A gente bem que tentou resistir à empolgação generalizada em torno do filme Avatar, de James Cameron. Mas a repórter Carolina Derivi foi conferir no cinema, gostou do que viu e topou compartilhar aqui algumas das suas impressões:
“Parece impossível que alguém ou alguma coisa faça tanto sucesso sem provocar críticas ferrenhas na mesma proporção. Então vou começar pela crítica mais engraçada que pesquei no Twitter (e agora não consigo mais encontrar o autor): ‘Avatar não passa de uma versão futurística de Pocahontas’.
Isso porque ambos o estrondo de Cameron e o simpático filme da Disney abordam a mesma relação conturbada entre humanidade e seu meio, combinada ao eterno conflito entre a civilização auto-intitulada e outras culturas. Mas não acho que isso seja um problema.
Avatar não é o primeiro filme de inspiração socioambientalista e seguramente não será o último. Não me parece que o filme tenha reempacotado coisas que já foram ditas ou feitas no cinema, tanto quanto fez beber na mesma fonte que sempre nutriu as artes em geral: a contemporaneidade.
O que me fascinou mais foi a quantidade de conexões com a realidade que o SciFi de Avatar provocou em mim enquanto assistia. Pensei muito na Amazônia, nos conflitos entre populações tradicionais e grandes empresas. Por isso não foi nenhuma surpresa quando indígenas da Amazônia equatoriana , mesmo indo ao cinema pela primeira vez a convite de uma ONG local, e com todo o aparato de experiência sensorial inovadora, avaliaram secamente:
‘É similar ao que vivemos, mas para nós não é algo novo’
No equador, o embate entre as populações indígenas e a indústria do petróleo já completa décadas, com desdobramentos monstruosos.
Lembrei imediatamente da guerra do Iraque, já que a busca por fontes de energia é o que motiva a cobiça da humanidade sobre a terra de Pandora. Quando um dos personagens exclama atônico, ‘mas são apenas árvores!’, pensei da reprecificação de ativos, tentativa atual de reposicionar o valor das coisas numa linguagem que a humanidade compreende bem: monetária.
Teve gente que viu até uma referência clara ao atentado contra as torres gêmeas, embora eu já ache que qualquer ataque a uma população não militar na telona, agora e por muito tempo, sempre vai nos levar de volta a 11 de setembro…
E em meio a tantas referências políticas, culturais, econômicas e ambientais, acho que o filme provou refinamento ao traduzir a Teoria de Gaia, do ícone ambientalista James Lovelock, segundo a qual a Terra é um único organismo vivo com infinitas conexões. Mais do que isso, a vida conspiraria para sua perpetuidade, garantindo as condições no planeta para tanto.
Por isso, ao contrário dos filmes de aventura comuns, o trabalho de salvar a todos fica menos para o herói e mais para a própria natureza. Outra sinapse: seriam os eventos climáticos extremos alguma espécie de anticorpos destinados a varrer a nós, os vírus, do mapa da vida?
Muita gente considera que efeitos especiais são um tipo de maquiagem feita para encobrir um roteiro ruim e atuação sofrível. Eu, que não manjo quase nada do assunto, digo que cinema é emoção. A emoção que senti ao ver aqueles dinossauros de Jurassik Park (Spielberg, 1993) pela primeira vez no cinema, quando era menina, não fica devendo nada à comoção das conversas, por exemplo, em Antes do Pôr do Sol (Richard Linklater, 2004) –para citar um filme super singelo, tecnicamente. São apenas emoções diferentes.
Ainda assim me pergunto se eu sairia tão embasbacada do cinema se Avatar não tivesse o recurso 3D… Mas, enfim, talvez seja só mais uma reflexão interessante na conta de James Cameron.”