A Região Metropolitana de São Paulo enfrenta uma crise de abastecimento de água sem precedentes em sua história. A falta de chuvas e os consequentes recordes de queda no nível do Sistema Cantareira levaram o governo estadual a fazer obras emergenciais e a cidade começa a receber água do fundo dos reservatórios, conhecido como “volume morto”. Todo esse investimento poderia ter sido evitado se adotados sistemas conservacionistas e fazendo maior reuso de água.
O processo permite efetuar a gestão da demanda, controlando perdas e desperdícios, e a reaproveitar efluentes domésticos e industriais, convenientemente tratados. A ideia é transformar um problema, a escassez da água, em um recurso. Uma solução para o meio ambiente bastante lucrativa. A indústria paulista tem feito grandes investimentos para reduzir a captação de água e a geração de efluentes, conforme observa o professor Ivanildo Hespanhol, diretor do Centro Internacional de Referência em Reuso de Água – Cirra/IRCWD, da USP.
Apenas a indústria química, por exemplo, diminuiu em 24% o consumo e em 55% a emissão de efluentes entre 2001 e 2007. Na Bacia do Paraíba do Sul, o reuso é praticado por cerca de 50% das grandes indústrias. Dos 32 milhões de metros cúbicos captados, 25%, ou pouco mais de 8 milhões de metros cúbicos, são reutilizados, principalmente pelo setor metalúrgico.
Justamente para incentivar a economia de água, a Agência Nacional de Águas (ANA) instituiu, em 1997, a cobrança pelo uso dos recursos hídricos, incluindo a captação de água e o lançamento de efluentes. Mas só nos últimos anos a lei foi implantada nos estados. Em São Paulo, onde a água de reuso equivale a aproximadamente 20% do consumo para fins não potáveis, há muito a ser feito. Uma das alternativas está ao alcance de todos e pode ser implementada em condomínios residenciais: a coleta da água pluvial por meio de calhas. Depois de um rápido tratamento, essa água poderia ser usada em descarga de banheiros, além de outros pontos de consumo onde a potabilidade não é necessária.
O reuso urbano pode servir ainda para rega de jardins, campos de futebol e golfe, lavagem de ruas, desentupimento de galerias de esgoto, compactação de terrenos, resfriamento de torres de sistemas de ar condicionado, reserva de incêndio ou até mesmo para sistemas decorativos. Na construção civil, a água de reuso pode ser utilizada para preparação e cura de concreto e para atingir a umidade ótima em trabalhos de compactação de solos.
O reuso é útil ainda na agricultura, já que esses esgotos trazem consigo imensas quantidades de nutrientes. Lembrando, claro, que é preciso tratar essa água. Geralmente, a água de reuso passa por um tratamento biológico, físico-químico e desinfecção com cloro ou outro desinfetante tais como dióxido de cloro, ozona ou radiação ultravioleta. Nos reservatórios, é conveniente manter a presença de cloro residual na água.
Fazer corretamente o reaproveitamento das águas das chuvas e o reuso fará com que se reduza a demanda exercida sobre os mananciais. E, mesmo que sejam efetuados grandes investimentos em sistemas de tratamento dessa água, os estudos de avaliação econômica indicam que os períodos de retorno do capital são geralmente inferiores a três anos. É a velha máxima do ‘sabendo usar, não vai faltar’. Todos os dias desperdiçamos litros e mais litros de água que, com o tratamento adequado, poderia ser reutilizada.
O Brasil precisa de um arcabouço legal para promover e estimular o reuso da água no país e também de estímulos fiscais para que mais e mais empresas adotem o reuso com um excelente padrão de qualidade. Todos podem contribuir.
*Martim Afonso Penna é diretor-executivo da Abiclor (Associação Brasileira da Indústria de Álcalis, Cloro e Derivados)