No início dos anos 1950, voluntários foram convidados para participar de um experimento sobre percepção. Sentados em grupo em uma sala, a eles era exibido um cartaz contendo linhas retas de variados tamanhos, demarcadas. A eles era solicitado que se apontasse, em voz alta e em sequência, qual das linhas à direita possuía o mesmo tamanho da linha à esquerda. O que os voluntários não sabiam é que eram os únicos na sala: os demais participantes eram atores.
O que o psicólogo Solomon Asch buscava com esse experimento, na verdade, era entender mecanismos de conformidade social. E os resultados foram impressionantes: depois de respostas visivelmente incorretas dadas pelos atores, cerca de um terço dos voluntários acabava cedendo à pressão do grupo e escolhendo a mesma alternativa – alguns até que resistiam no começo, mas, após receber olhares de estranhamento dos demais, acabavam aderindo à “sabedoria coletiva” (alguns dos “experimentos de conformidade de Asch” podem ser vistos neste link e neste).
O “paradigma de Asch” é usado pela Psicologia Social até hoje, e entendê-lo melhor pode ser a chave para mudanças importantes no comportamento das pessoas.
O experimento observou dois efeitos da pressão de grupo sobre o indivíduo, um normativo, e outro informativo. O normativo diz respeito à condição humana de “ser social”, do nosso desejo de viver em e pertencer a grupos. Ser o único “do contra”, no experimento acima, carregava um estigma negativo. De fato, se um dos atores também respondesse corretamente, ou se a resposta do voluntário não era tornada pública para os demais participantes, a conformidade com a maioria era bastante reduzida.
Segundo a perspectiva informativa, o que os outros pensam e como veem o mundo informam nossa própria percepção sobre qual é a conduta apropriada (ou esperada) em uma determinada situação. E isso pode variar dentro de um mesmo contexto cultural e jurídico: enquanto nas ruas de São Paulo predomina a sujeira, suas estações de metrô estão entre as mais limpas do mundo. Por quê? A equipe de limpeza é acionada ao menor sinal de sujeira e, em uma estação limpa, a “norma” social entendida é de que lá não se joga sujeira no chão — é alto o custo psicossocial da violação dessa norma.
Em artigo publicado na Science, pesquisadores da Universidade de Groningen testaram na prática a teoria das “janelas quebradas” (a ideia de que desordem social e pequenos delitos levam a violações mais graves). Em um envelope parcialmente inserido em uma caixa de correio, deixaram uma nota de 5 euros visivelmente à mostra. Quando esta caixa de correio estava cercada de sujeira ou de pichação, o dobro de pessoas furtava o dinheiro. Em outro experimento, três vezes mais motoristas cruzavam um atalho proibido para buscar seus carros em um estacionamento se, ao lado da entrada, houvesse bicicletas acorrentadas ilegalmente a uma grade (veja estudo).
Em vez de penas cada vez mais severas, o país das leis que “não pegam” poderia se beneficiar de uma mudança das normas sociais em vigor. A moralização não precisa começar em Brasília, mas no cotidiano de todos nós. O bom exemplo não precisa — aliás, nem deve — ser exaltado como um ato heroico: ele está ao alcance de todos. Já os maus exemplos, por menores e mais banais que possam parecer, erodem nosso senso de obrigação com os outros.
*Fabio F. Storino é Pesquisador Sênior do GVces[:en]
No início dos anos 1950, voluntários foram convidados para participar de um experimento sobre percepção. Sentados em grupo em uma sala, a eles era exibido um cartaz contendo linhas retas de variados tamanhos, demarcadas. A eles era solicitado que se apontasse, em voz alta e em sequência, qual das linhas à direita possuía o mesmo tamanho da linha à esquerda. O que os voluntários não sabiam é que eram os únicos na sala: os demais participantes eram atores.
O que o psicólogo Solomon Asch buscava com esse experimento, na verdade, era entender mecanismos de conformidade social. E os resultados foram impressionantes: depois de respostas visivelmente incorretas dadas pelos atores, cerca de um terço dos voluntários acabava cedendo à pressão do grupo e escolhendo a mesma alternativa – alguns até que resistiam no começo, mas, após receber olhares de estranhamento dos demais, acabavam aderindo à “sabedoria coletiva” (alguns dos “experimentos de conformidade de Asch” podem ser vistos neste link e neste).
O “paradigma de Asch” é usado pela Psicologia Social até hoje, e entendê-lo melhor pode ser a chave para mudanças importantes no comportamento das pessoas.
O experimento observou dois efeitos da pressão de grupo sobre o indivíduo, um normativo, e outro informativo. O normativo diz respeito à condição humana de “ser social”, do nosso desejo de viver em e pertencer a grupos. Ser o único “do contra”, no experimento acima, carregava um estigma negativo. De fato, se um dos atores também respondesse corretamente, ou se a resposta do voluntário não era tornada pública para os demais participantes, a conformidade com a maioria era bastante reduzida.
Segundo a perspectiva informativa, o que os outros pensam e como veem o mundo informam nossa própria percepção sobre qual é a conduta apropriada (ou esperada) em uma determinada situação. E isso pode variar dentro de um mesmo contexto cultural e jurídico: enquanto nas ruas de São Paulo predomina a sujeira, suas estações de metrô estão entre as mais limpas do mundo. Por quê? A equipe de limpeza é acionada ao menor sinal de sujeira e, em uma estação limpa, a “norma” social entendida é de que lá não se joga sujeira no chão — é alto o custo psicossocial da violação dessa norma.
Em artigo publicado na Science, pesquisadores da Universidade de Groningen testaram na prática a teoria das “janelas quebradas” (a ideia de que desordem social e pequenos delitos levam a violações mais graves). Em um envelope parcialmente inserido em uma caixa de correio, deixaram uma nota de 5 euros visivelmente à mostra. Quando esta caixa de correio estava cercada de sujeira ou de pichação, o dobro de pessoas furtava o dinheiro. Em outro experimento, três vezes mais motoristas cruzavam um atalho proibido para buscar seus carros em um estacionamento se, ao lado da entrada, houvesse bicicletas acorrentadas ilegalmente a uma grade (veja estudo).
Em vez de penas cada vez mais severas, o país das leis que “não pegam” poderia se beneficiar de uma mudança das normas sociais em vigor. A moralização não precisa começar em Brasília, mas no cotidiano de todos nós. O bom exemplo não precisa — aliás, nem deve — ser exaltado como um ato heroico: ele está ao alcance de todos. Já os maus exemplos, por menores e mais banais que possam parecer, erodem nosso senso de obrigação com os outros.
*Fabio F. Storino é Pesquisador Sênior do GVces