Em meio a uma batalha política que pode tanto transformar a economia australiana quanto derrubar a primeira ministra trabalhista Julia Gillard, o governo australiano anunciou no último domingo os detalhes de seu novo plano para cortar 5% das emissões de carbono até 2020 e 80% até 2050 (com base nos níveis de 2000).
A discórdia em torno de um projeto para cortar emissões se arrasta há anos (alguns capítulos da história aqui, aqui, aqui e aqui). Embora o plano atual seja visto por muitos como insuficiente, parece ter se tornado a última esperança de que o país comece a agir para reduzir emissões. A Austrália tem uma das taxas de emissões per capita mais altas do mundo e, globalmente, está entre os 20 maiores emissores: sua população de cerca de 22 milhões produz 1,5% das emissões globais.
Depois de meses de discussão, um comitê multi-partidário – do qual não participam os partidos Liberal e Nacional, de oposição – decidiu instituir imposto de 23 dólares australianos (cerca de R$ 38) por tonelada de CO2 emitida a partir de julho de 2012. O preço será elevado em 2,5% ao ano até que, em julho de 2015, entre em vigor um esquema de negociação de emissões e o custo da tonelada passe a ser determinado pelo mercado.
Mais da metade da receita levantada vai ser usada, via corte de impostos e transferências diretas, para ajudar as famílias australianas a enfrentar o aumento no custo de vida decorrente da nova taxa. Vários setores da economia também terão uma mãozinha, com permissões gratuitas para emitir. Segundo o governo, apenas os 500 maiores poluidores terão de pagar por toda tonelada de CO2 emitida. Agricultura e combustíveis para transporte individual ficam de fora do novo imposto.
De outro lado, o pacote destina fundos para investimentos em energias renováveis, eficiência energética, políticas de uso da terra e conservação da biodiversidade. O programa estabelece em 50% a proporção de créditos que poderão ser “importados” de outros países quando o esquema reverter para um mercado de carbono.
As pesquisas mostram que boa parte dos australianos se opõe ao novo plano e o apoio ao governo trabalhista caiu para 27%. Ainda assim, há quem diga que a proposta, a ser apresentada ao Parlamento em agosto, tem alguma chance de ser aprovada. O governo de Gillard conta com o apoio de parlamentares independentes e do Partido Verde. Com nove parlamentares em um Senado em que nenhum partido detém maioria, os Verdes serão o fiel da balança na votação e, dessa vez, apóiam o governo.
Em um artigo publicado no jornal The Guardian, o escritor australiano Richard Flanagan disse que o plano do governo é um “começo corajoso”. “Há muitos argumentos contra o imposto. O melhor argumento que se pode fazer a favor dele é que, como todas as grandes reformas, é um começo histórico. E talvez sua característica mais importante seja a esperança implícita no imposto sobre o carbono”.
Ter uma política para as mudanças climáticas – mesmo que careça de aperfeiçoamento posterior – parece fazer toda a diferença quando se trata de investimentos futuros e inovação. Nos Estados Unidos, onde qualquer possibilidade de tal política parece morta e enterrada, o risco é que empresas e empreendedores comecem a engavetar seus planos, como no caso da American Electric Power e seu projeto para capturar CO2 em usinas a carvão. Na Austrália, por enquanto, a esperança continua viva.