A geoengenharia está tomando o lugar que foi dos alimentos transgênicos – uma tecnologia polêmica, panaceia para uns, demo para outros. Durante décadas, a engenharia genética foi alardeada pela indústria e parte dos agricultores como ferramenta poderosa para incrementar a produção de alimentos e biocombustíveis. Entretanto, enfrentou forte rejeição de quem temia e teme pelos seus possíveis impactos sobre a saúde e o meio ambiente. Os defensores do princípio da precaução, antagonistas dos alimentos “engenheirados”, perderam a batalha. Hoje, mais de 90% do milho e da soja plantados nos EUA e no Brasil são transgênicos.
A geoengenharia – o conjunto de intervenções físico-químicas em escala que visam modificar o clima -, espécie de Plano B de combate ao aquecimento global, segue pelo mesmo caminho. Desperta debates inflamados, teorias conspiratórias e desconfiança. Há um ano, dei um exemplo de aplicação descontrolada da bioengenharia no artigo Brincando de Deus, aqui na revista: uma experiência promovida por um milionário americano num arquipélago canadense. Ele convenceu os indígenas locais que seria uma boa ideia despejar 100 toneladas de sulfato de ferro nas águas do Pacífico para estimular a proliferação de plâncton e sequestrar carbono. Desde então, houve um rompimento entre os nativos e o empresário, Russ George, que respondeu lançando uma batalha judicial pela posse dos dados e materiais obtidos na experiência. Disparates como este levaram a Convenção da Diversidade Biológica da ONU a declarar, em 2010, uma espécie de moratória da experimentação em geoengenharia, mas o texto é vago e gerou dúvidas sobre sua extenção.
A despeito da celeuma e do vazio regulatório, a geoengenharia vai avançando, alimentada por uma indústria multimilionária. Bill Gates (Microsoft), Richard Branson (Virgin Group), Niklas Zennström (um dos fundadores do Skype) e Murray Edwards (pioneiro da também controvertida exploração de areias betuminosas) estão entre os principais financiadores de pesquisas na área.
Mas o campo dos adversários dessas novas tecnologias também tem figuras de peso. Há poucos dias, o ex-vice-presidente americano Al Gore, paladino da causa climática, declarou que seria “insano, completamente enlouquecido e delirante ao extremo” apelar para a geoengenharia para evitar uma catástrofe global. Ele reagiu a uma passagem do rascunho da mais recente edição do relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), a ser publicada em abril, que alerta que será necessário extrair grandes quantidades de gases-estufa da atmosfera via geoengenharia até 2100 para limitar os impactos das mudanças climáticas. Gore argumenta que a busca de uma solução imediatista, como solução desesperada, e que envolva o despejo de outras substâncias poluentes na atmosfera, pode levar a uma catástrofe ainda maior.[:en]
A geoengenharia está tomando o lugar que foi dos alimentos transgênicos – uma tecnologia polêmica, panaceia para uns, demo para outros. Durante décadas, a engenharia genética foi alardeada pela indústria e parte dos agricultores como ferramenta poderosa para incrementar a produção de alimentos e biocombustíveis. Entretanto, enfrentou forte rejeição de quem temia e teme pelos seus possíveis impactos sobre a saúde e o meio ambiente. Os defensores do princípio da precaução, antagonistas dos alimentos “engenheirados”, perderam a batalha. Hoje, mais de 90% do milho e da soja plantados nos EUA e no Brasil são transgênicos.
A geoengenharia – o conjunto de intervenções físico-químicas em escala que visam modificar o clima -, espécie de Plano B de combate ao aquecimento global, segue pelo mesmo caminho. Desperta debates inflamados, teorias conspiratórias e desconfiança. Há um ano, dei um exemplo de aplicação descontrolada da bioengenharia no artigo Brincando de Deus, aqui na revista: uma experiência promovida por um milionário americano num arquipélago canadense. Ele convenceu os indígenas locais que seria uma boa ideia despejar 100 toneladas de sulfato de ferro nas águas do Pacífico para estimular a proliferação de plâncton e sequestrar carbono. Desde então, houve um rompimento entre os nativos e o empresário, Russ George, que respondeu lançando uma batalha judicial pela posse dos dados e materiais obtidos na experiência. Disparates como este levaram a Convenção da Diversidade Biológica da ONU a declarar, em 2010, uma espécie de moratória da experimentação em geoengenharia, mas o texto é vago e gerou dúvidas sobre sua extenção.
A despeito da celeuma e do vazio regulatório, a geoengenharia vai avançando, alimentada por uma indústria multimilionária. Bill Gates (Microsoft), Richard Branson (Virgin Group), Niklas Zennström (um dos fundadores do Skype) e Murray Edwards (pioneiro da também controvertida exploração de areias betuminosas) estão entre os principais financiadores de pesquisas na área.
Mas o campo dos adversários dessas novas tecnologias também tem figuras de peso. Há poucos dias, o ex-vice-presidente americano Al Gore, paladino da causa climática, declarou que seria “insano, completamente enlouquecido e delirante ao extremo” apelar para a geoengenharia para evitar uma catástrofe global. Ele reagiu a uma passagem do rascunho da mais recente edição do relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), a ser publicada em abril, que alerta que será necessário extrair grandes quantidades de gases-estufa da atmosfera via geoengenharia até 2100 para limitar os impactos das mudanças climáticas. Gore argumenta que a busca de uma solução imediatista, como solução desesperada, e que envolva o despejo de outras substâncias poluentes na atmosfera, pode levar a uma catástrofe ainda maior.