Documento recém-lançado contribui para encontrar uma modelagem macroeconômica mais consistente para a economia verde
A conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável [1] foi convocada para estabelecer um compromisso político global que inclua “desafios novos e emergentes”. Principalmente para a “economia verde”. Decorrência da Green Economy Initiative (GEI), lançada em 2008 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), com o objetivo de apoiar governos na formulação de políticas de incentivo à adoção de tecnologias limpas, energias renováveis, manejo de recursos naturais e de resíduos, novas práticas agrícolas etc. Iniciativa que logo fez emergir a Green Economy Coalition (GEC), uma frente de treze organizações internacionais de consumidores, trabalhadores, empresários, ambientalistas e pesquisadores.
[1] “UNCSD-2012”, “Earth Summit 2012”, ou “Rio+20”. Acesse aqui.
GEI e GEC entendem que “economia verde” será aquela que, além de se tornar justa e resiliente, também consiga melhorar a qualidade de vida de todos dentro dos limites ecológicos deste planeta.
O problema é saber se tão nobre objetivo poderia ser atingido pelo que tem sido chamado de “crescimento verde” ou se, ao contrário, será preciso “decrescimento” (com ou sem transição pela “condição estável”).
A ideia de que o desenvolvimento sustentável exigirá “crescimento verde” já havia sido adotada em 2005, na 5ª Conferência Ministerial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Ásia e no Pacífico, realizada em Seul (MCED 2005). Todavia, tal tese ganhou muito mais força a partir de 2009, quando começou a ser patrocinada pela OCDE, que está elaborando uma “estratégia” a ser aprovada em Paris em maio. E será apoiada por esmagadora maioria de economistas convencionais, pois estes estão convictos de que o crescimento econômico acabará por promover o divórcio entre o uso de recursos naturais e a expansão produtiva.
É bem anterior a ideia oposta: de que a sustentabilidade do desenvolvimento é incompatível com a obsessão pela manutenção do crescimento. Surgiu em 1966 em publicações praticamente simultâneas de Kenneth Boulding (1910-1993) e de Nicholas Georgescu-Roegen (1906-1994). Em 1973 foi reformulada por Herman E. Daly (1938- ), com teses ligeiramente diferentes que receberam recente consolidação com duas obras fundamentais: Managing without growth (Peter Victor, 2008) e Prosperity without growth (Tim Jackson, 2009).
O crescimento econômico piora a depleção ecossistêmica absoluta, mesmo quando o consumo de energia e de matéria aumenta menos que o produto. Em outras palavras, não é absoluta a separação entre uso de recursos naturais e expansão produtiva, por mais significativa que ela possa ser em termos relativos.
Então, para que a prosperidade das sociedades humanas respeite seus limites ecológicos, o futuro exigirá uma estabilização do consumo. E daí decorre a pergunta crucial: há macroeconomia que não seja essencialmente baseada no aumento incessante do consumo?
A única resposta positiva a tal pergunta foi dada pelo modelo LowGrowth, construído pelo professor Peter Victor, que simulou quatro cenários básicos em que a economia canadense reduziria gradualmente suas taxas de aumento do PIB para atingir, após dois decênios, uma situação sem crescimento (no growth). Semelhante àquela que economistas clássicos haviam chamado de “condição estacionária”, e que Herman E. Daly preferiu denominar de steadystate economy, embora nenhum desses rótulos corresponda realmente à ideia de uma sociedade que prospera sem que sua economia aumente, âmago da contribuição de Peter Victor no contexto do Canadá.
Nos quatro cenários, caem pela metade os níveis de desemprego, de pobreza e da relação dívida/PIB. O que varia é o volume de emissões de gases estufa. Sem taxação do carbono, esse volume aumentaria 30% no estilo com mais ênfase em investimento do que em comércio internacional, e 14% na hipótese inversa, com mais comércio e menos investimento. Com carbono tributado, essas elevações se transformariam em quedas de 22% e 31%, respectivamente. O que permite inferir que a prosperidade sem crescimento poderia ser um objetivo de médio prazo para os vinte e poucos países centrais que já atingiram padrões de vida comparáveis aos do Canadá.
O grande obstáculo é que essa nova macroeconomia de Peter Victor, também esboçada por Tim Jackson (capítulo 8 e apêndice 2), só poderá persuadir os tomadores de decisão quando sua modelagem se tornar muito mais consistente. Daí a importância do recente relatório A Scoping Study on the Macroeconomic View of Sustainability, elaborado em parceria do Sustainable Europe Research Institute com a empresa Cambridge Econometrics. É uma forte luz sobre o caminho.
