Pentes de plástico, espelhos, batons, tecidos, bonecas, perfumes. Segundo os registros de Pierre Verger, essas oferendas, hoje mais que capitalizadas, tiveram origem no século XIX de forma bem diferente.
Na Wikipedia esta história está ligada a migrações iorubás, a guerras civis africanas e a um rio com o nome da divindade. No meio do bafafá todo, o que algumas populações levaram consigo, como lembrança, restringiu-se a objetos.
Séculos à frente, as manchetes do jornal trazem uma imagem perturbadora do que se tornou o exercício espiritual para os filhos das águas. OBS: yemanjá significa “Cujos filhos são peixes”.
Uma fila colossal, com milhões de pessoas a espera de embarcar seus utensílios coloridos e poluentes em um barco, via direta de conversa entre a Rainha e seus crentes, congestionam as areias de Salvador. Dona Maria, com seu “kit agradecimento” juntou uma boneca para cada filha, agradecendo a boa saúde. Os pescadores da associação local reuniram, durante o ano todo, verba para comprar tudo de mais colorido para a deusa.
O que ninguém quer saber é onde Yemanjá guarda todos esses presentes. Na barriga dos peixes ou nas ilhas de lixo isoladas no oceano, eles não me parecem muito bem organizados.
Pela tradição, quando uma oferenda é encontrada na praia, significa que o pedido foi negado. Com as enchentes e alagamentos previstos para este ano, muitos pedidos, inclusive dos dias 2 de fevereiro passados (e dos 365 dias que são mais uma desova ou descarrego), aparecerão não só nas praias, mas nos bueiros e casas dos filhos de deus.
Yemanjá manda um recado este ano: repensemos a fé preservando nossas aguas para garantir tanto a saúde de nossos filhos quanto os peixes dos nossos semelhantes. Tomando consciência da responsabilidade que temos sobre os rios e mares, a fé em Yemanjá atravessará este fim de mundo dando inicio a um novo recomeço espiritualizado.
Luiza Xavier