A principal tarefa dos negociadores presentes na Conferência do Clima de Paris (COP 21) nesta primeira semana de encontros é a finalização de uma proposta de texto para o novo acordo climático. Para os co-presidentes do grupo de trabalho que se debruça nessa construção há quatro anos, o mundo irá conhecer a versão finalizada da proposta de acordo até o próximo sábado, de forma a permitir que os diplomatas e os ministros presentes na capital francesa possam aproveitar a segunda semana da COP para alinhar os interesses e assinar o acordo.
A missão de finalizar a proposta de texto não é fácil. As discussões que acontecem nesta semana em Paris têm como ponto de partida um rascunho com mais de 50 páginas, entre artigos e anexos. O desafio dos negociadores será reduzir substancialmente o tamanho deste texto, o que necessitará uma costura diplomática cuidadosa, principalmente pelas divergências políticas que persistem entre os diferentes grupos de países na mesa de negociação.
O sucesso desse esforço de edição é crucial para que um acordo possa emergir na semana que vem, quando acontece o segmento ministerial. Para Ahmed Djoghlaf, um dos co-presidentes do grupo de trabalho, os negociadores estão comprometidos a concluir a discussão técnica em torno do novo acordo climático até o final desta semana. “Uma das receitas para o desastre é termos ministros ou chefes de Estado negociando [ o texto], com os especialistas negociando num nível abaixo”, disse Djoghlaf ao portal Climate Home.
Obama sinaliza apoio a um acordo “híbrido” em Paris
No 2º dia de conversas no complexo montado no aeroporto parisiense de Le Bourget, negociadores e observadores ainda polemizavam sobre os discursos e anúncios feitos por chefes de Estado e de governo durante a abertura da COP 21.
Um dos pontos que mais incomodaram representantes da sociedade civil em Paris foi o fato de, em seu discurso, o presidente norte-americano Barack Obama não ter comentado sobre a questão dos compromissos legalmente vinculantes que muitos países defendem que estejam incorporados no acordo de Paris.
Essa questão é um obstáculo considerável nas negociações. Pelo lado de Obama, por mais que ele se esforce, o Congresso norte-americano, controlado pela oposição republicana, rejeitará qualquer tipo de acordo com obrigações legais por parte do governo dos EUA. A opção por um acordo flexível, com metas não obrigatórias, seria uma forma de facilitar o entendimento político no Capitólio. Já pelo lados dos países em desenvolvimento e da União Europeia, qualquer acordo que não possua provisões obrigatórias aos seus signatários será inócuo no combate ao aquecimento global.
No entanto, nesta terça (01/12), Obama manifestou apoio à ideia de um acordo “híbrido”, no qual os países não seriam obrigados a cumprir suas metas de redução de emissões, mas teriam, ao menos, a obrigação de revisá-las dentro de um período determinado de anos. Assim, o presidente norte-americano sinaliza aos negociadores a disposição de Washington em avançar na discussão sobre compromissos legalmente vinculantes no acordo de Paris – porém, por ora, limitados apenas aos mecanismos de revisão de metas.
A posição de Obama ainda desagrada a muitos na COP 21, mas alguns negociadores e lideranças políticas envolvidas na Conferência procuraram destacar o avanço da declaração do presidente norte-americano. “O fato de os Estados Unidos poderem se comprometer com um acordo vinculante, considerando que antes havia uma dúvida por causa do Congresso, é realmente uma notícia extraordinária que vem em boa hora”, comentou a ministra francesa do Meio Ambiente, Ségolène Royal.
Para a ministra brasileira do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, o comentário de Obama é uma sinalização clara da vontade dos EUA em se chegar a um acordo em paris. “[O comentário] indica um caminho que é distinto do que estava aqui quando chegamos, de que os Estados Unidos eram contrários a qualquer instrumento que fosse legalmente vinculante”, disse à ministra ao jornal Folha de S. Paulo.
Se Obama mostra alguma disposição para dialogar sobre compromissos com força de lei no novo acordo do clima, a costura diplomática ainda precisará envolver outro ator crucial para o sucesso da COP 21: a China, que se mantém reticente tanto a obrigações legais internacionais de redução de emissões quanto ao período de revisão dessas metas a cada cinco anos a partir de 2020.
Seguro para os pequenos países insulares vulneráveis
Outro momento importante protagonizado por Barack Obama neste 2º dia da COP 21 foi o anúncio de que os EUA irão contribuir com US$ 30 milhões para ajudar comunidades vulneráveis contra os riscos associados às mudanças do clima, especialmente em pequenos países insulares. O compromisso anunciado faz parte de um esforço conjunto do G7 (o grupo das sete maiores economias do mundo) para apoiar nações vulneráveis no seguro contra riscos climáticos.
Para os líderes destes Estados – muitos fisicamente sob ameaça de desaparecer do globo por causa do aumento do nível do mar, decorrente do aquecimento global – o compromisso de Obama foi uma sinalização importante de que a principal potência global não está alheia aos impactos das mudanças do clima nesses pequenos países.
“O encontro foi uma oportunidade para conversar, num nível bastante pessoal, sobre o quão estamos vulneráveis aos impactos das mudanças climáticas, e que todos nós precisamos trabalhar juntos para fazer frente a este que é agora o risco mais grave à humanidade”, disse Christopher Loeak, presidente das Ilhas Marshall, localizadas no Oceano Pacífico.
Os pequenos países insulares são tradicionalmente defensores ferrenhos e vocais de um acordo climático ainda mais ambicioso do que o defendido pelo Painel Intergovernamental da ONU sobre Mudança do Clima (IPCC, sigla em inglês): para eles, o objetivo de longo prazo do novo acordo precisa ser conter o aquecimento global neste século a apenas 1,5 grau Celsius acima dos níveis pré-Revolução Industrial, meio grau abaixo da já difícil meta dos 2 graus.
Além de defender mais ambição, esses países reforçam a necessidade de um arcabouço jurídico e financeiro que os compense pelas perdas e danos decorrentes dos efeitos das mudanças do clima em suas comunidades.
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