Para alcançá-la, a chave está na integração entre segurança alimentar e segurança energética, os dois pilares fundamentais das estratégias de desenvolvimento
Em boa hora, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) lançou um estudo inovador [1] sobre a agricultura climaticamente inteligente, dando assim mais um passo na integração de critérios ambientais, sociais e econômicos aos quais as estratégias de desenvolvimento de longo prazo devem obedecer.
[1] Climate-Smart Agriculture – Sourcebook, FAO 2013. Veja também Anne Bogdanski, Integrated food-energy systems for climate-smart agriculture, FAO 2012 (acesse aqui)
Segundo a FAO, os três pilares de uma agricultura climaticamente inteligente são: o aumento sustentável da produtividade e renda agrícolas, o reforço da resiliência às mudanças climáticas deletérias, e, sempre que possível, a remoção ou a redução das emissões dos gases de efeito estufa.
Estima-se em 60% o aumento necessário da produção alimentar para satisfazer a demanda de uma população mundial crescente, que deverá chegar a 9 bilhões em 2050. Lembrando que devemos ao mesmo tempo reduzir drasticamente as enormes disparidades de níveis de vida que ainda prevalecem no mundo e evitar o aquecimento global excessivo que tornaria cada vez mais difíceis as condições de sobrevivência da nossa espécie, provocando conflitos sociais de consequências nocivas.
O estudo transmite uma mensagem otimista: por mais difícil que essa tarefa possa parecer, ela está ao nosso alcance. Em que pesem as enormes disparidades atuais de nível de vida, temos condições de assegurar nos próximos decênios uma vida bem mais decente e pacífica à futura população mundial.
Para tanto, convém colocar no centro das nossas preocupações o debate sobre como pôr rapidamente em marcha estratégias diferenciadas de desenvolvimento, adaptadas à diversidade das condições climáticas, ambientais e socioculturais. E, ao mesmo tempo, construir um sistema internacional que busque uma paz perpétua e uma estratégia global de desenvolvimento plural e cooperativo, na qual os países mais desenvolvidos contribuam efetivamente para a aceleração do crescimento das economias menos desenvolvidas.
O cerne da questão está em integrar segurança alimentar e segurança energética, os dois pilares fundamentais das estratégias de desenvolvimento.
Na ausência da segurança alimentar, corremos obviamente o risco de uma catástrofe social. Por sua vez, o progresso técnico do sistema produtivo, inclusive o alimentar, está relacionado com o acesso às diferentes fontes de energia, necessárias para aumentar a produtividade do trabalho humano.
Daí a importância de sistemas integrados de produção de alimentos e energia adaptados aos diferentes ecossistemas e da nossa capacidade de lograr aumentos da produtividade agrícola mediante o progresso científico e técnico, avançando na expansão do leque de produtos derivados da biomassa.
Por razões de ordem social, devemos privilegiar as soluções localmente diferenciadas ao alcance dos pequenos produtores, de maneira a maximizar o autoemprego e emprego gerados pelas estratégias de desenvolvimento rural. Tais soluções devem ainda ser intensivas em conhecimento e, na medida do possível, poupadoras de recursos financeiros. Sem esquecer que, em vários países, assim como no Brasil, a indispensável reforma agrária está ainda longe de ter sido completada.
COMO CAMINHAMOS NESSA DIREÇÃO?
Chegou o momento de as Nações Unidas aprimorarem o estudo, o debate democrático e a implementação de uma estratégia planetária de desenvolvimento socialmente includente e ambientalmente sustentável, visando, antes de mais nada, a redução das enormes disparidades atuais de nível de vida.
Com o progresso técnico e os aumentos da produtividade do trabalho, bem como da longevidade de nossas vidas, as sociedades futuras hão de destinar uma parcela cada vez menor do seu tempo de trabalho hábil à satisfação das necessidades materiais. O futuro promete, portanto, modelos de consumo e de uso de tempo cada vez mais diversificados e inovadores.
Ainda não estamos lá. O primeiro passo a ser dado é a institucionalização, no âmbito dos países, do planejamento ecossocioeconômico de longo prazo, a ser coordenado e, na medida do possível, cofinanciado pelas nações unidas.
A agricultura climaticamente inteligente há de ser um dos temas fundamentais dos futuros planos dos países-membros das nações unidas.
Os “países-baleia” como o Brasil têm um desafio fundamental à frente: definir as suas estratégias de desenvolvimento de longo prazo voltadas para a valorização do seu enorme potencial de recursos renováveis.
