Para além da retórica e da especulação, o que Bolsonaro entregará para os brasileiros e para a Amazônia depende da resposta a estas questões
Por Ana Toni e Alice Amorim*
O novo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, chega com otimismo a Davos para o Fórum Econômico Mundial. Sua mensagem é simples: sou o homem que impulsiona o crescimento econômico, acaba com a corrupção e atrai novos investidores.
Nesta terça-feira, 22, ele terá a chance de se dirigir aos principais CEOs do mundo, provavelmente reafirmando suas promessas. No entanto, como vimos no caso de do presidente americano Donald Trump, prometer um caminho tranquilo para tempos ensolarados é uma coisa, entregar os resultados é outra completamente diferente.
E, apesar de Bolsonaro ter – por enquanto – recuado da ameaça de abandonar o Acordo de Paris sobre o clima, a vasta e preciosa Floresta Amazônica enfrenta novas e potencialmente catastróficas ameaças colocadas por sua agenda de desregulamentação.
Como todo e qualquer líder político, Bolsonaro deve ser julgado por suas ações, não por sua retórica. Aqui estão seis perguntas que devem ser respondidas antes de sabermos qual será o curso de sua presidência.
Riscos climáticos
1 – O relatório de riscos 2019 do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês) identifica o clima extremo, as falhas na mitigação e adaptação às mudanças climáticas e os desastres naturais como os principais riscos a serem enfrentados pelo mundo em 2019. Como os riscos ambientais estão se manifestando com frequência e gravidade crescentes, é provável que o impacto nas cadeias de valor globais se intensifique, enfraquecendo a resiliência geral (leia mais aqui).
Dado que isso será uma preocupação para empresas e investidores, qual é o plano para o Brasil se tornar mais resiliente diante do clima extremo? O relatório do WEF adverte que falhas na abordagem destes problemas colocam riscos materiais para os negócios.
Regulação ambiental
2 – O Brasil tem sido palco de alguns dos maiores acidentes ambientais do mundo. Lembremos, por exemplo, do rompimento da barragem da Samarco, que matou 19 pessoas em 2015 e destruiu a bacia hidrográfica do Rio Doce.
No final de 2018, a empresa de mineração anglo-australiana BHP Billiton foi levada ao tribunal no Reino Unido por vítimas brasileiras que reivindicavam 5 bilhões de libras em indenizações. Aprendemos com este evento que as regulamentações ambientais brasileiras são fracas e mal aplicadas, o que resultou em uma multa potencialmente ruinosa para uma grande corporação internacional.
Desregulamentar ainda mais tornará o Brasil em um lugar melhor para os investidores que podem vir a enfrentar outros eventos destruidores de reputação?
Amazônia
3 – O desmatamento vem novamente aumentando no Brasil após um longo período de redução. De acordo com os últimos dados oficiais, quase 8 mil quilômetros quadrados foram desflorestados entre 2017 e 2018. O desmatamento ilegal é geralmente associado a outras atividades criminosas, como grilagem de terras, lavagem de dinheiro, mineração ilegal, tráfico de drogas, entre outros.
Bolsonaro declarou ser prioridade-chave de seu mandato a luta contra a corrupção e o crime organizado. Na Amazônia brasileira existem muitas denúncias sobre grupos organizados que operam invadindo terras públicas, desmatando grandes áreas e as vendendo ilegalmente para a pecuária e a agricultura. Bolsonaro combaterá estes crimes? Como?
Reformas econômicas
4 – A estabilidade econômica foi a promessa-chave de Bolsonaro. Existem hoje mais de 27 milhões de pessoas desempregadas ou subempregadas no Brasil. Um fator essencial para a estabilidade é a reforma do sistema previdenciário mas parece evidente, depois de apenas algumas semanas no poder, que o novo presidente carece de apoio no Congresso e no meio militar para promover uma mudança profunda.
Bolsonaro não possui a maioria dos 513 deputados da Câmara dos Deputados. Cerca de 112 deputados prometeram lealdade a ele, enquanto a oposição poderia ter cerca de 150 nomes leais. Reformar a Previdência exige a aprovação de pelo menos 308 deputados.
O mesmo se aplica à reforma tributária, a segunda reforma mais importante para o equilíbrio fiscal e um tema frequente nos discursos de Paulo Guedes. Desde a posse, membros do novo governo expressaram opiniões diferentes, que foram deixadas para um momento posterior. Dados esses fatores, como ele cumprirá sua principal promessa?
Política externa alinhada aos EUA
5 – A União Europeia já alertou sobre problemas para o futuro das relações comerciais se o regime climático brasileiro for enfraquecido. Isso deixa Bolsonaro com uma escolha: ele aceitará a posição de Bruxelas, ou se voltará para os Estados Unidos?
Os laços bilaterais com os EUA são a peça central da nova política externa do Brasil, mas Bolsonaro precisa fornecer evidências tangíveis de como Washington se beneficiará da aproximação com o Brasil.
Abrir os EUA para produtos brasileiros como aço e soja prejudicaria o eleitorado de Trump logo antes do que promete ser uma campanha épica de reeleição em 2020.
Mesmo que Trump goste da ideia de ajudar Bolsonaro, é improvável que ele supere a resistência em uma casa de representantes agora dominada pelos Democratas – que recentemente expressaram críticas ao novo presidente do Brasil.
Então, o que o Bolsonaro pode oferecer a Washington que Trump já não tenha? E Bolsonaro estará disposto a prejudicar os laços comerciais com a União Europeia?
Combate à desigualdade
6 – Como o Fórum Econômico Mundial frequentemente sinaliza – combater a desigualdade social é fundamental para uma economia mais estável em todo o mundo.
O Brasil ocupa o 9º lugar no ranking global de desigualdade de renda em 2017. O número de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza no Brasil chegou a 15 milhões em 2017, ou 7,2% da população – 11% acima dos 13,3 milhões de 2016.
Contudo, Bolsonaro omitiu qualquer menção à desigualdade social em seu discurso de posse ou durante a campanha eleitoral. Quais são os planos do Brasil para tirar milhões da pobreza?
[Este artigo foi originalmente publicado no site Climate Home. Acesse aqui]
*Ana Toni é diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade (iCS). Alice Amorim é coordenadora de políticas climáticas do iCS.