Vertentes que (ainda) não constam do dicionário indicam a busca de alternativas ao sistema econômico tradicional ou de novas formas de guiá-lo
De escala, de guerra, de mercado, dirigida, doméstica, fechada, invisível, popular e mais outros nove termos caracterizam a palavra economia no dicionário Houaiss. A ciência “que estuda os fenômenos relacionados com a obtenção e a utilização dos recursos materiais necessários ao bem-estar”, segundo o Houaiss, tem ainda outras vertentes que (ainda) não aparecem em dicionários.
Essa variedade representa a busca de alternativas ao sistema econômico tradicional ou de novas formas de guiá-lo. Uma indicação de que nem só de trocas financeiras vivem as economias pelo mundo. A seguir, um glossário com mais alguns termos econômicos (ou seriam mais sociais?) que despontam por aí, relacionados ao desenvolvimento sustentável e que serão cada vez mais recorrentes nestes tempos de Rio+20.
ECONOMIA VERDE
Possivelmente, é o verbete mais polêmico do nosso glossário, porque ainda não tem uma definição precisa e clara, está passível de críticas e ressalvas. É um elemento no caminho rumo ao Desenvolvimento Sustentável e trata de processos que revertem tendências insustentáveis atuais, tanto sociais quanto ambientais.
Segundo definição do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), a Economia Verde é aquela que promove a melhoria do bem-estar humano e da igualdade, e, ao mesmo tempo, reduz significativamente os riscos ambientais. As três características principais das atividades dessa economia são: reduzir a emissão de carbono, ser eficiente no uso de recursos naturais e ser socialmente inclusiva.
Um dos termos centrais da próxima Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, recebe duras críticas de diversos atores da sociedade civil. Há muita desconfiança de que uma espécie de “manto verde” seja usado por segmentos do mercado para encobrir a falência do modelo de economia em curso e, assim, dar sobrevida a um sistema de exploração e injustiças. Alguns especialistas ressaltam que a economia verde é aquela que precisa levar em conta os limites ecossistêmicos do planeta, resgatando conceitos da chamada Economia Ecológica.
ECONOMIA ECOLÓGICA
Embora o termo ainda esteja em construção, a Economia Ecológica busca a integração entre as disciplinas da economia e da ecologia, e as demais disciplinas correlacionadas, para uma análise integrada dos dois sistemas. Sua origem data do fim dos anos 60 e início dos 70, quando o crescimento do movimento ambientalista e o choque do petróleo fizeram dos recursos naturais, da energia e do ambiente em geral um tema de importância econômica, social e política. A Economia Ecológica trouxe para a superfície a crítica ao modelo de desenvolvimento econômico vigente, apontando para um conflito entre crescimento econômico e conservação dos recursos ambientais.
A Economia Ecológica funda-se, assim, no princípio de que o funcionamento do sistema econômico deve ser compreendido tendo-se em vista as condições do mundo biofísico sobre o qual este se realiza, uma vez que é deste que derivam a energia e a matéria-prima para o próprio funcionamento da economia.
ECONOMIA CRIATIVA
“Novas ideias, não dinheiro ou máquinas, são as fontes de sucesso hoje, e a grande fonte de satisfação pessoal também”, escreveu John Howkins, autor do livro The Creative Economy – publicado em 2001 e um marco no conceito (mais em Entrevista com John Howkins). A Economia Criativa trata dos setores culturais, de lazer, moda, arquitetura, design, propaganda e tecnologias de informação – como a criação de softwares e games –, que formam as “indústrias criativas”.
Essa economia envolve tanto o que se produz nas indústrias criativas quanto seu impacto nos setores tradicionais, por exemplo como a moda influencia a indústria têxtil ou a arquitetura, a construção civil. O conceito deu origem a outro termo, “cidades criativas”, aquelas em que esses setores ganham autonomia, transformando-se no principal vetor de desenvolvimento cultural e social de uma comunidade – segundo o Ministério da Cultura.
ECONOMIA ESTACIONÁRIA (STEADY-STATE)
É um estágio previsto para países já desenvolvidos, chamado “prosperidade sem crescimento”. A sociedade continua melhorando sua qualidade de vida sem aumentar os índices de econômicos, como de consumo e produção. Isso diminuiria a pressão sobre os ecossistemas e recursos naturais, dando fôlego para que outras nações se desenvolvam e atinjam o mesmo estado de prosperidade. Peter Victor, entrevistado por Página22 na edição 59, estudou esse modelo para o Canadá. A economia pararia de crescer, as pessoas trabalhariam menos horas e consumiriam menos por status, valorizando mais os vínculos sociais. O resultado é pleno emprego, distribuição de renda, equilíbrio fiscal e redução nas emissões de carbono.
ECONOMIA SOLIDÁRIA
Conforme definição do Ministério do Trabalho e Emprego (que possui uma secretaria especializada no assunto), são atividades que se opõem à exploração do trabalho e dos recursos naturais e consideram o ser humano como sujeito e finalidade da atividade econômica. Assim, a Economia Solidária é a do cooperativismo, que visa inclusão social e compartilhamento dos resultados alcançados pelos participantes e pela comunidade local.
Além de associações e cooperativas, são, por exemplo, empresas autogestadas, grupos de produção ou clubes de trocas que produzam serviços e bens de consumo consciente. Nessa área, os participantes exercem a autogestão dos processos de trabalho, das definições estratégicas e cotidianas, da direção e coordenação das ações. Tudo isso, de forma independente, ainda que recebam ajudas externas financeiras ou de capacitação.
MOEDA SOCIAL
Especialista nesse setor, Heloísa Primavera define, em entrevista de vídeo a Página22 (veja no canal no site), como a moeda “contrária” ao dinheiro oficial, e considera “a moeda dos bancos, do sistema financeiro e concentradora da riqueza em poucas mãos, profundamente antissocial”. Sua criação se inspira nos conceitos da economia solidária de articulação e trocas da economia, na produção e comercialização de produtos que vão além da lógica capitalista de acumulação e apropriação.
É considerada um instrumento de desenvolvimento local, destinado a beneficiar o mercado de trabalho dos grupos que participam da economia da localidade. Seu uso é restrito, e a sua circulação beneficia a redistribuição dos recursos na esfera da própria comunidade. Exemplo clássico é o do Banco Palmas, em Fortaleza, que criou a moeda “palma” e incentiva o microcrédito. Mas há também o caso do Time Bank, que proporciona a negociação de favores entre as pessoas (leia o Estalo da edição 56: “Trocas no tempo”).
EMPREENDEDORISMO SOCIAL
O termo foi cunhado por Bill Drayton, fundador da Ashoka, ao perceber a existência de indivíduos que combinam pragmatismo, compromisso com resultados, visão de futuro e criatividade para realizar profundas transformações sociais. Difere do empreendedorismo tradicional, pois tenta maximizar retornos sociais no lugar de maximizar o lucro.
Um dos desobramentos dessa visão foi o florecimento dos chamados negócios sociais ou inclusivos. Segundo a Artemísia, organização brasileira de negócios sociais, produtos ou serviços de empreendedores sociais devem ser capazes de sustentar financeiramente a empresa ao mesmo tempo que contribuem para desenvolver uma região, cidade ou comunidade, melhorando a qualidade de vida da população e incluindo a população marginalizada na cadeia de valor de produção. Também devem apresentar inovações aos modelos de negócio tradicionais.