Pensa que só pedestre – pegando carona no delicioso post da Regina – tem dificuldade de atravessar a rua? Bicho de tudo quanto é tipo também tem, embora o problema seja mais comum não nas cidades onde habitam pedestres, motoristas, motociclistas – e uns gatos pingados de ciclistas –, mas sim nas áreas rurais entrecortadas por estradas. E os efeitos sobre os animais chegam ao nível genético, como mostra um artigo científico recém publicado na revista Basic and Applied Ecology.
Além de aumentar a mortalidade de animais selvagens, as estradas mudam seu comportamento e levam à fragmentação de seu habitat. Mas é ao restringir seus movimentos e ao aumentar o isolamento de populações que elas podem levar a conseqüências genéticas. Após uma revisão dos estudos sobre os impactos na variabilidade genética de populações, os autores do artigo concluem que, embora muitas estradas tenham sido construídas há menos de 50 anos, seus efeitos podem ser rápidos.
As estradas frequentemente diminuem a diversidade genética das populações afetadas ao reduzir o tamanho dessas populações e a variação na composição genética dos indivíduos dentro dela, escreveram os pesquisadores. Eles sugerem que a construção de túneis ou passarelas para permitir que os animais atravessem pode ajudar a diminuir as conseqüências genéticas que nosso caso de amor com os carros tem sobre a vida selvagem.
Que o digam os cangurus. Nas minhas primeiras viagens pela Austrália, achei exagerada a recomendação para não dirigir à noitinha, mas foi só botar o carro na estrada para entender. Difícil dirigir alguns quilômetros sem ver uma carcaça de canguru na beira da estrada. Os cangurus são mais ativos no fim da tarde e, atraídos pela grama e água nas bordas das rodovias, acabam na frente de um carro. Não há estatísticas oficiais, mas estima-se que centenas de milhares de animais morram todos os anos nas estradas. Quanto aos motoristas, em geral saem intactos. Um acessório quase obrigatório para quem dirige nas áreas rurais na Austrália é a “roo bar”, uma grade que vai na frente do carro para garantir que, na colisão com um canguru, seus ocupantes não sofram o impacto.
Além de túneis e passarelas, outros métodos testados para afugentar animais e evitar colisões incluem refletores que imitam os faróis de um carro, aparelhos que emitem som ultra-sônicos e o uso de odores – em geral o do predador da espécie que se quer proteger. Ainda assim, destaca Daniel Ramp, da Universidade de New South Wales, a melhor maneira de evitar a matança – e os efeitos genéticos – é pensar nas populações do entorno na hora de desenhar a estrada. E, claro, dirigir menos e mais devagar.