– O senhor pergunta demais. A verdade foge de muita pergunta.
– Como posso ter respostas se não pergunto?
– Sabe o que devia fazer? Contar a sua estória. Nós esperamos que vocês, brancos, nos contem vossas estórias.
– Uma estória? Eu não sei contar nenhuma estória.
– Sabe, tem que saber. Até os mortos sabem. Contam estórias pela boca dos vivos.
Mia Couto, O Vôo do Flamingo
Por André Reinach
Em junho de 2006, André Reinach trancou sua matricula no curso de Ciências Sociais da USP para viver um ano fora do País. Semanas depois, o estudante, então com 22 anos, desembarcou em Londres e começou uma aventura que poderia ser semelhante às de muitos outros jovens que passam temporadas no exterior. Mas André tinha um plano de viagem pouco comum e, após dois meses na Europa, partiu para a África.
De setembro a junho 2007, André esteve em 8 países africanos, tempo e lugares suficientes para a descoberta da diversidade de um continente que, visto de fora, costuma permanecer envolto numa neblina de ignorância e estereótipos. Ao revelar parte dessa multiplicidade, os relatos destas páginas, extraídos do diário do jovem viajante, ajudam a ampliar a reflexão sobre os grandes desafios impostos aos que buscam novas alternativas para as relações entre os povos, e entre o homem e o planeta.
CICATRIZES DE RUANDA
Março de 2007
Grandes bulevares arborizados, restaurantes elegantes com nomes franceses, homens e mulheres bem vestidos. Hotéis de luxo e prédios diplomáticos se espalham pelas infinitas colinas que compõem a cidade. A primeira impressão que um recém-chegado tem de Kigali contrasta com a imagem que em geral se tem de um país como Ruanda. Massacres, genocídio, milhões de mortos? Treze anos depois de um dos mais terríveis episódios da história contemporânea, a cidade apresenta um surpreendente ar de civilidade européia, não encontrado em nenhuma das outras cidades africanas pelas quais passei.
A limpeza das ruas é impressionante. O governo aboliu os sacos plásticos, substituindo-os por sacos de papel nos supermercados. Isso contribuiu sensivelmente para essa sensação de asseio que a cidade inspira. Prédios erguem-se em questão de meses e shopping centers começam a despontar no centro da cidade. Coffee shops que fazem jus a qualquer casa londrina são encontradas com facilidade. Kigali está muito à frente da concorrente mais próxima na disputa pelo título de capital africana mais segura. Aqui, andar sozinho à noite não é um risco para um forasteiro como eu, muito embora isso se deva mais a um governo exercido à base da mão forte do que da ausência de violência urbana.
Ruanda hoje é um dos países africanos que recebem ajuda econômica em maior escala, vinda principalmente dos EUA. Desde que o presidente Clinton reconheceu o erro de não intervir para impedir o massacre em massa da população de etnia tutsi, ocorrido em 1994, este pequeno país da África Central tornou-se o principal cliente dos órgãos de ajuda bilateral do governo americano. Isso explica também a imagem de opulência que a capital hoje transmite.
Há 13 anos, o país foi demolido pelo genocídio. Como não podia deixar de ser, o evento deixou feridas na região que não vão desaparecer tão cedo. Assim como as cicatrizes que volta e meia se vêem nos corpos das pessoas que circulam pela cidade. Marcas que não nos deixam esquecer os acontecimentos do passado recente nos lembram de que de fato aconteceram, e não foram inteiramente submersos na pavimentação das avenidas centrais e na aparência ordeira da cidade.
Ao andar na rua, sabe-se que todos os passantes estiveram envolvidos no genocídio de uma forma ou de outra, como vítimas, assassinos, cúmplices ou fugitivos. Os que não se envolveram diretamente, refugiados que voltaram a Ruanda depois dos eventos de 1994, tinham parentes ou conhecidos entre as vítimas. Mas é um exercício vão tentar definir quem é quem. Vítima ou assassino?
