“Uma paz justa inclui não apenas direitos civis e políticos – ela precisa englobar segurança econômica e oportunidade. Pois a verdadeira paz não é apenas estar livre do medo, mas livre de querer”. Em discurso ao aceitar o controverso Nobel da Paz dado a ele, Barack Obama falou sobre violência, conflito e o conceito de “guerra justa”, como quis caracterizar a do Afeganistão. Mas também apontou o desenvolvimento como ingrediente essencial não só para a paz, mas para tornar, ela também, justa.
“É indubitavelmente verdade que o desenvolvimento raramente cria raiz sem segurança; é também verdade que a segurança não existe onde os seres humanos não têm acesso a comida suficiente, ou a água limpa, ou ao remédio de que precisam para sobreviver. Não existe onde as crianças não podem aspirar a uma educação decente ou a um trabalho que sustenta a família. A ausência de esperança pode fazer uma sociedade apodrecer por dentro”, disse.
A questão da segurança no Brasil está longe de ser equacionada, como sabe qualquer cidadão que vive no Rio e em São Paulo. Depois de quase três anos na Austrália, minhas andanças em São Paulo dão a sensação de uma cidade ainda mais murada onde, apesar da aparente harmonia, borbulha o conflito entre os que têm as condições citadas por Obama – e muito mais – e os que não têm. Sabe-se que a violência que aflora nos sequestros, assaltos e arrastões é a ponta de um iceberg, pois persistem carências na educação, saúde, previdência, habitação, transporte, justiça, entre outras. Como aponta o historiador Carlos Guilherme Mota, na base de tudo falta um senso de civilidade e uma sociedade civil moderna, “em que o contrato social é nítido e respeitado”.
Obama vive a ambiguidade de receber o Nobel da Paz ao mesmo tempo em que comanda duas guerras e decide enviar mais tropas ao Afeganistão. Não faltam críticas e comparações com seu antecessor, mas é seguro ficar apenas com a “pureza da indignação”, como disse o presidente americano, ou esconder-se atrás de muros e cercas. Obama, assim como o Brasil, tem poucas escolhas, a não ser admitir o problema e enfrentá-lo. “Podemos reconhecer que a opressão estará sempre conosco, e ainda assim lutar por justiça”, disse. “Podemos admitir a intratabilidade da depravação, e ainda assim lutar por dignidade. Podemos compreender que haverá guerra, e ainda assim lutar pela paz”.