Com a proximidade do fim da energia fóssil, como preconiza Ignacy Sachs, a sustentabilidade energética do mundo deverá ser alcançada pelos resultados da “revolução da biomassa”! Por que isso acontecerá e qual a implicância para o Brasil?
Porque biomassa é energia, e o Brasil é o principal candidato como provedor de biomassa, por sua alta capacidade em produzir cana, soja, dendê e etanol celulósico a partir de resíduos vegetais. Mas, a biomassa não é somente energia. É, também, a fonte de alimento (grãos), madeira, adubo orgânico, fármacos e outros produtos utilizados pela população brasileira.
Acrescente-se a isso que a biomassa é a principal fornecedora de celulose e proteína para os bovinos (bois) que são capazes, habilmente, de transformá-la em carne ou leite. E, como o Brasil possui o maior rebanho comercial do planeta, 220 milhões de animais, ocupando aproximadamente 200 milhões de hectares, estas áreas são utilizadas para produzir carne e leite para os brasileiros e uma parcela para exportação. Considerando o Brasil, a relação é próxima de um boi por hectare por habitante.
Entretanto, mais da metade das áreas utilizadas para pastagens (biomassa) estão degradadas ou em processo de degradação, quando o solo vai perdendo sua fertilidade, e a biodiversidade vegetal vai se reduzindo, apenas, ao capim. E, como a prática do fogo consome a matéria orgânica (biomassa) e a transforma em gás carbônico liberado para atmosfera, o cenário contribui para as mudanças climáticas globais.
Esse quadro se repete em diversas partes do mundo. O planeta requer urgentemente ações globais que deverão surgir a partir do diálogo e do consenso entre cientistas, setores privados, setores público e investidores, ONGs, movimentos sociais e organizações governamentais, forma esta utilizada pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) para estruturar a Agenda Global para Produção Animal Sustentável. A FAO, em 2010, implantou essa Agenda visando congregar e catalisar os diversos atores e as ações relacionadas ao setor pecuário, comprometidas com o desenvolvimento econômico, social e ambiental da produção animal no mundo.
Em 2011 foi realizado o 1º Encontro Mundial da Agenda Global em Brasília, que resultou no documento “Brasília Consensus”, o qual se tornou o marco deste processo, seguido de outros seis encontros, sendo o último na Etiópia na semana passada. Nesta reunião, 300 participantes (pesquisadores, representantes de ONGs, ministros e políticos, stakeholders, produtores rurais, dentre outros) tiveram a oportunidade de constatar os benefícios oriundos da produção animal sustentável e suas positivas interfaces entre o atendimento das necessidades da humanidade em consonância com o uso racional dos recursos naturais e dos serviços ambientais por ela gerados.
No entanto, se o Brasil e os demais países continuarem explorando de forma excessiva a natureza, será gerado um alto custo para o bem-estar das futuras gerações, contrariando os princípios do desenvolvimento sustentável (Brundtland Report, 1987).
Portanto é necessário que os atores e setores brasileiros voltem a se envolver com os objetivos da Agenda Global. A participação do Brasil, como um dos maiores produtores agropecuários do mundo, não pode ser resumida apenas à participação de um professor/pesquisador e um produtor rural, como ocorreu na última reunião da Agenda.
Em 2050 teremos um planeta com 9.6 bilhões de habitantes necessitando de alimento num mundo sofrido, enfrentando os desafios das mudanças climáticas, a escassez de recursos naturais, a pobreza e a insegurança na saúde animal e humana.
O Brasil é capaz de cooperar na reversão deste processo, não somente por sua extensão territorial propicia à produção de alimentos, mas pela sua gente capacitada, pelas relevantes instituições de ensino e pesquisa e, quiçá, por uma política construtiva e consciente, que agregue e creia que o mundo ainda pode ser salvo por nós mesmos.
* Rogério Martins Maurício é Ph.D. e professor da Universidade Federal de São João Del Rei (UFSJ), bolsista de produtividade em pesquisa pelo CNPq e membro da Global Agenda for Sustainable Livestock Production da FAO/ONU. Mais informações