A transição para uma economia de baixo carbono terá forte impacto sobre o Brasil. O programa Empresas pelo Clima propõe uma plataforma permanente para construir essa nova realidade
A mensagem do filme Home, Nosso Planeta, Nossa Casa, de Yann Arthus- Bertrand, é clara: “É muito tarde para sermos pessimistas”. Depois de quase nos levar à depressão profunda nos primeiros 80 minutos do filme, descrevendo o impacto de 50 anos sobre uma “casa” – o planeta Terra – que conta sua idade em bilhões de anos, o cineasta nos retira do limbo e prega, nos dez minutos finais, uma mensagem de otimismo, paradoxalmente. É muito tarde para pessimismo!
De fato, esgotou-se o prazo para a omissão diante do maior desafio ambiental da humanidade, as mudanças climáticas. É urgente agir! No ambiente dos negócios, a ausência de respostas empresariais deve implicar sérias consequências para a competitividade no século XXI.
Para ilustrar esse debate, dois fatos recentes alimentaram a discussão sobre o tema. O primeiro fato refere-se à aprovação pelo Congresso americano, no dia 26 de julho, do Clean Energy and Security Act. Chamada de Waxman-Markey Bill, é uma das mais importantes regulamentações ambientais na história daquele país. A lei ainda precisa passar pelo Senado, mas já acena com um novo posicionamento mundial, na medida em que propõe reduções significativas nas emissões de carbono concomitantes a um cenário de crescimento econômico.
Para quem está convicto de que qualquer estratégia empresarial passa por construir soluções que diminuam progressivamente a relação emissão por unidade de produto, essa regulamentação era mais que esperada e os coloca na situação privilegiada de líderes Nesse processo de transição.
Mais do que isso, os convictos sabem que essa notícia representa um grande alento na luta contra o aquecimento global e um impulso para uma economia de baixo carbono, na medida em que cria mecanismos de mercado que punem atividades emissoras de gases de efeito estufa, gerando incentivos para eficiência energética, tecnologias limpas e fontes renováveis, além de estimular os “empregos verdes”.
Tal legislação, especialmente vinda de um governo e de um Congresso democratas, deve trazer barreiras protecionistas àqueles países e àquelas empresas que ainda insistirem em surfar no desenvolvimento movido por fontes fósseis de energia. Esse cenário bastante pragmático é potencializado pelo segundo fato relevante: de acordo com o Financial Times de 26 de junho, a Organização Mundial do Comércio (OMC) reviu regras para tornar possível a imposição de impostos de importação por razões ambientais. A justificativa é que os ajustes tarifários protegerão as economias nacionais de países que impuserem limites à comercialização dos direitos de emissão de gases de efeito estufa (GEEs). Aparentemente, a OMC enxerga a emissão desregulamentada de GEEs como um subsídio ambiental que turbina a competitividade de empresas, pelo menos a curto prazo, vis-à-vis aquelas obrigadas a atender a regulamentação por tecnologias limpas e baixa emissão por unidade de produto.
Se ainda não estava claro para alguns, esses dois fatos demonstram que a transição para uma economia de baixo carbono terá fortes impactos sobre a economia e a sociedade brasileira. A magnitude das alterações futuras do clima global já pode ser avaliada pelos recentes eventos extremos que atingiram o Brasil, como a seca em 2005 e a enchente em 2008 na Amazônia, e indicam a urgência para a busca de soluções de redução das emissões de gases de efeito estufa e de adaptação ao problema climático.
Além disso, o Brasil – e seu setor empresarial – poderá sofrer impactos negativos se não for rápido na adoção de políticas e medidas suficientes para estimular o setor produtivo e preparar a sociedade como um todo para a economia de baixo carbono.
Infelizmente, não é isso que estamos presenciando. A tendência explícita de carbonização da matriz energética brasileira e de investimentos em tecnologias insustentáveis se revela na crescente instalação de termoelétricas a gás, óleo, carvão mineral e nuclear, previstas nos planos para o setor. É fundamental que o governo inverta esse processo e estimule maciçamente a eficiência energética, a otimização do uso de energia gerada e a adoção em larga escala de fontes de energia renovável e de baixa emissão, entre as quais o País apresenta enorme potencial produtivo, como a eólica, a solar térmica e a biomassa.
É fundamental que qualquer possibilidade de expansão da hidreletricidade seja amparada por um planejamento adequado, cujas premissas devem ser a sustentabilidade dos ecossistemas e a minimização dos impactos socioambientais e a eficiência do modelo de demanda, em especial na Amazônia.
Segundo estimativas do governo britânico, o mercado global por produtos e serviços gerados com baixas emissões de carbono estaria na ordem de 3 trilhões de libras. É preciso, portanto, que o setor produtivo brasileiro atente e se prepare para essas novas condições, para se beneficiar econômica e industrialmente, e para que a sociedade brasileira colha bons frutos. É fundamental também que as políticas públicas necessárias sejam aprovadas para estabelecer a base para essa transição.
