Por Fabio Storino
O psicólogo Daniel Kahneman, prêmio Nobel em Economia por seu estudo seminal sobre nosso processo de tomada de decisão, descreve em Rápido e Devagar: Duas formas de pensar dois sistemas de pensamento do cérebro humano.
O sistema 1 opera de maneira rápida e intuitiva, exigindo pouco esforço. Já o sistema 2 demanda maior concentração e esforço analítico, sendo, consequentemente, mais lento.
Quando dirigimos em uma estrada relativamente vazia, nosso cérebro parece “desligar” da estrada e focar em outras coisas e, quando nos damos conta, chegamos ao nosso destino, às vezes mal lembrando do percurso. Esse é um exemplo de atividade operada pelo sistema 1.
Já dirigindo à noite em um lugar desconhecido, à procura de uma rua e número de casa, muitos precisam abaixar ou desligar o som do carro e interromper a conversa com outros passageiros, tamanha a atenção exigida pela atividade operada pelo sistema 2. A predominância de um sistema sobre o outro também depende do estilo cognitivo de cada pessoa.
Em 2012, estudo publicado na Science explorou a relação entre esses sistemas e a religiosidade (ver estudo). A primeira parte, mais descritiva, comparou o nível de religiosidade com o sistema de pensamento predominante.
Os resultados eram relativamente esperados: pessoas que privilegiavam a intuição possuíam maior religiosidade do que as mais analíticas.
A segunda parte do estudo explorou uma possível relação causal entre os dois fenômenos (grau de religiosidade e modo de pensar). Utilizando-se de priming — um estímulo prévio que afeta a percepção de experiências futuras (ver coluna “O inconsciente no comando”, ed. 64) — constatou que aqueles estimulados por imagens e palavras que ativavam o pensamento analítico demonstraram menor religiosidade do que os que foram estimulados por imagens e palavras mais neutras.
Se, por um lado, o estudo sugere certa fluidez na religiosidade das pessoas, que varia a cada momento e é influenciada pelo ambiente — uma “cura” para o extremismo no horizonte? —, essa e outras pesquisas da área também reforçam a diferença entre estilos cognitivos — indicam até mesmo um componente hereditário.
Ao se buscar influenciar a opinião pública, portanto, seria importante reconhecer essa diferença e personalizar a mensagem para cada grupo (ver coluna “A percepção do outro”, ed. 69).
Por isso a importância da encíclica Louvado Sejas, publicada em junho: ao apresentar os problemas ecológicos sob uma perspectiva moral, com apelo emocional, o papa consegue alcançar (ao menos parte de) um público para os quais uma montanha de evidências empíricas e argumentos puramente racionais são pouco persuasivos.
Ou, como pontuou o conselheiro de Angela Merkel para assuntos climáticos, John Schellnhuber, durante o anúncio do texto papal: “É uma crise ambiental, obviamente, mas é também uma crise social. Apenas se fé e razão trabalharem em conjunto seremos capazes de superá-la”.[:en]O psicólogo Daniel Kahneman, prêmio Nobel em Economia por seu estudo seminal sobre nosso processo de tomada de decisão, descreve em Rápido e Devagar: Duas formas de pensar dois sistemas de pensamento do cérebro humano.
O sistema 1 opera de maneira rápida e intuitiva, exigindo pouco esforço. Já o sistema 2 demanda maior concentração e esforço analítico, sendo, consequentemente, mais lento.
Quando dirigimos em uma estrada relativamente vazia, nosso cérebro parece “desligar” da estrada e focar em outras coisas e, quando nos damos conta, chegamos ao nosso destino, às vezes mal lembrando do percurso. Esse é um exemplo de atividade operada pelo sistema 1.
Já dirigindo à noite em um lugar desconhecido, à procura de uma rua e número de casa, muitos precisam abaixar ou desligar o som do carro e interromper a conversa com outros passageiros, tamanha a atenção exigida pela atividade operada pelo sistema 2. A predominância de um sistema sobre o outro também depende do estilo cognitivo de cada pessoa.
Em 2012, estudo publicado na Science explorou a relação entre esses sistemas e a religiosidade (ver estudo). A primeira parte, mais descritiva, comparou o nível de religiosidade com o sistema de pensamento predominante.
Os resultados eram relativamente esperados: pessoas que privilegiavam a intuição possuíam maior religiosidade do que as mais analíticas.
A segunda parte do estudo explorou uma possível relação causal entre os dois fenômenos (grau de religiosidade e modo de pensar). Utilizando-se de priming — um estímulo prévio que afeta a percepção de experiências futuras (ver coluna “O inconsciente no comando”, ed. 64) — constatou que aqueles estimulados por imagens e palavras que ativavam o pensamento analítico demonstraram menor religiosidade do que os que foram estimulados por imagens e palavras mais neutras.
Se, por um lado, o estudo sugere certa fluidez na religiosidade das pessoas, que varia a cada momento e é influenciada pelo ambiente — uma “cura” para o extremismo no horizonte? —, essa e outras pesquisas da área também reforçam a diferença entre estilos cognitivos — indicam até mesmo um componente hereditário.
Ao se buscar influenciar a opinião pública, portanto, seria importante reconhecer essa diferença e personalizar a mensagem para cada grupo (ver coluna “A percepção do outro”, ed. 69).
Por isso a importância da encíclica Louvado Sejas, publicada em junho: ao apresentar os problemas ecológicos sob uma perspectiva moral, com apelo emocional, o papa consegue alcançar (ao menos parte de) um público para os quais uma montanha de evidências empíricas e argumentos puramente racionais são pouco persuasivos.
Ou, como pontuou o conselheiro de Angela Merkel para assuntos climáticos, John Schellnhuber, durante o anúncio do texto papal: “É uma crise ambiental, obviamente, mas é também uma crise social. Apenas se fé e razão trabalharem em conjunto seremos capazes de superá-la”.