O desejo é de 50 anos de praia, mas com a aparência de 18
A partir deste mês, as Casas Bahia e o Magazine Luiza vão entrar no ramo da estética e da plástica. As grandes marcas aproveitarão a proximidade do verão, quando mais consumidores levam em conta a beleza física nas praias, para divulgar os novos serviços.
Vai funcionar da seguinte maneira: você informa no balcão o que deseja adquirir e um atendente agenda com o cirurgião. O cliente terá a chance de dividir em até 24 vezes sem juros aquela disfarçada no pé de galinha, a aplicação do botox, a esticada na testa franzida, o levantamento das pálpebras e o silicone no bumbum. Promoção de lançamento!
Calma, é brincadeira. As duas lojas não farão isso, mas bem que poderiam – se não houvesse restrições éticas e legais, obviamente. Ser mais velho todo mundo quer na hora de estacionar, dentro do shopping lotado, na vaga reservada aos idosos; ou para ter a preferência na fila do banco. Diante do espelho, é diferente. O desejo é de 50 anos de praia, com corpinho de 18.
De acordo com informações da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), o Brasil é o segundo país onde mais se faz a operação no mundo, superado somente pelos EUA. A última pesquisa do Ibope sobre o assunto (2009) apontou que cerca de 80% dos pacientes que passaram pelo procedimento eram mulheres.
Em popularidade, ganham, nesta ordem, as cirurgias de mama, lipoaspiração e intervenções na face. Desse total, 70% tiveram objetivos estéticos, enquanto as demais, reparadores – em decorrência de acidentes, por exemplo. Em torno de 90% das mulheres que implantaram silicone nas mamas o fizeram com a pura intenção de, no mínimo aos seus próprios olhos, ficarem mais bonitas e jovens.
Se você achou que os homens estão muito atrás nesses números, talvez boa parte deles tivesse menos dúvidas ao avançar nas prateleiras, caso as lojas, de fato, comercializassem as cirurgias. Conforme os dados da SBCP, em 1994, os pacientes do sexo masculino representavam apenas 5% das pessoas que tinham disposição para, como se diz, “entrar na faca” – em 2009, eram 20%. Sendo assim, em busca de impressionar com tanta juventude e vitalidade, passou a ser necessário fazer bem mais do que barba, cabelo e bigode.
Em 1994, inclusive, foram realizadas 100 mil cirurgias plásticas no Brasil, enquanto, em 2011, registraram-se 800 mil. As comparações que refletem o crescimento do mercado dizem respeito também ao número de profissionais capacitados a fazer as cirurgias: praticamente dobrou em relação há duas décadas.
Se você é das pessoas que por alguma razão evitam a cirurgia, embora não dispensem um creminho rejuvenescedor para o rosto, saiba que essa é outra área em expansão. Segundo os dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), o setor cresce em torno de 9% ao ano desde 2010.
O sucesso é atribuído pela Abihpec ao lançamento de produtos voltados para diversos biótipos e classes sociais. O público masculino colabora, quebrando o preconceito e se preocupando mais com a imagem e a apresentação. Além disso, o crescimento da expectativa de vida no País reforça essa procura por estratégias que garantam um ar eternamente jovem, apesar do avanço da idade.
O envelhecimento, tudo culpa dos espelhos. Com o tempo, essas superfícies opacas e reflexivas se revoltam cada vez mais. Trocam o frescor da nossa mocidade por uma expressão desgastada, que já não parece nos imitar com fidelidade.
Em março, a americana doutoranda em Sociologia Kjerstin Gruys encerrou uma experiência em que ficou um ano sem se olhar no espelho, ou em algum objeto equivalente. O objetivo era o de manter a autoestima em alta, mostrando que se pode oferecer ao mundo algo que ultrapasse as aparências. Suas impressões entraram no blog www.ayearwithoutmirrors.com e devem virar livro em 2013. Vale a pena refletir.
O próprio pai da psicanálise, Sigmund Freud, identificou o envelhecimento como uma das fontes de sofrimento do ser humano, no livro O Mal-Estar da Civilização. Buscar maneiras de frear o processo não é um problema. Priorizar a qualidade de vida e o bem-estar na velhice, aliás, é fundamental. A questão é quando se passa a observar o envelhecer como doença e se valoriza em excesso a perfeição física. A ditadura da estética é cruel.
Aceitar o envelhecimento faz parte. A juventude e o belo, com certeza, estão mais na forma de ver o mundo do que no modo como o mundo vê a gente.
*Eduardo Shor é jornalista