Um passo crucial para a implementação do Acordo de Paris foi anunciado neste sábado (03/09): os Estados Unidos e a China entregaram conjuntamente às Nações Unidas seus respectivos instrumentos de ratificação. O anúncio sino-americano dá impulso decisivo para que o Acordo de Paris comece a vigorar já em 2016, o que seria uma sinalização importante dos governos do mundo em torno dos objetivos e dos compromissos assumidos por eles no documento.
“Estamos aqui juntos porque acreditamos que, de todos os desafios que enfrentamos hoje, a crescente ameaça da mudança do clima poderá definir os contornos deste século mais dramaticamente do que qualquer outro”, ressaltou o presidente dos Estados Unidos Barack Obama em comunicado oficial. “Esta é a melhor oportunidade que temos para lidar com um problema que poderá afetar este planeta de uma forma que dificultará para nós lidar com todos os demais problemas que enfrentamos”.
“Nossa resposta à mudança do clima carrega consigo o futuro de nosso povo e o bem-estar da humanidade”, ressaltou o presidente chinês Xi Jinping, durante encontro com Obama e o secretário-geral da ONU Ban Ki-moon em Hangzhou (China), um dia antes do início da cúpula do G20, que acontecerá na cidade até segunda (05/09).
Com o anúncio de chineses e norte-americanos, o Secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, sigla em inglês) já contabiliza 26 ratificações dentre os 180 países que assinaram o Acordo de Paris. Somando as emissões de gases de efeito estufa (GEE) dos dois gigantes – a China é responsável por 20% das emissões globais, enquanto os Estados Unidos são responsáveis por 17% – as ratificações já oficializadas contabilizam 39,1% das emissões globais.
De acordo com decisão tomada durante a Conferência do Clima de Paris (COP 21) em dezembro passado, para que o Acordo comece a vigorar, é necessário que a UNFCCC receba a ratificação de pelo menos 55 nações representando 55% das emissões globais. Cumpridos os critérios, o Acordo entra em vigor 30 dias depois. Existe a expectativa de que outros importantes emissores, como Índia, Brasil e países europeus, também entreguem seus instrumentos de ratificação do Acordo de Paris nas próximas semanas, o que facilitaria o atendimento dos critérios e permitiria que o Acordo entre em vigor ainda em 2016.
Inicialmente, o governo brasileiro tinha programado realizar a assinatura do instrumento de ratificação no dia 29 de agosto passado, mas o Palácio do Planalto adiou a cerimônia para o próximo dia 12. A ideia do presidente Michel Temer, recém-empossado no comando do governo federal, é entregar o instrumento de ratificação à UNFCCC durante o encontro sobre o Acordo de Paris (saiba mais) que será realizado em Nova York no dia 21 de setembro, um dia antes da reunião da Assembleia Geral das Nações Unidas.
“O quanto antes o Acordo de Paris for ratificado e implementado plenamente, mais seguro será o nosso futuro”, ressaltou Patricia Espinosa, secretária-executiva da UNFCCC, sobre o anúncio em Hangzhou. “Colocar este acordo em vigor reforça que o momentum e a solidariedade internacional observados em 2015 continua em 2016 entre nações maiores e menores e entre países ricos e pobres”.
A oficialização dos Estados Unidos e da China tem um peso simbólico muito forte no esforço internacional contra mudança do clima. Desentendimentos entre os dois países foram fundamentais para o fracasso das negociações durante a Conferência do Clima de Copenhague (COP 15) em 2009, o que atrasou a construção de um novo tratado internacional para redução de emissões de GEE em seis anos. Depois de Copenhague, todo o processo de negociação foi desenhado e implementado de forma a facilitar o envolvimento de Washington e de Pequim na construção do acordo.
Um exemplo desse esforço foi a mudança no status jurídico do Acordo de Paris: ao invés de compromissos obrigatórios definidos “de cima para baixo”, como no Protocolo de Quioto, o Acordo de Paris consagrou um formato mais flexível, com compromissos voluntários definidos nacionalmente. Essa mudança foi fundamental para facilitar a participação dos Estados Unidos no novo regime – como os compromissos são voluntários, o governo Obama não precisa da autorização do Senado (controlado atualmente pelo Partido Republicano e historicamente crítico de acordos internacionais em clima) para a ratificação do texto pelo país.
A participação dos dois países no novo acordo foi celebrada por diferentes atores neste sábado. “Este [anúncio] sinaliza uma nova era nos esforços globais para enfrentar a mudança do clima”, comemorou Jennifer Morgan, diretora-executiva do Greenpeace International. “Os dois países precisam agora dar escala e acelerar seus esforços rumo a um futuro que evite os piores impactos da mudança do clima”.
O ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore também comemorou o anúncio conjunto de chineses e norte-americanos. “Ao atuar conjuntamente na ratificação rápida do Acordo de Paris, os Estados Unidos e a China estão definindo o ritmo para o resto do mundo se juntar o mais rápido possível e abraçar a transição para um futuro de energia limpa”, disse Al Gore em comunicado público.
“O anúncio de hoje é o sinal mais forte até agora de que o que definimos em Paris logo se tornará lei. Com os dois maiores emissores prontos para liderar, a transição para uma economia global de baixa emissão e resiliente ao clima agora é irreversível”, destacou Mattlan Zackhras, oficial do governo das Ilhas Marshall, uma das nações insulares do Oceano Pacífico mais ameaçadas pelo aumento do nível do mar.