Mais do que intenções
A boa notícia é que temos à disposição recursos humanos e financeiros e tecnologia para a mudança. Falta a articulação e o comprometimento político. Nesse contexto, a Fundação Getulio Vargas, por meio de seu Centro de Estudos em Sustentabilidade, lança sua mais nova iniciativa, o Programa Empresas pelo Clima (EPC).
O EPC não é um manifesto de cobrança de posição brasileira para a COP 15, em Copenhague. Trata-se de uma plataforma empresarial brasileira permanente para a construção de uma economia de baixo carbono.
O EPC não é uma carta de intenções e compromissos empresariais. Ele é a continuidade do Programa GHG Protocol, um projeto hands-on (proativo) com o – e do – empresarial, que neste mês de outubro apresenta, voluntariamente, a publicação de 20 inventários de gases de efeito estufa, construídos nos últimos 18 meses, por meio da metodologia do GHG Protocol, a mais aceita e difundida no mundo inteiro.
Formado pela base de empresas que compõem o Programa GHG Protocol, o EPC expande sua atuação, articulando o setor empresarial para um desafio maior: propor um marco regulatório do meio empresarial para a economia de baixo carbono para o Brasil. Mais ainda, o Programa pretende capacitar companhias no tema mudanças climáticas e apoiá-las na construção de estratégias empresariais, políticas corporativas e sistemas de gestão das emissões de GEE.
Atividades complementares dessa plataforma envolvem mesas setoriais e estudos específicos para os segmentos do agronegócio, energia, florestas, serviços, indústria e transportes, com a elaboração de policy papers e position papers. As ações desenvolvidas no âmbito do Programa pretendem ainda resultar em sugestões e demandas para o posicionamento brasileiro nas negociações internacionais no âmbito da Convenção do Clima, e a serem adotadas no período pós-Kyoto.
O setor produtivo deve se preparar para acompanhar as mudanças tecnológicas e de gestão necessárias para a resolução desse desafio. O acesso a recursos financeiros deve ficar condicionado a novos parâmetros orientados pelas mudanças climáticas, o que afetará setores da economia. A transição para a economia de baixo carbono pode – e deve – ser vista não só como um desafio, mas como uma grande oportunidade para o Brasil e suas empresas. A não adequação significa perder espaço num mundo extremamente competitivo. É muito tarde para sermos pessimistas.[:en]A transição para uma economia de baixo carbono terá forte impacto sobre o Brasil. O programa Empresas pelo Clima propõe uma plataforma permanente para construir essa nova realidade
A mensagem do filme Home, Nosso Planeta, Nossa Casa, de Yann Arthus- Bertrand, é clara: “É muito tarde para sermos pessimistas”. Depois de quase nos levar à depressão profunda nos primeiros 80 minutos do filme, descrevendo o impacto de 50 anos sobre uma “casa” – o planeta Terra – que conta sua idade em bilhões de anos, o cineasta nos retira do limbo e prega, nos dez minutos finais, uma mensagem de otimismo, paradoxalmente. É muito tarde para pessimismo!
De fato, esgotou-se o prazo para a omissão diante do maior desafio ambiental da humanidade, as mudanças climáticas. É urgente agir! No ambiente dos negócios, a ausência de respostas empresariais deve implicar sérias consequências para a competitividade no século XXI.
Para ilustrar esse debate, dois fatos recentes alimentaram a discussão sobre o tema. O primeiro fato refere-se à aprovação pelo Congresso americano, no dia 26 de julho, do Clean Energy and Security Act. Chamada de Waxman-Markey Bill, é uma das mais importantes regulamentações ambientais na história daquele país. A lei ainda precisa passar pelo Senado, mas já acena com um novo posicionamento mundial, na medida em que propõe reduções significativas nas emissões de carbono concomitantes a um cenário de crescimento econômico.
Para quem está convicto de que qualquer estratégia empresarial passa por construir soluções que diminuam progressivamente a relação emissão por unidade de produto, essa regulamentação era mais que esperada e os coloca na situação privilegiada de líderes Nesse processo de transição.
Mais do que isso, os convictos sabem que essa notícia representa um grande alento na luta contra o aquecimento global e um impulso para uma economia de baixo carbono, na medida em que cria mecanismos de mercado que punem atividades emissoras de gases de efeito estufa, gerando incentivos para eficiência energética, tecnologias limpas e fontes renováveis, além de estimular os “empregos verdes”.
