Robert Samuelson, articulista da revista semanal Newsweek, chamou recentemente o gás de xisto de “dádiva”: ele poderia, por exemplo, substituir o carvão mineral usado nas termelétricas – combustível cuja queima emite 50% mais dióxido de carbono. Ele lamenta que sua exploração enfrente excessiva regulamentação nos Estados Unidos e que ele é “um enorme presente geológico. Só um tolo o jogaria fora”.
Samuelson tem, de fato, boas razões para louvar a crescente popularidade do gás de xisto, que alguns gostariam de ver como “combustível de transição” entre o modelo atual baseado nas energias fósseis e o paraíso das novas renováveis, ainda não plenamente desenvolvido. E o Brasil também razões adicionais para prestar atenção nessa opção, por ter acesso à décima maior reserva tecnicamente recuperável do mundo, segundo relatório recente da Agência Internacional de Energia – embora apenas uma parte dela possa ser extraída de forma viável comercialmente. As reservas brasileiras de gás de xisto são, inclusive, muito maiores do que as de gás natural.
Mas, como qualquer um que estuda as muitas opções energéticas do mercado sabe, todas têm algum podre, por discreto que seja. A revista Time, principal rival da Newsweek de Samuelson, saiu recentemente com uma capa que explora esse outro lado do gás de xisto. O principal problema vem da forma como ele é extraído do subsolo. É utilizado um sistema de quebra hidráulica, somado a um modelo de perfuração horizontal que utiliza muita água, algo como 19 milhões de litros por poço. Muitas vezes essa água, misturada a aditivos químicos (cuja composição não é divulgada) e a um pequeno volume de estrôncio, um elemento radioativo, vaza para reservatórios vizinhos – a Time menciona registros de mais de mil casos desse tipo de contaminação.
Além disso, alguns pesquisadores têm afirmado que o gás de xisto pode ser até pior de um ponto de vista climático que o carvão. Robert Howarth, da Cornell University, nos Estados Unidos, coordenou o primeiro estudo amplo sobre os gases produzidos por esse processo. O documento, recém-divulgado, aponta o problema do elevado volume de metano, um gás-estufa, emitido pelos poços de onde o gás é extraído. “Se comparada à do carvão mineral, a pegada do gás de xisto é pelo menos 20% superior e e talvez ela possa ser mais de duas vezes maior num horizonte de 20 anos”, diz o trabalho. Howarth deixa claro que não considera nada promissora a idéia de elevar o gás de xisto à posição de “combustível de transição”.