico quanto a proposta da ONU para os ODS, o que coloca dúvidas sobre o sucesso da Rio+20.[:en]Debate sobre os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na Rio+20 envolve da geopolítica à mudança nos hábitos de consumo
POR CARLOS TAUTZ
As intenções são nobres, porém vagas. “O mundo enfrenta uma gama mais ampla de desafios ao desenvolvimento sustentável (…) e uma ação coordenada é necessária.” As áreas a serem cobertas, amplas demais, como sempre convêm aos textos diplomáticos: segurança alimentar, água, energia, empregos “verdes”, trabalho decente e inclusão social, consumo, produção e cidades sustentáveis, mudanças climáticas, diversidade biológica e oceanos, redução de riscos de desastres e resiliência.
Apesar de fazerem parte de problemas que envolvem da geopolítica à economia, da ciência à mudança de hábitos, esses temas constam dos chamados Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) sugeridos pelo Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global, que assessora o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. (acesse o documento em un.org/gsp e leia mais em Entrevista com Fernando Lyrio)
Em 30 de janeiro, Ban divulgou o relatório Pessoas resilientes, planeta resiliente: um futuro que vale a pena escolher, calhamaço de 99 páginas produzido pelo painel que servirá de base para discussões preparatórias à Rio+20, conferência da ONU que será realizada de 20 a 22 de junho no Rio. Os ODS seriam uma espécie de continuação dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), o amplo e controverso leque de propostas que a ONU lançou em julho de 2001 para reduzir a pobreza.
“Os ODM tiveram muito sucesso em galvanizar apoio para a redução da pobreza global – provendo metas claras para o avanço e estimulando tanto a produção de novos dados relacionados à pobreza quanto compromissos adicionais”, diz o documento, que aponta a necessidade de os governos assumirem novos encargos para o pós 2015, quando já deveriam ter sido implementados todos os oito ODM. O texto do painel sobre sustentabilidade desconsidera as críticas sobre a extrema limitação dos ODM, que seriam destinados a apenas parte dos pobres do mundo, caso fossem transformados em ações concretas.
Se adotados, os ODS, por sua vez, deverão ser aplicados a todos os países, e não somente àqueles em desenvolvimento talvez, como lição aprendida com a crise financeira, que em 2008 atingiu indistintamente tanto as nações ricas quanto as pobres –, e terão metas intermediárias até o horizonte final de 2030. O contexto da realização da Rio+20, entretanto, não gera otimismo. “Os chefes de Estado estarão mais interessados em tratar da crise financeira imediata do que debater o modelo civilizatório”, observa o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal Fluminense Carlos Walter Porto Gonçalves. “Todo o documento é vago”, critica o professor, que na década de 1980 trabalhou com Chico Mendes. “É sintomático que o relatório pouco se refira ao Protocolo de Kyoto, que ainda tinha consensos, metas e princípios razoáveis”, observa.
Aron Belinky, coordenador de processos internacionais do Instituto Vitae Civilis, e membro da organização da “Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental”, que reunirá milhares de ativistas no Aterro do Flamengo de 15 a 23 de junho, concorda que é grande o grau de abstração do texto do painel da ONU. “Além disso, o tempo para debater questões tão diversas será muito pequeno”, completa. Para Belinky, é necessário priorizar temas, métricas e indicadores de progresso dos ODS, tendo claro que o processo não será concluído no Rio. “O horizonte para a conclusão das negociações é mesmo 2015”, opina. “Também precisamos definir objetivos mensuráveis e tempos de mudança, além de indicar qual será o arranjo institucional que tratará da implementação dos ODS”, completa.
Esta última discussão, aliás, remete à ideia da criação de uma espécie de “organização mundial do meio ambiente”, mas Belinky lembra que, neste caso, o debate terá de ser muito mais amplo e não será fácil. “Afinal”, diz, “os ODS não tratam apenas de temas ambientais. É preciso que o arranjo institucional seja qualificado e tenha representatividade para monitorar o cumprimento de metas e responsabilidades”.
Nesse contexto, o Brasil sugere à conferência, em documento de 1o de novembro de 2011, 25 temas para o debate, incluindo a erradicação da pobreza extrema, passando pelo reforço do multilateralismo com participação da sociedade civil e chegando à biodiversidade e ao “empoderamento” das mulheres. Essas propostas, também com enorme grau de generalidade, compõem o que o País chama de “Dez Objetivos do Desenvolvimento Sustentável”. Mas seu tom é tão genérico quanto a proposta da ONU para os ODS, o que coloca dúvidas sobre o sucesso da Rio+20.