*Professor titular da FEA e orientador do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Relações Internacionais (IRI), da USP. Mais aqui.[:en]Documento recém-lançado contribui para encontrar uma modelagem macroeconômica mais consistente para a economia verde
A conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável [1] foi convocada para estabelecer um compromisso político global que inclua “desafios novos e emergentes”. Principalmente para a “economia verde”. Decorrência da Green Economy Initiative (GEI), lançada em 2008 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), com o objetivo de apoiar governos na formulação de políticas de incentivo à adoção de tecnologias limpas, energias renováveis, manejo de recursos naturais e de resíduos, novas práticas agrícolas etc. Iniciativa que logo fez emergir a Green Economy Coalition (GEC), uma frente de treze organizações internacionais de consumidores, trabalhadores, empresários, ambientalistas e pesquisadores.
[1] “UNCSD-2012”, “Earth Summit 2012”, ou “Rio+20”. Acesse aqui.
GEI e GEC entendem que “economia verde” será aquela que, além de se tornar justa e resiliente, também consiga melhorar a qualidade de vida de todos dentro dos limites ecológicos deste planeta.
O problema é saber se tão nobre objetivo poderia ser atingido pelo que tem sido chamado de “crescimento verde” ou se, ao contrário, será preciso “decrescimento” (com ou sem transição pela “condição estável”).
A ideia de que o desenvolvimento sustentável exigirá “crescimento verde” já havia sido adotada em 2005, na 5ª Conferência Ministerial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento na Ásia e no Pacífico, realizada em Seul (MCED 2005). Todavia, tal tese ganhou muito mais força a partir de 2009, quando começou a ser patrocinada pela OCDE, que está elaborando uma “estratégia” a ser aprovada em Paris em maio. E será apoiada por esmagadora maioria de economistas convencionais, pois estes estão convictos de que o crescimento econômico acabará por promover o divórcio entre o uso de recursos naturais e a expansão produtiva.
É bem anterior a ideia oposta: de que a sustentabilidade do desenvolvimento é incompatível com a obsessão pela manutenção do crescimento. Surgiu em 1966 em publicações praticamente simultâneas de Kenneth Boulding (1910-1993) e de Nicholas Georgescu-Roegen (1906-1994). Em 1973 foi reformulada por Herman E. Daly (1938- ), com teses ligeiramente diferentes que receberam recente consolidação com duas obras fundamentais: Managing without growth (Peter Victor, 2008) e Prosperity without growth (Tim Jackson, 2009).
O crescimento econômico piora a depleção ecossistêmica absoluta, mesmo quando o consumo de energia e de matéria aumenta menos que o produto. Em outras palavras, não é absoluta a separação entre uso de recursos naturais e expansão produtiva, por mais significativa que ela possa ser em termos relativos.
Então, para que a prosperidade das sociedades humanas respeite seus limites ecológicos, o futuro exigirá uma estabilização do consumo. E daí decorre a pergunta crucial: há macroeconomia que não seja essencialmente baseada no aumento incessante do consumo?
A única resposta positiva a tal pergunta foi dada pelo modelo LowGrowth, construído pelo professor Peter Victor, que simulou quatro cenários básicos em que a economia canadense reduziria gradualmente suas taxas de aumento do PIB para atingir, após dois decênios, uma situação sem crescimento (no growth). Semelhante àquela que economistas clássicos haviam chamado de “condição estacionária”, e que Herman E. Daly preferiu denominar de steadystate economy, embora nenhum desses rótulos corresponda realmente à ideia de uma sociedade que prospera sem que sua economia aumente, âmago da contribuição de Peter Victor no contexto do Canadá.
Nos quatro cenários, caem pela metade os níveis de desemprego, de pobreza e da relação dívida/PIB. O que varia é o volume de emissões de gases estufa. Sem taxação do carbono, esse volume aumentaria 30% no estilo com mais ênfase em investimento do que em comércio internacional, e 14% na hipótese inversa, com mais comércio e menos investimento. Com carbono tributado, essas elevações se transformariam em quedas de 22% e 31%, respectivamente. O que permite inferir que a prosperidade sem crescimento poderia ser um objetivo de médio prazo para os vinte e poucos países centrais que já atingiram padrões de vida comparáveis aos do Canadá.
O grande obstáculo é que essa nova macroeconomia de Peter Victor, também esboçada por Tim Jackson (capítulo 8 e apêndice 2), só poderá persuadir os tomadores de decisão quando sua modelagem se tornar muito mais consistente. Daí a importância do recente relatório A Scoping Study on the Macroeconomic View of Sustainability, elaborado em parceria do Sustainable Europe Research Institute com a empresa Cambridge Econometrics. É uma forte luz sobre o caminho.
*Professor titular da FEA e orientador do Programa de Pós-Graduação do Instituto de Relações Internacionais (IRI), da USP. Mais aqui.