Por Flavia Pardini
Uma tecnologia desenvolvida na Amazônia antes da chegada de Colombo está sendo transplantada para o outro lado do mundo para ajudar na agricultura e, quiçá, acender a esperança de uma fonte de energia negativa em emissões de carbono. Trata-se da adição ao solo de carvão obtido pela queima lenta e sem oxigênio de material orgânico. Praticada pelos índios séculos atrás, deu origem à milagrosa “terra preta”, que transforma o solo embaixo da floresta, normalmente pobre em nutrientes, em terra fértil para a agricultura. Na Austrália, onde os solos são antigos, erodidos e carentes em carbono orgânico, pesquisadores testam a fabricação do que batizaram de agrichar, um carvão inspirado nos pré-colombianos e produzido com tecnologia do século XXI.
Os cientistas têm certeza de que a terra preta é uma criação humana, mas ainda não conseguiram determinar como ela se formou: alguns argumentam que foi criada a partir da acumulação de restos de comida, materiais orgânicos e carvão; outros acreditam que é resultado da queima deliberada de materiais para adição ao solo. Se a última hipótese estiver correta, pode-se imaginar que os povos amazônicos praticassem não o corte-e-queima que arrasa a floresta atualmente, mas uma lenta transformação de biomassa em carvão. A quantidade de carbono retida com esse método é muito maior do que se os materiais são totalmente queimados e transformados em cinza. Adicionado ao solo, que armazena o carbono por séculos, o carvão ajuda na retenção de nutrientes.
Na Austrália, o agrichar está em teste pelo governo do estado de New South Wales em conjunto com a empresa Best Energies, que desenvolveu um processo de pirólise que “cozinha” a biomassa em um forno sem oxigênio, produzindo um combustível renovável chamado syngas e o carvão que será usado na agricultura. Metade do carbono produzido no processo fica no agrichar e, portanto, será armazenado no solo. O syngas, por sua vez, é reutilizado para aquecer o forno ou usado em outros processos.