Embora o País esteja fora de acordo internacional do setor para compensar emissões, alegando custos, pesquisa realizada pela Aliança Redd+ Brasil demonstra que usuários de voos internacionais são simpáticos à questão
A aviação é um setor importante na equação da mudança climática. Segundo pesquisadores do estudo Esquema de Redução de Emissões da Aviação Civil Internacional (Corsia/Icao): Desafios e Oportunidades para o Brasil, lançado em 2018, se a aviação internacional fosse um país, estaria entre os dez maiores poluidores do mundo. E em algumas décadas, estaria nas primeiras posições dos grandes emissores de gases de efeito estufa.
Vendo o tamanho do problema, a Organização da Aviação Civil Internacional (Icao, na sigla em inglês) lançou, em 2016, o primeiro acordo setorial global buscando reduzir as emissões do setor, por meio do Esquema de Compensação e Redução de Emissões da Aviação Civil Internacional (Corsia, na sigla em inglês).
A meta é simples: promover o crescimento “carbono neutro” do setor a partir de 2020, quando qualquer emissão adicional da aviação civil internacional deverá ser reduzida ou compensada. O acordo terá um período voluntário, entre 2021-2026, se tornando obrigatório a partir de 2027. Um ponto importante é que a redução ou compensação de emissões dos voos internacionais só se aplica caso ambos os países de origem e destino tenham aderido ao acordo.
Tal medida seria um belo reforço ao Acordo de Paris. O Brasil não participará da fase voluntária, alegando como motivo os custos associados a essa adesão (mais no box abaixo).
Pesquisa recente realizada pela rede de organizações Aliança Redd+ Brasil revela, entretanto, que 68% dos brasileiros pagariam entre R$ 5 e R$ 8 a mais por bilhete aéreo se soubessem que o valor seria revertido para redução ou compensação das emissões de seu voo.
A pesquisa, encomendada pela Aliança Redd+ Brasil ao Ideia Big Data, foi conduzida junto a 800 passageiros de voos internacionais entre 1 e 10 de abril deste ano. Todos os entrevistados viajaram de avião para outros países nos últimos 12 meses ou pretendem viajar nos próximos 12, e são responsáveis pelo pagamento de suas passagens aéreas. O objetivo foi entender hábitos de consumo, percepção e opiniões dos brasileiros sobre o tema.
O estudo aponta ainda que 89% das pessoas entrevistadas não conseguem citar nenhuma companhia que tenha preocupação com a redução de carbono ou compensação. Mas a grande maioria (75%) concorda que voar por uma companhia aérea que se preocupa com a redução de carbono é importante.
“Em geral, jovens demonstram maior preocupação com as emissões de carbono emitidas durante voos internacionais de longa duração e seus impactos no meio ambiente”, destaca Pedro Soares, do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), integrante da Aliança Redd+ Brasil e coordenador da pesquisa.
Outro dado interessante da pesquisa é que sete em cada dez entrevistados acreditam que companhias aéreas que se comprometem a reduzir ou compensar as emissões terão preferência entre os clientes. E as mulheres tendem a concordar mais com essa afirmação (75%) em relação aos homens (65%).
Em relação a medidas que poderiam ser adotadas para reduzir os prejuízos ao meio ambiente, 57% dos entrevistados avalia que a melhor estratégia seria o uso de biocombustíveis ou melhorias tecnológicas nas aeronaves. A conservação ambiental e da biodiversidade, com apoio a programas de reflorestamento e conservação florestal, foi a escolha de 39%. E o apoio a projetos de eficiência energética foi a opção escolhida por 31%.
“Os consumidores estão cada vez mais conscientes de sua responsabilidade nas emissões de carbono e precisam compartilhar os custos do combate às mudanças climáticas. As companhias aéreas que se anteciparem na adoção dessas ações terão mais chances de fidelizar esses clientes”, destaca Paula Bernasconi, Coordenadora de Incentivos Econômicos para Conservação do Instituto Cento de Vida (ICV), também integrante da Associação Redd+ Brasil.
A Aliança Redd+ Brasil é composta pela Bolsa de Valores Ambientais do Rio de Janeiro (BVRio), Biofílica Investimentos Ambientais, Fundação Amazonas Sustentável (FAS), ICV, Idesam e Instituto Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Segundo a Aliança, o Brasil tem potencial para captar até US$ 45 bilhões por meio do Redd+ na Amazônia até 2030, e o País tem a possibilidade de liderar o mercado de compensação de emissões de carbono por nações, unidades subnacionais, setores produtivos e grandes eventos.
Box: O Brasil perde oportunidades
A não participação do Brasil na fase voluntária do Corsia segue tendência do governo atual de não estar em sintonia com o movimento mundial de combate à mudança climática e de conservação da biodiversidade.
No entanto, os dados da pesquisa realizada pela Aliança Redd+ Brasil, associados ao estudo citado no início deste texto, demonstram que, mais uma vez, o País perde oportunidades de enfrentamento à mudança do clima. Inclusive econômicas.
“A vinculação do Corsia a mecanismos de mercado, como a aquisição de créditos florestais certificados oriundos da redução do desmatamento, é a estratégia mais eficiente, barata e imediata para reduzir emissões no País, promovendo incentivos reais à conservação da Floresta Amazônica e combatendo o desmatamento”, afirma o coordenador de projetos da Biofílica, Caio Gallego.
A predisposição dos brasileiros que utilizam voos internacionais em incluir no valor de suas passagens um pequeno percentual para compensar ou reduzir emissões de gases de efeito estufa do setor demonstra que esse caminho pode ser trilhado, repartindo responsabilidades entre todos os envolvidos.
“Devido à urgência da mudança climática, não há mais tempo a perder. Temos na mão uma das mais eficientes e imediatas estratégias para se reduzir emissões no País: o combate ao desmatamento das nossas florestas. A conservação das florestas – aliada ao desenvolvimento de economias locais, por exemplo, na Amazônia – seria sem dúvida a ação mais estratégica a ser apoiada pelo setor da aviação civil internacional”, aponta Mariano Cenamo, do Idesam.