Nessa época do ano, é comum ouvir ruidosos bandos de cacatuas nas árvores que rodeiam a piscina pública do meu bairro. Sempre me divirto observando esses curiosos pássaros de crista majestosa e bico curvo que, embora pertencentes à mesma ordem do que os papagaios brasileiros, são endêmicos da Austrália e do Sudeste Asiático. Há coisa de uma semana descobri que, mais do que admirá-los, posso contribuir para que a ciência entenda melhor seus hábitos – em particular os de uma espécie, o Carnaby cockatoo (Calyptorhynchus latirostris).
Um projeto da Universidade de Western Australia está arregimentando voluntários para reunir dados sobre os padrões de deslocamento do Carnby na cidade de Perth, que faz parte da área que os pássaros usam para se alimentar antes de voar em direção ao leste e se reproduzir. É gente comum que, por habitar a mesma área que o cockatoo, tem boas chances de avistá-lo rotineiramente e acompanhar seu comportamento. A universidade desenvolveu um site em que qualquer pessoa pode se registrar e inserir suas observações de acordo com os padrões estabelecidos pelos pesquisadores.
Projetos que usam pessoas sem background científico na coleta de dados não são novidade, mas pelo menos aqui na Austrália eles parecem cada vez mais populares. É a chamada citizen science. No caso do Carnaby cockatoo, o projeto da universidade e outros desenvolvidos por ONGs visam conhecer e proteger esse grande pássaro preto, de bico e cauda brancos, classificado como ameaçado de extinção. Mas o potencial da ciência cidadã não para aí.
O Gravestone Project, por exemplo, convida indivíduos e grupos a visitar cemitérios locais para investigar o estado das lápides de mármore. “As taxas de desgastes das lápides são uma indicação de mudanças na acidez da chuva em diferentes localidades e ao longo do tempo”, diz o site do projeto. “A acidez é afetada pela poluição do ar e outros fatores, e pode ser usada como medida de mudanças no clima e nos níveis de poluição”. O projeto é liderado por uma pesquisadora da Universidade de Sydney e faz parte do EarthTrek, um programa de citizen science que foca em temas ambientais e faz a ligação entre cientistas e as comunidades.
De um lado, os cientistas aumentam a quantidade de dados que podem coletar local, regional ou globalmente e tornam seus projetos conhecidos das comunidades que habitam seus locais de pesquisa. De outro lado, instrumentos em punho, os voluntários saem a campo para coletar dados e depois vêem sua contribuição se transformar em resultados científicos concretos. Para as crianças, a experiência pode até se transformar em projeto de carreira.
Para os astrônomos amadores, há o Galaxy Zoo, que usa voluntários para classificar milhares de galáxias fotografadas pelo telescópio Hubble. Para os ornitólogos de plantão, a Auduborn Society, nos EUA, mantém o programa mais antigo de citizen science e todos os anos conta com os voluntários para um senso de aves. Para os amantes da natureza em geral, o ClimateWatch monitora os efeitos das mudanças climáticas em animais e plantas em toda a Austrália. E para os urbanóides, uma iniciativa em São Francisco, nos EUA, conta com a ajuda de gente comum para mapear e preservar a “floresta urbana” da cidade.
Se você conhece algum projeto de ciência cidadã no Brasil, conte aqui pra gente.