Há quem preveja nos investimentos mundiais em energia alternativa uma bolha maior que a das pontocom e a do setor imobiliário. A ciranda atrai até gente de fora do ramo da sustentabilidade, como o Google
Os investidores nunca estiveram tão ávidos por financiar tecnologias limpas e energias alternativas. Segundo a National Venture Capital Association (NVCA), que representa 480 fundos de capital de risco e private equity dos Estados Unidos, foram investidos US$ 2,6 bilhões em pequenas empresas desses dois setores nos três primeiros trimestres do ano passado – 44% a mais que em todo o ano de 2006. Entre as beneficiadas estão empresas promotoras da reciclagem, do controle da poluição, das energias solar e eólica – além de modelos energéticos alternativos à queima de combustíveis fósseis que não são propriamente uma unanimidade, como o nuclear ou o hidrelétrico.
Há apenas cinco anos, elas não ficavam com mais do que 1% do venture capital dos EUA. Hoje, abocanham 7,4% do total. Por trás desse movimento estão a crescente voracidade energética de indianos e chineses, o encarecimento do petróleo, as preocupações ambientais e a aposta de que muitas tecnologias revolucionárias estão em vias de amadurecer.
Pelo menos uma empresa brasileira já garantiu assento nesse banquete: a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), que ambiciona plantar 600 mil hectares de cana-de-açúcar e construir dez unidades industriais de produção de etanol.
Encabeçada pelo ex-presidente da Petrobras Henri Philippe Reichstul, ela tem entre seus acionistas James Wolfensohn, ex-presidente do Banco Mundial, e um dos fundadores da Sun Microsystems, Vinod Khosla.
Khosla, dono de uma fortuna na faixa de US$ 1,5 bilhão, é hoje um dos maiores investidores individuais em energias alternativas. “Em 20 anos, teremos um mundo muito diferente”, declarou recentemente ao diário USA Today. “Sou muito mais otimista do que a média.” Essa ciranda tem reunido muita gente que, como ele, não é do ramo da sustentabilidade.
É o caso do Google, que anunciou a transferência de dezenas de milhões de dólares anuais para pesquisa e para fomentar empresas inovadoras. Seu objetivo é tornar as energias renováveis – sobretudo a solar, a eólica e a geotérmica – mais baratas que o carvão em um horizonte de apenas meia década.
Czar das energias verdes Claro, seu outro objetivo é faturar alto. O czar das energias verdes do Google – sim, o nome da função é esse mesmo –, Bill Weihl, declarou recentemente que “o volume de dinheiro envolvido no setor energético é enorme – mesmo que você resolva uma parte pequena do problema, ainda assim poderá levantar uma cifra bastante alta”.
Tanto dinheiro voltado para tecnologias limpas – ou supostamente limpas – é uma boa notícia. Ou não? Há quem prefira baixar a bola, lembrando o que aconteceu quando as pontocom receberam atenção semelhante.
Para refrescar a memória: a partir de 1995, trilhões de dólares foram investidos em pequenas empresas da internet, num movimento de supervalorização acionária que explodiu em 2001, levando muita gente à bancarrota. Esse tipo de bolha se forma quando a cotação das empresas não está lastreada pelo seu valor efetivo, mas por uma estimativa excessivamente otimista e pouco realista.
O presidente da NVCA, Mark Heesen, é um dos que recomendam cautela. “O investimento em novas tecnologias está sujeito a reveses e não se presta aos inexperientes ou àqueles avessos a emoções fortes”, diz.
“Turistas interessados num retorno rápido deveriam manter distância.” Mas ele faz a ressalva de que, a longo prazo, essa área será tão importante para os investidores de capital de risco como o foram, nos últimos 20 anos, as de biotecnologia e Tecnologia da Informação.
O temor de que essa chuva de dinheiro pode ser excessiva ganhou corpo em fevereiro, quando o assunto foi capa da centenária Harper’s Magazine. A revista publicou um texto de Eric Janszen, um vidente financeiro bastante badalado, diretor do website de investimentos iTulip. Em seu artigo, ele prevê que a bolha do segmento de energias alternativas (e infra-estrutura de apoio) tem boas chances de superar em exuberância a da internet e a do setor imobiliário. No auge, a primeira movimentou US$ 7 trilhões, e a segunda, US$ 13 trilhões. Para Janszen, a nova bolha poderia exceder US$ 20 trilhões em capital especulativo.
Ele diz, porém, que esta bolha não está fadada, necessariamente, a estourar. TamTambém não prega que os investidores fujam desse mercado. Para ele, ainda é cedo para identificar vencedores e as “barbadas” podem vir de qualquer lugar.
Toda essa discussão não deixa de ser excitante para quem se acostumou a ver os promotores das tecnologias limpas e das energias renováveis de chapéu na mão, mendigando financiamento, penando para demonstrar a rentabilidade da sua proposta.
Ainda vai chegar o dia, diz Vinod Khosla, “em que o petróleo vai competir conosco, e não o contrário”.
* Regina Scharf – Jornalista especializada em meio ambiente