A Austrália produziu esta semana o que alguns observadores consideram uma vitória para a saúde global. Uma decisão da Suprema Corte australiana validou a lei aprovada em 2010 que bane o uso de qualquer adorno ou cor nas embalagens de cigarro. A medida foi contestada pela indústria do tabaco e, com o veredito da corte, entrará em vigor em 1o de dezembro.
Espera-se que a decisão repercuta em outros países – Inglaterra, Noruega, Índia, França, Canadá e Nova Zelândia estariam considerando a adoção de embalagens neutras para os cigarros. “A mensagem para o resto do mundo é que a grande indústria do tabaco pode ser atacada e vencida”, disse Nicola Roxon, ex-ministra da Saúde e atual advogada-geral do governo australiano.
Pela nova lei, as embalagens não podem conter nenhuma figura a não ser as fotos que acompanham os avisos sobre os efeitos do cigarro à saúde, que cobrirão 75% da frente das embalagens e 90% da parte de trás. Os nomes das marcas e dos fabricantes serão impressos em fonte padronizada, pequena e genérica.
A ideia é impedir que os maços funcionem como propaganda móvel para o hábito de fumar e para as marcas de cigarros. As embalagens eram o último reduto para o marketing do tabaco na Austrália, já que o país proíbe qualquer propaganda de cigarro.
Perante a Justiça, a indústria do tabaco argumentou que a lei é inconstitucional pois viola a propriedade intelectual das fabricantes sem oferecer compensação. Teve de provar, entretanto, que a medida produziria qualquer vantagem para o governo além dos benefícios à saúde pública. Os detalhes da decisão da Corte ainda não foram divulgados.
A indústria promete continuar lutando contra a medida na esfera internacional. Três países – Honduras, República Dominicana e Ucrânia – contestam a lei australiana na Organização Mundial do Comércio.
É de se esperar que a indústria produza “evidências” em poucos meses de que as embalagens neutras não reduzem o consumo de cigarros. A medida, na realidade, é voltada a crianças e jovens para garantir que as futuras gerações não adquiram o hábito de fumar.
Simon Chapman, professor de saúde pública da Universidade de Sydney, lembrou que nos últimos 40 anos as quedas anuais no número de pessoas que fumam foram de frações de um ponto percentual, graças aos efeitos combinados de todas as políticas e programas. “A embalagem neutra pode amplificar essa tendência de queda, mas ninguém espera que ela seja dramaticamente acelerada entre os adultos que consomem 98,2% de todo o tabaco vendido”, escreveu.
Os opositores da medida acusam a Austrália de atuar como um “estado-babá”, interferindo em assuntos privados dos cidadãos e de empresas particulares. O argumento, segundo a historiadora americana Naomi Oreskes, é comum a questões ambientais que exigem regulação – como a chuva ácida, o buraco na camada de ozônio e a mudança climática – e tem raízes no comprometimento intelectual com o individualismo e o poder do mercado livre em proteger a liberdade política e econômica.
Globalmente, o hábito de fumar é a principal causa de mortes que poderiam ser prevenidas. A Organização Mundial da Saúde estima que 100 milhões de pessoas tenham morrido devido aos efeitos do cigarro ao longo do século XX.