Um incauto pode até tentar discernir tutsis e hutus a partir dos seus estereótipos: os tutsis seriam altos e magros, com a cor da pele mais clara, enquanto os hutus teriam estatura menor, pele mais escura. Mas até durante o genocídio houve aqueles tutsis que conseguiram fugir se passando por hutus, com carteiras de identidade falsificadas. Nem os perpetradores do extermínio conseguiram distinguir claramente seus pretensos inimigos.
A Ruanda pré-genocídio era um país francófono, legado da colonização belga. Mas a língua nativa sempre foi o kinyarwanda, idioma do reino de Rwanda, com a qual os europeus entraram em contato no século XIX. Depois dos dias de terror, até a fisionomia cultural do país mudou. As milícias hutus massacraram cerca de 1 milhão de tutsis. Quando o massacre terminou pela intervenção de um Exército formado por tutsis que viviam nos países vizinhos, a maioria dos hutus que participaram da matança fugiu para a República Democrática do Congo.
Nesse processo, toda uma população de tutsis de Ruanda que havia vivido na diáspora por longo tempo voltou ao país, trazendo língua e costumes adquiridos em Uganda e na Tanzânia, países anglófonos. Assim, de uma hora para outra, o país passou a ter também o inglês como língua oficial. O governo atual, formado por integrantes do mesmo Exército que invadiu o país em 1994, tem investido nas relações diplomáticas com os EUA e a Inglaterra, em detrimento dos antigos parceiros preferenciais, França e Bélgica.
A Ruanda pós-genocídio ainda está longe de ter fechado todas as feridas abertas pelos eventos de 1994. Mas o país que eu encontrei já é radicalmente diferente daquele que vivenciou o genocídio, e está mudando ainda mais rápido. Hoje, com um governo forte e estável (e que, após sete anos no poder, ainda suscita dúvidas se não descambará em uma nova ditadura), tornou-se a principal aposta dos países centrais para um pólo de desenvolvimento na África Central.
RAÍZES DO TERROR
O que define realmente quem é tutsi e quem é hutu? Esta pergunta intriga a todos os que visitam Ruanda. De acordo com o livro do jornalista americano Philip Gourevitch, Gostaríamos de Informá-lo de que Amanhã Seremos Mortos com Nossas Famílias, tutsis e hutus não são duas tribos inimigas que resolveram se engalfinhar até a morte em 1994, visão que acabou se consolidando no senso comum.
Os motivos do genocídio não se reduzem à colonização belga, mas passam necessariamente por ela. Quando os europeus chegaram em Ruanda, encontraram um único povo, o banyarwanda, com uma única língua e uma só religião. Tutsis e hutus eram segmentos sociais dentro deste único povo. Para que estes passassem a se ver como raças diferentes, foi necessária a colonização belga, que governava promovendo e instrumentalizando o confronto entre tutsis e hutus, usando os primeiros, tipificados como mais “brancos”, contra os segundos.
Os primeiros massacres de tutsis datam de 1959, na independência do país. A partir de então, morticínios sucederam-se até culminar no genocídio de 1994. A bomba-relógio armara-se há muito tempo, uma evidência da dificuldade de Ruanda em superar o legado da colonização e construir um projeto de nação unitária, processo pelo qual uma série de países africanos passou com relativo sucesso.
O APARTHEID HOJE
21 de Setembro de 2006
Nunca fui um grande amante dos animais. Desde que caí do cavalo, na infância, sempre preferi distância desses seres, sobre os quais nunca tive o menor controle, e que sempre parecem dispostos a investir contra mim. Por isso, quando decidi ir para a África, a única coisa que sabia era que não queria fazer safáris, vestir aquelas roupas bege e tirar um milhão de fotos. Mas então, o que eu queria? Confesso que ainda não sabia. Para mim, a “África” correspondia a essa idéia meio difusa, na mesma medida fascinante e assustadora, que remete a guerras, crianças famintas, alegria, música, dança. Mais ou menos como supõe o senso comum.
