Desaceleração econômica coloca na mesa necessidade de revisão da meta brasileira para cortar emissões de carbono na indústria
Depois de consulta pública eletrônica realizada no ano passado [1], ficou pronto o Plano Indústria [2], um esforço setorial brasileiro para reduzir as emissões de CO2 até 2020. A proposta que visa diminuir em 5% as emissões industriais previstas para 2020, aguarda agora uma vaga na agenda da presidente Dilma Rousseff para ser anunciada. Nesse ínterim, porém, surgiu um questionamento: a meta de 5% poderá ser alcançada sem uma melhora significativa de eficiência do setor?
[1] Realizada de 15 de junho a 15 de agosto de 2012. [2] Como é conhecido o plano setorial de redução nas emissões do uso de energia e dos processos industriais. Consulte a versão do plano anterior à consulta pública
Quando o PIB cresce em ritmo mais lento ou decresce, as emissões tendem a acompanhar a tendência e declinam, como vem ocorrendo na Europa desde 2008. Fica mais fácil, portanto, cumprir a meta sem a necessidade de um grande esforço em termos de modificação na matriz energética e investimentos em tecnologias limpas.
É mais ou menos o que acontece no Brasil. A projeção de emissões para 2020 baseou-se em uma estimativa de aumento anual médio de 5% no Produto Interno Bruto (PIB) no período 2005- 2020. No entanto, o crescimento médio deve ficar em 3,6% entre 2005 e 2014 (considerando-se as projeções do mercado para este e o próximo ano, apuradas pelo Boletim Focus, do Banco Central). Mesmo no cenário otimista de crescimento de 5% ao ano a partir de 2015, a média para o período 2005-2020 seria levemente engordada, para 4,1%, ainda assim inferior à estimativa inicial de 5%.
A questão é levantada por Braulio Pikman, especialista em mudança climática e membro do Painel Metodológico do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto. “O nó está na base do cálculo das emissões, feito conforme uma estimativa de crescimento que não está acontecendo”, aponta Pikman. De qualquer maneira, o plano prevê revisão bianual da meta, que poderá ser ampliada.
“Em vez de utilizar o montante das emissões previsto lá atrás, o governo precisa usar o volume observado nos dois anos imediatamente anteriores à revisão bianual, para ajustar a curva e recalcular as metas de redução. Dessa forma, mantém-se o incentivo para o setor buscar maior eficiência em uso de energia e processos”, recomenda Pikman.
Para Alexandre Comin, diretor de competitividade industrial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), ainda é cedo para conhecer com maior precisão o impacto da desaceleração da economia no conjunto das emissões. “Por isso, não vejo necessidade por ora em tentar ‘acertar’ a meta com a trajetória de crescimento efetivo.” O MDIC também prefere não comentar por enquanto propostas específicas para a revisão bianual do Plano Indústria.
O problema é de outra ordem, na opinião de Paula Bennati, gerente-executiva de meio ambiente e sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em sua análise, a diminuição no ritmo de crescimento econômico do País não facilitará o cumprimento da meta de emissões da indústria, como se especula. “Apenas começamos a gestão de nosso carbono. Não se conhece, por exemplo, o quanto emitem as pequenas e médias empresas”, assinala. O grupo de trabalho que estabelecerá orientações técnicas para a elaboração dos inventários de emissões no âmbito do plano foi recém-criado e atualmente faz o levantamento das práticas de relato de emissões em cada setor.
Importante para o sucesso do compromisso federal voluntário [3] de mitigação de emissões até 2020, o Plano Indústria engloba inicialmente ações nos setores de alumínio, cimento, papel e celulose, químico, cal, vidro e aço. Seu objetivo é tornar mais eficiente a porção fabril das indústrias, em vez de funcionar como um obstáculo ao crescimento econômico, enfatiza Alexandre Comin.
[3] A Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) prevê corte nas emissões de CO2 equivalente na faixa de 36,1% a 38,9% até 2020. Trata-se de uma redução em relação ao cenário tendencial para 2020.
A projeção das emissões da indústria associadas ao uso de energia e aos processos industriais para 2020 é de 324,4 milhões de toneladas de gases de efeito estufa (GEE), medidas em CO2 equivalente. Conforme preconiza o Plano Indústria, caberá às empresas deixar de jogar na atmosfera 16,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente, reduzindo a emissão total para 308,2 milhões de toneladas. Tal redução é que pode ser atingida bem antes de 2020, por causa do crescimento mais modesto da economia.
