Em um país onde apenas 6% da população tem acesso à eletricidade e os principais combustíveis são lenha e diesel, é vital assegurar uma fonte confiável e relativamente barata de energia. Especialmente se esse país assumiu meta de se tornar uma nação de classe média – equivalente ao Brasil hoje – até 2020. Dos desafios que Ruanda enfrenta para alcançar tal objetivo – que não são poucos nem pequenos –, a questão energética é crucial. A boa notícia é que o governo ruandês parece ter optado pela energia geotérmica.
Ruanda anunciou recentemente que pretende perfurar poços exploratórios no Parque Nacional dos Vulcões – que também abriga 30% da população mundial de gorilas-das-montanhas e atrai cada vez mais turistas – e em outras duas localidades. Depois vai convidar investidores a explorar energia geotérmica para produzir cerca de 300 MW – a quantidade é mínima se comparada aos mais de 100 mil MW que o Brasil geral, mas substancial dada a capacidade hoje instalada em Ruanda, de cerca de 73 MW.
A ideia é gerar o suficiente para prover 50% das necessidades nacionais até 2020 – a expectativa é que o PIB ruandês, que vem aumentando cerca de 7% ao ano desde 2003, continue crescendo. De quebra, o país pode acabar provando ao mundo que é possível crescer e se desenvolver com energia renovável.
A questão energética está no centro de vários problemas que Ruanda enfrenta. Com a grande dependência da população da lenha como combustível, o país perdeu 64% da cobertura florestal entre 1960 e 2007, segundo estudo da Programa para o Meio Ambiente das Nações Unidas (Pnuma). Dez por cento do território é hoje coberto por florestas, e o governo quer alcançar 30% até 2020. Para isso, precisa oferecer alternativas à lenha e ao carvão. O setor industrial, por sua vez, é dependente do diesel – segundo o Pnuma, cerca de 42% da eletricidade produzida em Ruanda provém de geradores a diesel. O diesel é combustível fóssil cuja queima contribui para mudanças no clima – em Ruanda, uma dessas mudanças é o aumento da severidade das secas, o que afeta a produção de eletricidade por usinas hidroelétricas.
Para desenvolver as capacidades necessárias para explorar o potencial geotérmico, Ruanda recorreu à vizinhança.
O Quênia, que produz cerca de 200MW a partir da energia da terra e tem planos de chegar a 5 mil MW até 2030, está treinando técnicos ruandeses e ajudando no desenvolvimento de infra-estrutura e sistemas em Ruanda. A exploração geotérmica no Quênia hoje é dominada por investidores chineses, mas o governo queniano acaba de criar uma empresa estatal para avançar no setor. De olho nos recursos naturais e no mercado africano, os chineses têm emprestado mais dinheiro aos países do continente do que o Banco Mundial, mas a forte presença chinesa causa tensão no Quênia e em outros países.
No caso de Ruanda, quem serão os investidores ainda está em aberto, mas a opção pela energia geotérmica faz todo o sentido. Com mais de metade da população vivendo com menos de 1 dólar por dia e a herança do genocídio de 1994, o país tem muito a avançar – se fizer isso sem recorrer aos combustíveis fósseis, terá dado uma lição ao mundo.