Por isso, não fiquei tão chocado ao ouvir da boca de um dos únicos brasileiros que conheci na República Democrática do Congo que, antes de ir para lá, achava que nem sequer existia gente na “África”, apenas girafas e elefantes. Uma visão absurda, sem dúvida, mas seria pior do que a tão freqüente visão da África como continente esquecido, depósito de toda a culpa ocidental?
Em setembro de 2006, pus os pés na grande mancha obscura no mapa, que eu tinha decidido explorar, mesmo sem saber claramente que destino seguir, ou que caminho trilhar.
Logo ao descer do avião foi um desconcerto completo. Minha colega de poltrona ao lado durante o vôo chamava-se Louise. Descobri, enquanto batíamos papo e matávamos o tempo, que ela era originalmente da Namíbia, o mesmo país para o qual estávamos rumando. Havia vivido em Londres pelos últimos três anos, trabalhando para juntar dinheiro e abrir um negócio próprio na cidade natal. E ali estava ela, voltando para casa no mesmo vôo em que eu, no mapa do imaginário, me afastava como nunca da minha.
Ao passar pela alfândega, procurei um lugar para comprar um cartão telefônico e ligar para Michael, o meu anfitrião, marido de uma amiga de minha tia que me hospedaria enquanto eu estivesse em Windhoek, capital do país. Fui informado de que todos os cartões telefônicos haviam acabado, e que apenas os encontraria na cidade, distante 40 quilômetros do aeroporto, situado no meio do deserto.
Graças à intervenção de Louise, consegui pagar para usar o celular de um sujeito que passava pelo saguão do aeroporto e liguei para Michael. Estávamos combinando que eu pegaria algum tipo de transporte pro centro da cidade e lá ele me buscaria de carro, quando Louise interrompeu a conversa. Disse que não era seguro ir sozinho para o centro da cidade com a minha bagagem. Mudamos os planos: eu iria com Louise para a casa da sua irmã e o Michael passaria lá para me pegar.
Chegamos de táxi. O lugar não correspondia a nada que eu já tivesse visto ou imaginado. O céu muito azul contrastava com o tom amarelado da terra, dando um aspecto de aridez à paisagem. Entre os dois, um cobertor de barracos feitos de zinco, uns sobre os outros.
Estávamos no bairro de Katutura – que quer dizer “O lugar onde ninguém quer ir” -, uma favela criada e organizada pelo governo do apartheid, que tutelou a Namíbia (então South-West Africa) desde o fim da Segunda Guerra. Lá se concentrou uma população negra vinda de todas as tribos do território. No linguajar do apartheid, aquilo não se chamava bairro, mas township, um dos principais símbolos do regime segregacionista. Mesmo depois da independência da Namíbia e do fim do apartheid, a maior parte da população negra da cidade vive ali, com acesso precário a serviços básicos de saúde, saneamento, educação… Nesse sentido, algo muito parecido com inúmeras favelas brasileiras.
MZUNGU!
Janeiro de 2007
Você sabe o que quer dizer mzungu? Duvido. Mas basta passar um dia em algum país da África do Leste (Quênia, Tanzânia, Uganda, Ruanda…) para descobrir. Seja pela boca das crianças, que acenam para você enquanto gritam “mzungu, mzungu!”, seja pelos mais velhos, que você ouve murmurarem alguma coisa sobre o mzungu quando ele chega na sua vila, geralmente de mochila nas costas e com cara de deslumbrado, achando tudo lindo.
Se você perguntar, vão lhe dizer que mzungu quer dizer homem branco. Mas, na verdade, é muito mais do que isso. É ser sempre de fora; é o espaço demarcado para aqueles que não pertencem àquele lugar, e que não vão pertencer mesmo depois de anos vivendo ali. Isso eles fazem questão de deixar muito claro para você, mzungu, mesmo que não seja usando essa palavra. E não podemos esquecer que foram os mzungus que organizaram e executaram os horrores da colonização.
