Alguns riscos, como o de um terremoto seguido de tsunami, são impossíveis de evitar. Outros podem ser evitados ou pelo menos minimizados. Por exemplo, o de manter em operação um reator nuclear cujo design é sabidamente falho em uma região suscetível a terremotos seguidos de tsunamis. Em meio à destruição causada pelos recentes eventos naturais no Japão, uma das notícias mais chocantes é a de que o reator “Mark 1”, fabricado pela General Electric, e em uso na usina de Fukushima, reconhecidamente tem problemas de segurança.
Segundo reportagem do The New York Times, o primeiro alerta sobre Mark 1 foi dado em 1972. O compartimento de contenção de um reator é sua última linha de defesa, explica a reportagem. É feito de aço e concreto e desenhado para evitar que – no caso de desastre e da dificuldade de esfriar o reator, como acontece em Fukushima – as varetas de combustível emitam radiação no meio ambiente. O tipo de compartimento usado em Fukushima é menos robusto e mais suscetível à falha do que na maioria das usinas nucleares em operação no mundo. Das mais de 100 usinas nucleares nos EUA, 23 usam o Mark 1, mas com modificações para diminuir os riscos em caso de acidente. Não se sabe se houve adaptação nos reatores de Fukushima, nem se os acontecimentos no Japão teriam se desenrolado de forma diferente se a usina usasse outro tipo de reator.
Em um sistema de drenagem de um bairro, por exemplo, os canos que permitem o escoamento de água precisam ser grandes o suficiente para suportar uma enchente de grandes proporções. As chances são de que, em média, o sistema precisará dar conta apenas de enchentes moderadas, mas uma boa avaliação de risco envolve a previsão de que um evento catastrófico pode ocorrer. Construir o sistema para suportá-los, entretanto, torna a empreitada muito mais cara. Segundo o The New York Times, o marketing da GE para os reatores Mark 1 é de que eles são mais baratos e mais fáceis de construir. Acabaram empregados em usinas construídas sobre falhas geológicas.
Em entrevista à rádio pública australiana dias atrás, o CEO da GE, Jeff Immelt, soou como um disco riscado e disse apenas que a empresa está respondendo a todas as necessidades do governo japonês e da empresa elétrica local.
No site Good, um comentarista listou o alerta sobre o Mark 1 entre outros que foram soados antes de desastres recentes, como o furacão Katrina em New Orleans, o acidente com os 33 mineiros no Chile e o derramamento de óleo por uma plataforma da BP no Golfo do México. Seria demais incluir na lista de riscos que corremos, mesmo sabendo da possibilidade de resultados catastróficos, a contínua emissão de gases de efeito estufa na atmosfera?
O consenso científico é de que as atividades humanas – especialmente a queima de combustíveis fósseis – contribuem para as mudanças climáticas cujos resultados podem alterar drasticamente as condições para a vida humana na superfície da Terra. Ainda há tempo de mudar de rumo mas, por enquanto, continuamos agindo como se o risco não existisse. Como disse o ativista Bill McKibben recentemente, trata-se de um experimento radical.
Se há uma certeza, é a de que o desastre no Japão vai deixar em seu rastro um longo debate sobre o futuro da indústria nuclear. Enquanto a Alemanha se apressou em fechar sete usinas com os reatores mais antigos no país, e outros países europeus agiram na mesma linha, o presidente americano Barack Obama continua apostando na energia nuclear como opção para reduzir a emissão de gases de efeito estufa. Ironicamente, foram justamente os temores em relação às mudanças climáticas que ajudaram a energia nuclear a se reerguer depois dos acidentes de Three Mile Island, em 1979, e de Chernobyl, em 1986, e a se apresentar como opção limpa.
Todas as opções energéticas, lembra Obama, carregam riscos. No Japão, que conta com poucas alternativas energéticas e depende pesadamente do petróleo, a energia nuclear é business as usual, segundo uma análise recente. “Se concluirmos que o futuro será igual ao passado, então a energia nuclear parece ser a escolha certa”, escreveram os autores. Há quem acredite que é possível tornar as energias renováveis uma realidade no mundo inteiro em 40 anos, apesar do tamanho da empreitada. No curto prazo, entretanto, a fonte mais à mão para substituir a nuclear é o gás natural.
Se, entretanto, prestarmos atenção aos alarmes que há tempos soam sobre a necessidade de mudar nossos hábitos energéticos, e se admitirmos que eventos catastróficos e surpresas podem ocorrer, talvez nossa avaliação dos riscos mude. E, com ela, nosso futuro.