Se a hipótese se confirmar, a conquista antecipada da meta de 2020 pode se transformar em uma indesejada vitória de Pirro da política climática do Brasil.[:en]Desaceleração econômica coloca na mesa necessidade de revisão da meta brasileira para cortar emissões de carbono na indústria
Depois de consulta pública eletrônica realizada no ano passado [1], ficou pronto o Plano Indústria [2], um esforço setorial brasileiro para reduzir as emissões de CO2 até 2020. A proposta que visa diminuir em 5% as emissões industriais previstas para 2020, aguarda agora uma vaga na agenda da presidente Dilma Rousseff para ser anunciada. Nesse ínterim, porém, surgiu um questionamento: a meta de 5% poderá ser alcançada sem uma melhora significativa de eficiência do setor?
[1] Realizada de 15 de junho a 15 de agosto de 2012. [2] Como é conhecido o plano setorial de redução nas emissões do uso de energia e dos processos industriais. Consulte a versão do plano anterior à consulta pública
Quando o PIB cresce em ritmo mais lento ou decresce, as emissões tendem a acompanhar a tendência e declinam, como vem ocorrendo na Europa desde 2008. Fica mais fácil, portanto, cumprir a meta sem a necessidade de um grande esforço em termos de modificação na matriz energética e investimentos em tecnologias limpas.
É mais ou menos o que acontece no Brasil. A projeção de emissões para 2020 baseou-se em uma estimativa de aumento anual médio de 5% no Produto Interno Bruto (PIB) no período 2005- 2020. No entanto, o crescimento médio deve ficar em 3,6% entre 2005 e 2014 (considerando-se as projeções do mercado para este e o próximo ano, apuradas pelo Boletim Focus, do Banco Central). Mesmo no cenário otimista de crescimento de 5% ao ano a partir de 2015, a média para o período 2005-2020 seria levemente engordada, para 4,1%, ainda assim inferior à estimativa inicial de 5%.
A questão é levantada por Braulio Pikman, especialista em mudança climática e membro do Painel Metodológico do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto. “O nó está na base do cálculo das emissões, feito conforme uma estimativa de crescimento que não está acontecendo”, aponta Pikman. De qualquer maneira, o plano prevê revisão bianual da meta, que poderá ser ampliada.
“Em vez de utilizar o montante das emissões previsto lá atrás, o governo precisa usar o volume observado nos dois anos imediatamente anteriores à revisão bianual, para ajustar a curva e recalcular as metas de redução. Dessa forma, mantém-se o incentivo para o setor buscar maior eficiência em uso de energia e processos”, recomenda Pikman.
Para Alexandre Comin, diretor de competitividade industrial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), ainda é cedo para conhecer com maior precisão o impacto da desaceleração da economia no conjunto das emissões. “Por isso, não vejo necessidade por ora em tentar ‘acertar’ a meta com a trajetória de crescimento efetivo.” O MDIC também prefere não comentar por enquanto propostas específicas para a revisão bianual do Plano Indústria.
O problema é de outra ordem, na opinião de Paula Bennati, gerente-executiva de meio ambiente e sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Em sua análise, a diminuição no ritmo de crescimento econômico do País não facilitará o cumprimento da meta de emissões da indústria, como se especula. “Apenas começamos a gestão de nosso carbono. Não se conhece, por exemplo, o quanto emitem as pequenas e médias empresas”, assinala. O grupo de trabalho que estabelecerá orientações técnicas para a elaboração dos inventários de emissões no âmbito do plano foi recém-criado e atualmente faz o levantamento das práticas de relato de emissões em cada setor.
Importante para o sucesso do compromisso federal voluntário [3] de mitigação de emissões até 2020, o Plano Indústria engloba inicialmente ações nos setores de alumínio, cimento, papel e celulose, químico, cal, vidro e aço. Seu objetivo é tornar mais eficiente a porção fabril das indústrias, em vez de funcionar como um obstáculo ao crescimento econômico, enfatiza Alexandre Comin.
[3] A Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) prevê corte nas emissões de CO2 equivalente na faixa de 36,1% a 38,9% até 2020. Trata-se de uma redução em relação ao cenário tendencial para 2020.
A projeção das emissões da indústria associadas ao uso de energia e aos processos industriais para 2020 é de 324,4 milhões de toneladas de gases de efeito estufa (GEE), medidas em CO2 equivalente. Conforme preconiza o Plano Indústria, caberá às empresas deixar de jogar na atmosfera 16,2 milhões de toneladas de CO2 equivalente, reduzindo a emissão total para 308,2 milhões de toneladas. Tal redução é que pode ser atingida bem antes de 2020, por causa do crescimento mais modesto da economia.
Se a hipótese se confirmar, a conquista antecipada da meta de 2020 pode se transformar em uma indesejada vitória de Pirro da política climática do Brasil.