Obviamente, eu não era o único mzungu no continente. Para além dos velhos, e raros, descendentes dos primeiros representantes da categoria que ainda habitam alguns dos países pelos quais passei (excetuando a África do Sul, cujos colonizadores ainda estão presentes, firmes e fortes), reconhece-se uma nova horda de pessoas pálidas cada vez mais visíveis no continente: os trabalhadores de ONGs. Eles se somam aos dois outros tipos de mzungus mais comuns: os funcionários de companhias de mineração e os turistas.
Os mzungus do terceiro setor vêm da Europa ou dos Estados Unidos, ligados a grandes ONGs internacionais, como World Vision, Caritas, Right to Play. Outros vêm para trabalhar em atividades filantrópicas e educacionais, como orfanatos, escolas e afins. Unidos sob a bandeira do humanitarismo, em geral estão apenas de passagem.
Desenvolvimento. Essa é a palavra da vez na África habitada por esses mzungus. As metas do milênio da ONU, que vinculam essas concepções de desenvolvimento e sustentabilidade, passaram a constar do programa de todos os governos dos africanos nos últimos tempos, o que abre mais espaço para a presença das ONGs. Todas as propostas e projetos de intervenção têm de conter esse termo se quiserem ser respeitadas e disputar fundos advindos dos países ricos.
Os mzungus convivem muito entre si, e, salvo exceções, mantêm parco contato com a população local. O circuito das ONGs que trabalham na África não é tão grande assim e, afinal, elas têm de se proteger em um território tão hostil, não é mesmo? Estamos falando do Coração das Trevas, de todas essas imagens que povoam as cabeças dos mzungus que vão até ali salvar a África da barbárie. No final das contas, em geral se imaginam a levar as luzes da civilização e do desenvolvimento ao “continente negro”, tarefa para a qual nós brancos nos autonomeamos há muito tempo.
BARBÁRIE E ESQUECIMENTO
Para listar as barbaridades realizadas em nome do progresso na África durante a colonização, seriam necessárias muitas páginas. O que só torna mais surpreendente o desconhecimento geral sobre as políticas e ações de várias potências mundiais naquele período.
O livro Britain’s Gulag, ganhador do Prêmio Pulitzer de 2006, escrito pela historiadora Caroline Elkins, ajuda a divulgar as graves violações aos direitos humanos realizadas nas barbas do império inglês. Em nome da repressão à guerrilha Mau Mau, que surgiu do povo Kikuyu como revolta contra a expropriação de suas terras pelos colonizadores ingleses, o governo colonial inglês organizou campos de trabalhos forçados pelos quais chegaram a passar mais de um milhão de pessoas. Evidentemente, milhares de pessoas chegaram a perecer ali, tanto devido a privações da vida dentro dos campos quanto pela tortura e métodos diretos de extermínio, que se tornaram práticas cotidianas. Isso tudo no período do pós Segunda Guerra, em que o surgimento das Nações Unidas estava na ordem do dia e o mundo ocidental justamente procurava instrumentos para impedir a volta do pesadelo nazista, com seus campos de concentração e seu Estado genocida.
Perpetrar sistematicamente a violência e o terror é algo bárbaro. Agir como se isso nunca tivesse ocorrido, também.
GLOBALIZAÇÃO
Fevereiro de 2007
Certa vez, peguei um trem na Tanzânia. Queria cruzar o país, do centro para o oeste, até uma cidade chamada Kigoma, parada final do trem. Era estação de chuva, e as enxurradas costumavam varrer os trilhos, que tinham de ser refeitos. Os atrasos costumavam se estender por dias, até semanas. Apesar dos riscos, resolvi encarar a viagem.
Já comecei me complicando ao tentar chegar até a cidade de onde o trem sairia, pois perdi o ônibus que me levaria até lá. Por causa do horário swahili, que marca a primeira hora do dia às 7 da manhã, eu não compreendi o que estava escrito no meu bilhete e acabei chegando ao terminal horas depois da partida do ônibus. Finalmente, três dias depois, eu entrava no tal trem, preparado para passar um tempo indefinido preso lá dentro.
Da cabine, vi passar um comissário carregando algumas barras de madeira. Ele me entregou uma, indicando que deveria utilizá-la para trancar a janela. Durante a noite, alguém poderia enfiar a mão pelo vão e tentar pegar as malas.
