Cenas quase inimagináveis ocorreram nas semanas que passaram em Madison, capital do estado americano de Wisconsin. Milhares de pessoas saíram às ruas para protestar contra um projeto do governador e apoiar os sindicatos. Isso em um país em que a sindicalização e o poder dos sindicatos diminuem há olhos vistos há décadas. Dessa vez, porém, o ataque parece ter sido grande demais e muita gente se dispôs a agir, juntando-se a manifestações em frente ao Parlamento estadual.
O governador Scott Walker, republicano eleito em novembro, apresentou projeto para equilibrar o orçamento que prevê o corte de benefícios aos funcionários públicos e um ponto ainda mais polêmico, limites à negociação coletiva para o funcionalismo público. Na prática, trata-se de tirar dos sindicatos sua principal arma na batalha por melhores condições de trabalho. Desde meados de fevereiro, manifestantes protestam contra o projeto – que foi aprovado na Câmara dos Deputados – e os senadores democratas, minoria no Senado, deixaram o estado para impedir quorum para votar a matéria. Na última quarta-feira, os republicanos adotaram uma manobra que possibilitou a votação e a aprovação do projeto, sem debate e com 14 senadores ausentes.
Os sindicatos haviam concordado em aumentar a percentagem que os funcionários públicos contribuem para suas pensões e assistência médica e apontam que o projeto, mais do que equilibrar o orçamento, tem como objetivo neutralizar os sindicatos em Wisconsin, um estado com fortes raízes trabalhistas. Em vários estados americanos, os funcionários públicos não contam com a possibilidade de negociar coletivamente e, diante dos crescentes déficits orçamentários estaduais, vários outros estudam seguir o caminho de Wisconsin.
O elemento mais surpreendente em Wisconsin, entretanto, foi a disposição de muita gente de deixar o conforto do lar e enfrentar o frio para protestar sobre uma questão política. Analistas acreditam que os protestos de Madison podem ser o embrião da reação Democrata depois da vitória dos republicanos – com ajuda do chamado Tea Party, um movimento conservador que defende o corte de gastos públicos e menor taxação – nas últimas eleições.
Alguns esperam que Madison seja um “tipping point” para a mobilização política nos EUA, assim como os acontecimentos na Tunísia detonaram eventos em vários outros países do Oriente Médio. “Esses protestos talvez sejam o primeiro sinal de que o aprofundamento da crise econômica de 2008 pode empurrar muitos americanos para um tipo de política do protesto ausente deste país desde os anos 1930”, escreveu o socialista Billy Wharton.
Tal esperança talvez seja um tanto demasiada. Mas parte do movimento ambientalista acredita que é preciso aproveitar o momento. Os chefes de três importantes organizações – 350.org, Greenpeace e Rainforest Alliance – reforçaram nos últimos dias sua chamada à ação em defesa da justiça climática. “Do emocionante advento do movimento pela liberdade no Norte da África e no Oriente Médio à surpreendente defesa da democracia e dos direitos dos trabalhadores em Wisconsin, estamos vendo a força e a efetividade que as pessoas comuns podem ter quando se juntam”, escreveram.
Bill McKibben, da 350.org, diz que é preciso comunicar a urgência da situação diante das mudanças climáticas. “Uma das maneiras com que fazemos isso nesse país é com ação das massas e desobediência civil. É difícil e pode causar problemas, mas é algo que precisa ser parte do que fazemos”. A utilidade da ação em massa e de atos de desobediência civil, segundo ele, é relembrar as pessoas sobre quem são os radicais nessa história. “Os radicais não são as pessoas tentando fechar usinas a carvão nos EUA, os radicais são as pessoas dispostas a duplicar a quantidade de carbono na atmosfera e ver o que acontece”.