A máxima de que “o edifício mais verde é aquele já construído” tem adeptos mundo afora, mas em geral a tentativa de adaptar prédios antigos para que consumam menos energia esbarra na necessidade de pagar primeiro por uma economia que virá ao longo de anos.
Para contornar o problema, foi criado na Califórnia há alguns anos um programa para ajudar os proprietários de imóveis a fazer reformas ou comprar equipamentos e pagar quando estes estiverem gerando economia na conta de eletricidade. Batizado de PACE (Property Assessed Clean Energy), o programa se espalhou pelos EUA. E, com a recessão impedindo que cidades e estados banquem os custos, atraiu a atenção do setor privado – que acaba de lançar um consórcio para explorar oportunidades no mercado de retrofitting.
Trata-se de pesos-pesado: a gigante do setor de defesa Lockheed Martin, o banco Barclays Capital, a seguradora Energi, a resseguradora Hannover Re, e o fundo Ygrene. O grupo, articulado pelo Carbon War Room (uma ONG criada por Richard Branson, dono do grupo Virgin), anunciou investimentos de US 650 milhões nas cidades de Miami e Sacramento.
No esquema original, a cidade ou o estado captam recursos no mercado por meio de bônus a serem pagos com a receita de um aumento do imposto predial dos imóveis beneficiados pelos retrofits. Assim, dão uma mão aos proprietários – em vez de pagar adiantado o valor total das reformas, eles repagam a cidade ao longo de 15 ou 20 anos, quando já estarão colhendo os frutos das reformas.
Na versão anunciada pelo Carbon War Room, o município apenas endorsa o plano, mas não participa da engenharia financeira. Para contornar um dos maiores problemas no financiamento da adaptação de prédios existentes – o risco de que os ganhos energéticos não se materializem –, o grupo conta com a garantia da Lockheed Martin e com seguros e resseguros. O Barclays concederá financiamentos de curto prazo para que as obras sejam iniciadas e, com base nesses empréstimos, oferecerá bônus de longo prazo ao mercado, pagando os investidores com a receita gerada por um aumento do imposto dos imóveis beneficiados. O consórcio vai focar apenas em prédios comerciais e industriais. Segundo o consórcio, há um mercado trilionário de retrofits energéticos com potencial para criar empregos e atividade econômica em meio à recessão pela qual passa os EUA.
A adaptação de edifícios existentes é cada vez mais reconhecida como importante para reduzir as emissões de carbono nas cidades – nos Estados Unidos, estima-se que os edifícios sejam responsáveis por 38% das emissões de carbono. Um estudo britânico de 2008 mostrou que embora novas construções sejam mais eficientes do ponto de vista energético uma vez construídas, adaptar prédios já existentes gera 70% menos emissões de carbono do que construir. Na maioria dos casos, aponta o estudo, leva mais de 50 anos para que essa diferença nas emissões seja compensada pela eficiência energética embutida nas novas construções.
Há outros elementos a se considerar na decisão entre adaptar ou construir – como o fato de que novas construções podem ser mais densas, ou mais próximas ao transporte público, por exemplo –, mas há pouca dúvida de que há um belo mercado a ser explorado, haja vista o interesse da Lockheed Martin e outras grandes empresas. Com o setor privado em ação, o retrofitting não depende mais da benevolência governamental, mas como em qualquer mercado é preciso vigiar para que o produto – nesse caso, ganhos ambientais – seja entregue conforme o prometido.