Novas regras do Conar sobre sustentabilidade já levaram 17 anúncios a julgamento
No intervalo da novela, Dona Sílvia vê um anúncio do seu sabão em pó preferido dizendo que a versão líquida concentrada ajuda a reduzir o consumo de água. Ótimo, as crianças estão vendo essas coisas de meio ambiente na escola e toda hora tem alguma
no noticiário. É a chance de fazer sua parte já amanhã no mercado, porque o sabão está acabando. Mas como a simples troca de sabão em pó por líquido economiza essa água toda? Foi essa a dúvida que levou o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) a submeter o anúncio para televisão do Omo Concentrado, produzido pela Unilever, à apreciação por seu Conselho de Ética.
Fundamentados no princípio da exatidão e clareza das regras para publicidade com apelos de sustentabilidade, os relatores pediram comprovação da informação à empresa e à agência responsável pelo anúncio, a Ogilvy. Os cálculos apresentados não convenceram os relatores, que recomendaram a alteração da peça.
Este foi um dos 17 casos julgados pelo Conar com base nas novas regras, em vigor desde agosto do ano passado. Reunidas no Anexo U do Código de Autorregulamentação Publicitária [1] , as normas para publicidade com apelos de sustentabilidade trazem oito princípios: concretude, veracidade, exatidão e clareza, comprovação e fontes, pertinência, relevância, bem como não utilização de promessas de compensações plenas de impactos socioambientais nem associação da marca ou produto a causas e movimentos dos quais não participa efetivamente. (O Código e seus anexos estão disponíveis em conar.org.br)
Edney Narchi, vice-presidente do Conar, avalia positivamente a vigência das novas orientações. “No lançamento das normas, afirmamos que a publicidade brasileira não abusava de apelos de sustentabilidade antiéticos. Nossa iniciativa teve caráter estritamente preventivo.” Prova disso, para Narchi, foram as poucas recomendações de alteração ou sustação (interrupção na veiculação) de anúncios feitas pelo Conar às empresas – precisamente, quatro modificações e uma sustação.
Em sua maior parte, as campanhas avaliadas nessa primeira leva foram encaminhadas ao Comitê de Ética pelo próprio Conar, que dispõe de uma equipe de monitores verificando rotineiramente publicações impressas e mídia eletrônica de todo o País. Sempre que encontram algo aparentemente em desacordo com o Código, o anúncio é levado ao Conselho de Ética da entidade, que sorteia um relator entre seus mais de cem conselheiros [2]. Não se exige que o relator tenha domínio técnico do tema em julgamento. “Este não é um pré-requisito, pois o que se julga, sempre, é a percepção que a peça publicitária gera no consumidor médio”, explica Narchi.
[2] O Conar também recebe denúncias de pessoas físicas ou empresas, comunicadas no site.
O problema é que o consumidor médio, como nossa fictícia Dona Sílvia, tem na televisão – com seus anúncios curtíssimos – sua principal referência de informação. Segundo pesquisa dos institutos Ethos e Akatu [3], 25% dos consumidores baseiam-se nas informações dos anúncios de televisão para escolher produtos com atributos sustentáveis quando são de alguma forma motivados a fazer uma escolha mais consciente. E, muitas vezes, acabam comprando gato por lebre. (A pesquisa O Consumidor Brasileiro e a Sustentabilidade está disponível em akatu.org.br/Publicacoes)
“As empresas tendem a destacar coisas que são irrelevantes ou inconsistentes e ocultar aquilo que é fundamental”, diz Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Oliveira cita o Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular, de caráter voluntário, como caso emblemático. É raro encontrar um veículo com o selo da iniciativa – semelhante ao selo do Procel utilizado em eletrodomésticos, com classificações de A (mais eficientes) a E (mais ineficientes). “O que mais se vê é marketing sobre o pneu verde, a fibra de coco nos estofados e outros detalhes. Porém, se a empresa oculta uma classificação E, que compromisso ela tem com a sustentabilidade e a transparência da informação ao consumidor?”
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