Meu companheiro de cabine se chamava Saidou. Ele era da Tanzânia, mas não morava lá. Mudara-se para a China havia sete anos, e agora só voltava nas férias para a terra natal, uma cidadezinha chamada Moshi, aos pés do Kilimanjaro. É um lugar freqüentado por turistas aventureiros com dinheiro para pagar pela licença para escalar a maior montanha da África.
A mudança na vida de Saidou começou quando ele ficou sabendo de um novo vestibular, diferente do que seleciona candidatos à universidade na Tanzânia, que ficou conhecida nos anos 70 como uma das melhores da África (mas que hoje em dia anda meio decadente). A embaixada da China havia aberto um exame de ingresso no ensino superior. Aqueles que passassem ganhariam o direito de freqüentar um curso de mandarim e de entrar numa universidade chinesa. Saidou foi um dos aprovados. “Física é física em qualquer lugar”, ele me disse ao comentar sua façanha.
Saidou formou-se em engenharia e arrumou emprego na China. Mostrou-me fotos de um jantar na casa da família da namorada chinesa. No dia seguinte nos separamos sem conseguir nos despedir. O trem parou em uma estação e se dividiu: uma parte ia para o oeste, meu destino, e a outra, para o norte, rumo de Saidou.
Desde pelo menos o fim do século XIX, começo do XX, não se pode entender a África sem compreender o seu lugar no mundo globalizado. Partindo da colonização, quando o continente inteiro passou a fazer parte da economia mundial, passando pelos processos de independência política até o presente, os africanos acompanharam, de uma forma ou de outra, o que acontecia ao seu redor.
Hoje em dia, a diáspora africana é fundamental para se entender como funcionam as sociedades de lá. Muitos vão para a Europa, Estados Unidos ou mesmo a China e mandam dinheiro para suas famílias, que passam a depender dessa renda. Transcorrido algum tempo, os radicados fora freqüentemente acolhem um sobrinho ou primo que queira tentar a sorte no estrangeiro.
Essas redes de relação fazem com que até as mais remotas aldeias acabem tendo contato com o que acontece no centro da economia mundial. Louise e Saidou fazem parte dessa rede da sociedade contemporânea, que faz da África menos um lugar esquecido pelo resto do mundo do que uma parte, ainda que desprivilegiada em vários sentidos, da chamada globalização.
SOB CAMADAS E PALAVRAS
Setembro de 2006 a maio de 2007
Goma, a maior cidade do leste do Congo, é uma Pompéia moderna. Um dos três vulcões que circundam a cidade entrou em erupção em 2003, cobrindo a cidade inteira com uma espessa camada de lava. Hoje, dois metros abaixo do solo, existe outra cidade, a Goma anterior à erupção. Nela jazem todos os pertences deixados para trás pelos moradores da cidade. A parca infra-estrutura que ali existia também foi arrasada. A lava criou um “recapeamento” para as ruas de terra, trazendo asfalto para onde este não existia. Cemitérios de automóveis se acumulam à beira das ruas. A vida dos habitantes teve de ser reconstruída por inteiro, e hoje, embaixo de onde se ergue um hospital, há outro, soterrado pelo vulcão.
Gosto de pensar sobre esta cidade como uma metáfora das Áfricas que vi. Como a flor que nasceu no asfalto, que teima em crescer a contrapelo da esterilidade do solo. Parafraseando Euclides da Cunha, e apesar do risco de cair em outros estereótipos, diria que, antes de tudo, os “africanos” são fortes.
E, se há algo de desconcertante nisso tudo, é a complexidade da vida que encontrei. As Áfricas resistem à nossa África, a dos massacres infinitos, da miséria sem saída. As Áfricas vivem por si mesmas. E não seremos nós, que nem sequer chegamos perto de compreender o que todas essas infinitas Áfricas querem dizer, que poderemos resolver os seus problemas. Escutar as histórias dos outros antes de contar as suas é a primeira virtude que se aprende viajando.