*Ecossocioeconomista da École des Hautes Études en Sciences Sociales
[:en]
Para alcançá-la, a chave está na integração entre segurança alimentar e segurança energética, os dois pilares fundamentais das estratégias de desenvolvimento
Em boa hora, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) lançou um estudo inovador [1] sobre a agricultura climaticamente inteligente, dando assim mais um passo na integração de critérios ambientais, sociais e econômicos aos quais as estratégias de desenvolvimento de longo prazo devem obedecer.
[1] Climate-Smart Agriculture – Sourcebook, FAO 2013. Veja também Anne Bogdanski, Integrated food-energy systems for climate-smart agriculture, FAO 2012 (acesse aqui)
Segundo a FAO, os três pilares de uma agricultura climaticamente inteligente são: o aumento sustentável da produtividade e renda agrícolas, o reforço da resiliência às mudanças climáticas deletérias, e, sempre que possível, a remoção ou a redução das emissões dos gases de efeito estufa.
Estima-se em 60% o aumento necessário da produção alimentar para satisfazer a demanda de uma população mundial crescente, que deverá chegar a 9 bilhões em 2050. Lembrando que devemos ao mesmo tempo reduzir drasticamente as enormes disparidades de níveis de vida que ainda prevalecem no mundo e evitar o aquecimento global excessivo que tornaria cada vez mais difíceis as condições de sobrevivência da nossa espécie, provocando conflitos sociais de consequências nocivas.
O estudo transmite uma mensagem otimista: por mais difícil que essa tarefa possa parecer, ela está ao nosso alcance. Em que pesem as enormes disparidades atuais de nível de vida, temos condições de assegurar nos próximos decênios uma vida bem mais decente e pacífica à futura população mundial.
Para tanto, convém colocar no centro das nossas preocupações o debate sobre como pôr rapidamente em marcha estratégias diferenciadas de desenvolvimento, adaptadas à diversidade das condições climáticas, ambientais e socioculturais. E, ao mesmo tempo, construir um sistema internacional que busque uma paz perpétua e uma estratégia global de desenvolvimento plural e cooperativo, na qual os países mais desenvolvidos contribuam efetivamente para a aceleração do crescimento das economias menos desenvolvidas.
O cerne da questão está em integrar segurança alimentar e segurança energética, os dois pilares fundamentais das estratégias de desenvolvimento.
Na ausência da segurança alimentar, corremos obviamente o risco de uma catástrofe social. Por sua vez, o progresso técnico do sistema produtivo, inclusive o alimentar, está relacionado com o acesso às diferentes fontes de energia, necessárias para aumentar a produtividade do trabalho humano.
Daí a importância de sistemas integrados de produção de alimentos e energia adaptados aos diferentes ecossistemas e da nossa capacidade de lograr aumentos da produtividade agrícola mediante o progresso científico e técnico, avançando na expansão do leque de produtos derivados da biomassa.
Por razões de ordem social, devemos privilegiar as soluções localmente diferenciadas ao alcance dos pequenos produtores, de maneira a maximizar o autoemprego e emprego gerados pelas estratégias de desenvolvimento rural. Tais soluções devem ainda ser intensivas em conhecimento e, na medida do possível, poupadoras de recursos financeiros. Sem esquecer que, em vários países, assim como no Brasil, a indispensável reforma agrária está ainda longe de ter sido completada.
COMO CAMINHAMOS NESSA DIREÇÃO?
Chegou o momento de as Nações Unidas aprimorarem o estudo, o debate democrático e a implementação de uma estratégia planetária de desenvolvimento socialmente includente e ambientalmente sustentável, visando, antes de mais nada, a redução das enormes disparidades atuais de nível de vida.
Com o progresso técnico e os aumentos da produtividade do trabalho, bem como da longevidade de nossas vidas, as sociedades futuras hão de destinar uma parcela cada vez menor do seu tempo de trabalho hábil à satisfação das necessidades materiais. O futuro promete, portanto, modelos de consumo e de uso de tempo cada vez mais diversificados e inovadores.
Ainda não estamos lá. O primeiro passo a ser dado é a institucionalização, no âmbito dos países, do planejamento ecossocioeconômico de longo prazo, a ser coordenado e, na medida do possível, cofinanciado pelas nações unidas.
A agricultura climaticamente inteligente há de ser um dos temas fundamentais dos futuros planos dos países-membros das nações unidas.
Os “países-baleia” como o Brasil têm um desafio fundamental à frente: definir as suas estratégias de desenvolvimento de longo prazo voltadas para a valorização do seu enorme potencial de recursos renováveis.
*Ecossocioeconomista da École des Hautes Études en Sciences Sociales