Tal legislação, especialmente vinda de um governo e de um Congresso democratas, deve trazer barreiras protecionistas àqueles países e àquelas empresas que ainda insistirem em surfar no desenvolvimento movido por fontes fósseis de energia. Esse cenário bastante pragmático é potencializado pelo segundo fato relevante: de acordo com o Financial Times de 26 de junho, a Organização Mundial do Comércio (OMC) reviu regras para tornar possível a imposição de impostos de importação por razões ambientais. A justificativa é que os ajustes tarifários protegerão as economias nacionais de países que impuserem limites à comercialização dos direitos de emissão de gases de efeito estufa (GEEs). Aparentemente, a OMC enxerga a emissão desregulamentada de GEEs como um subsídio ambiental que turbina a competitividade de empresas, pelo menos a curto prazo, vis-à-vis aquelas obrigadas a atender a regulamentação por tecnologias limpas e baixa emissão por unidade de produto.
Se ainda não estava claro para alguns, esses dois fatos demonstram que a transição para uma economia de baixo carbono terá fortes impactos sobre a economia e a sociedade brasileira. A magnitude das alterações futuras do clima global já pode ser avaliada pelos recentes eventos extremos que atingiram o Brasil, como a seca em 2005 e a enchente em 2008 na Amazônia, e indicam a urgência para a busca de soluções de redução das emissões de gases de efeito estufa e de adaptação ao problema climático.
Além disso, o Brasil – e seu setor empresarial – poderá sofrer impactos negativos se não for rápido na adoção de políticas e medidas suficientes para estimular o setor produtivo e preparar a sociedade como um todo para a economia de baixo carbono.
Infelizmente, não é isso que estamos presenciando. A tendência explícita de carbonização da matriz energética brasileira e de investimentos em tecnologias insustentáveis se revela na crescente instalação de termoelétricas a gás, óleo, carvão mineral e nuclear, previstas nos planos para o setor. É fundamental que o governo inverta esse processo e estimule maciçamente a eficiência energética, a otimização do uso de energia gerada e a adoção em larga escala de fontes de energia renovável e de baixa emissão, entre as quais o País apresenta enorme potencial produtivo, como a eólica, a solar térmica e a biomassa.
É fundamental que qualquer possibilidade de expansão da hidreletricidade seja amparada por um planejamento adequado, cujas premissas devem ser a sustentabilidade dos ecossistemas e a minimização dos impactos socioambientais e a eficiência do modelo de demanda, em especial na Amazônia.
Segundo estimativas do governo britânico, o mercado global por produtos e serviços gerados com baixas emissões de carbono estaria na ordem de 3 trilhões de libras. É preciso, portanto, que o setor produtivo brasileiro atente e se prepare para essas novas condições, para se beneficiar econômica e industrialmente, e para que a sociedade brasileira colha bons frutos. É fundamental também que as políticas públicas necessárias sejam aprovadas para estabelecer a base para essa transição.
Mais do que intenções
A boa notícia é que temos à disposição recursos humanos e financeiros e tecnologia para a mudança. Falta a articulação e o comprometimento político. Nesse contexto, a Fundação Getulio Vargas, por meio de seu Centro de Estudos em Sustentabilidade, lança sua mais nova iniciativa, o Programa Empresas pelo Clima (EPC).
O EPC não é um manifesto de cobrança de posição brasileira para a COP 15, em Copenhague. Trata-se de uma plataforma empresarial brasileira permanente para a construção de uma economia de baixo carbono.
O EPC não é uma carta de intenções e compromissos empresariais. Ele é a continuidade do Programa GHG Protocol, um projeto hands-on (proativo) com o – e do – empresarial, que neste mês de outubro apresenta, voluntariamente, a publicação de 20 inventários de gases de efeito estufa, construídos nos últimos 18 meses, por meio da metodologia do GHG Protocol, a mais aceita e difundida no mundo inteiro.
Formado pela base de empresas que compõem o Programa GHG Protocol, o EPC expande sua atuação, articulando o setor empresarial para um desafio maior: propor um marco regulatório do meio empresarial para a economia de baixo carbono para o Brasil. Mais ainda, o Programa pretende capacitar companhias no tema mudanças climáticas e apoiá-las na construção de estratégias empresariais, políticas corporativas e sistemas de gestão das emissões de GEE.
Atividades complementares dessa plataforma envolvem mesas setoriais e estudos específicos para os segmentos do agronegócio, energia, florestas, serviços, indústria e transportes, com a elaboração de policy papers e position papers. As ações desenvolvidas no âmbito do Programa pretendem ainda resultar em sugestões e demandas para o posicionamento brasileiro nas negociações internacionais no âmbito da Convenção do Clima, e a serem adotadas no período pós-Kyoto.
O setor produtivo deve se preparar para acompanhar as mudanças tecnológicas e de gestão necessárias para a resolução desse desafio. O acesso a recursos financeiros deve ficar condicionado a novos parâmetros orientados pelas mudanças climáticas, o que afetará setores da economia. A transição para a economia de baixo carbono pode – e deve – ser vista não só como um desafio, mas como uma grande oportunidade para o Brasil e suas empresas. A não adequação significa perder espaço num mundo extremamente competitivo. É muito tarde para sermos pessimistas.