Os peixes de água doce estão tão ou mais ameaçados quanto os de oceano – embora estes ganhem muito mais publicidade. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, cerca de 30% da pesca oceânica já está comprometida e produz menos de 10% de sua capacidade de pico. Agora, a ONU revela que existe um risco semelhante para quem vive da pesca em rios e lagos.
O assunto é detalhado no relatório Blue Harvest: Inland Fisheries as an Ecosystem Service (Colheita Azul: Pesca de Água Doce enquanto Serviço prestado por um Ecossistema, em tradução livre), lançado na sexta-feira pelo Pnuma em Nagoia, durante a COP-10. O estudo foi elaborado em parceria com o World Fish Center, uma ONG que promove a pesca como forma de combater a fome.
Algo entre 13 e 30 milhões de toneladas de peixes são retirados anualmente de rios e lagos em todo o planeta – informação vaga devido à falta de registros adequados. Em termos globais, a sua distribuição é desigual. Cerca de 70% de toda a pesca fluvial e lacustre ocorre na Ásia, 25% na África e apenas 4% na América Latina. É compreensível. A população latino-americana concentra-se ao longo da costa, extensa e altamente biodiversa – talvez derive daí uma certo desinteresse pelos peixes de água doce.
O relatório do Pnuma alerta para sinais de que a pesca fluvial – que mantém-se num mesmo ritmo há mais de 40 anos – começa a declinar devido aos desequilíbrios ambientais. A organização aponta o dedo para os suspeitos habituais: as mudanças nos padrões das cheias e na velocidade das águas, perda de habitats ribeirinhos e de áreas de reprodução devido à construção de barragens, práticas agrícolas inadequadas e a retirada excessiva de água. Além disso, a urbanização e a construção de estradas, a poluição, o despejo de esgotos e as mudanças climáticas também estariam ameaçando os estoques fluviais.
Um dos exemplos ilustrativos é o da bacia do rio Yangtzé, na China, que recebe 25 bilhões de toneladas de esgotos anualmente, a maior parte não tratada. Ela também abriga inúmeros projetos hidrelétricos e uma intensa retirada de água para consumo humano. Em decorrência, a região está vendo uma queda drástica do volume de pesca do esturjão chinês e outras espécies.
É um problema grave do ponto de vista nutricional, ambiental e tabalhista. A pesca e o processamento do pescado fluvial geram cerca de 60 milhões de empregos, sejam eles em tempo integral ou parcial e as mulheres representam mais da metade desse contingente. Além disso, os peixes são essenciais para o equilíbrio dos ecossistemas de rios e lagos, ao controlarem as populações de plâncton, insetos e plantas aquáticas. Por fim, é importante lembrar que eles representam uma importante fonte de proteína animal e cálcio em boa parte do mundo. Segundo o relatório, em Bangladesh, a pesca fluvial fornece 40% da vitamina A e 31% de cálcio consumidos pela população. E, na África, 100 milhões de pessoas adquirem a maior parte de suas proteínas via pesca fluvial.