Se há uma coisa com que a maioria das pessoas no mundo não precisa se preocupar é com predadores, já que há muito exterminamos boa parte dos grandes animais que costumavam se alimentar de humanos. Aqui no estado de Western Australia, entretanto, uma onda de ataques de tubarão tem despertado medo e apelos para que o governo abata os animais. Ao mesmo tempo, uma espécie de tubarão – o baleia – é a estrela da mais recente campanha para atrair turistas ao estado.
Somente nesta primavera, o estado registrou quatro ataques fatais. Em outubro, um turista americano foi morto por um tubarão enquanto mergulhava na costa de uma ilha próxima à capital, Perth. Em setembro, um cidadão de Perth desapareceu enquanto nadava – apenas seu calção de banho com marcas típicas de um ataque de tubarão foi encontrado.
Com a mídia explorando os detalhes de casos como esses, não demorou para que se apontassem “culpados”. Um representante do Departamento de Pesca do estado, por exemplo, especulou se a população de tubarões estaria aumentando devido a medidas de restrição à pesca na região. Os tubarões são protegidos em Western Australia e, com medidas para diminuir o pescado em geral, teriam mais alimento à disposição. Segundo o raciocínio, com mais tubarões no oceano, maior a probabilidade de um encontro com um banhista ou mergulhador.
A Taronga Conservation Society of Australia, que mantém uma série de dados histórica sobre ataques de tubarão nos 35 mil quilômetros de costa do país, destaca que é muito mais provável que o aumento da população humana seja o problema. Nos últimos 50 anos, a Taronga contou 53 mortes devido a ataques de tubarão na Austrália – média de pouco mais de 1 por ano. Com mais gente habitando o país – a população australiana quase triplicou desde 1950 – e a popularidade das praias e esportes aquáticos, diz a entidade, aumentam as chances.
Há mais de 370 espécies de tubarão no mundo, e mais de 100 delas habitam a costa de Western Australia, inclusive o tubarão branco, que criou fama de predador feroz com o filme Tubarão, lançado em 1975. Segundo a Lista Vermelha das espécies ameaçadas da IUCN, o tubarão branco é uma espécie vulnerável – cuja probabilidade de se tornar ameaçada é alta se as circunstâncias que prejudicam suas chances de reprodução e sobrevivência não melhorarem. Em geral, os tubarões demoram para atingir a maturidade e se reproduzir – no topo da cadeia alimentar marinha, são considerados essenciais para a saúde dos oceanos.
Depois de muita discussão sobre como reagir aos ataques, o governo de Western Australia anunciou há dias sua estratégia de ação: vai investir quase $14 milhões em pesquisa. Um estudo vai procurar correlações entre os ataques e condições do tempo e a temperatura da água, e tubarões detectados próximos das praias preferidas pelos banhistas serão marcados e monitorados. Vôos de helicóptero sobre as praias da capital serão incrementados e um sistema de alerta baseado em mensagens SMS para o público será testado.
Segundo operadores de turismo, os ataques dão má reputação ao estado e espantam os turistas. Mas o governo mantém um tubarão, o baleia, no centro de sua campanha para atrair turistas ao recife de Ningaloo, a 1200 km o norte de Perth. Chegando a medir 13 metros e pesar 21 toneladas – o maior peixe existente –, o baleia é considerado um tubarão “do bem”, pois alimenta-se de plâncton por filtração e não ameaça mergulhadores e banhistas. Em Ningaloo, uma das grandes atrações turísticas são tours para nadar com os baleia e a popularidade desses gigantes continua crescendo. Na última estação (de março a agosto), o parque marinho de Ningaloo recebeu 17,5 mil pessoas, 22% a mais do que no ano anterior.
A experiência de nadar perto de um gigante como o tubarão-baleia, diz quem já esteve em Ningaloo, coloca nossa existência em perspectiva. O mesmo deveria decorrer do fato de que outras espécies de tubarão continuam a habitar os oceanos. Trata-se do ambiente deles que nós, animais terrestres que esquecemos o que é ser presa, arriscamos a visitar. Pessoalmente, apesar dos 40 graus no verão, prefiro ficar na areia.