Após as queimadas da Amazônia, que mostraram uma ação tardia do governo, o Executivo e o Ministério do Meio Ambiente novamente mostram falta de gestão. Não é à toa que situações como essas se repetem desde que o novo governo assumiu em janeiro. A União vem promovendo um desmanche na política ambiental do País
Por Carlos Bocuhy*
[Foto: Gilberto Crispim/ Fotos Públicas]
O derramamento de petróleo na costa brasileira, que atinge os estados do Nordeste e está fora de controle, é mais uma consequência da grave situação por que passa a atual política ambiental em nosso País. Após as queimadas da Amazônia, que mostraram uma ação tardia do governo, ao se negar a admitir o aumento do desmatamento constatado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o Executivo e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) novamente mostram a falta de gestão na política do setor.
Não é à toa que situações como essas se repetem desde que o novo governo assumiu em janeiro. A União vem promovendo um desmanche na política ambiental do País, construída nas últimas décadas por ambientalistas, cientistas e entidades preocupadas em preservar um dos maiores patrimônios brasileiros.
O Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), constituído por órgãos federais, estaduais, municipais e entidades independentes, perdeu sua função, diante da falta de gestão e ineficiência MMA, quase extinto no início do governo Bolsonaro. Não bastasse isso, os dois comitês, que seriam responsáveis por um plano nacional de contingência em função do grave desastre ambiental na costa brasileira, foram extintos em decreto do governo de fevereiro deste ano.
A política irresponsável da União em relação ao meio ambiente, seja ao reduzir a participação da sociedade civil no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), ao extinguir os conselhos do setor ou ao negar o crescimento do desmatamento da floresta amazônica, se repete na falta de ações mais efetivas em relação ao prejuízo causado pelo petróleo nas praias do Nordeste. Já foram recolhidas das praias mais de mil toneladas de óleo derramado.
Além de o MMA apresentar atualmente enorme falta de iniciativa e repetidamente ter menosprezado a importância do setor ao nosso País e ao mundo, os mecanismos que teriam condições de ações articuladas para coibir crises como a atual foram desmantelados e/ou tiveram seu papel reduzido.
Não é segredo para ninguém que temos centenas de petroleiros circulando pelo oceano diariamente. O que chama a atenção é que todo o aparato do Inpe, cujos oceanógrafos estão à disposição e poderiam realizar o mapeamento dessas manchas de óleo, mostrando em tempo real qual a perspectiva de atingimento das praias, não foi acionado.
O conhecimento científico acumulado por órgãos como o Inpe, reconhecido internacionalmente, não está sendo utilizado. Há uma inversão de valores muito preocupante. A população, que vive e depende da pesca e do turismo nas regiões atingidas pelo petróleo vazado no oceano, arregaça as mangas e tenta, apesar da proibição das autoridades federais e sob risco de ter sua saúde afetada, minimizar o dano ambiental nas praias. A tentativa das Forças Armadas de assumir sozinha a limpeza das praias não vem surtindo efeito e a população insiste em fazer mutirões de limpeza.
Mais uma vez, o governo e o MMA se mostram incapazes de pôr fim a esse novo prejuízo ambiental ao País. A utilização do Exército para colaborar com o recolhimento do óleo é bem-vinda, mas mostra, de forma inequívoca, que faltam medidas de prevenção e combate a acidentes como esses. O respeito que o Brasil conquistou no mundo com sua política de preservação está a cada dia mais ameaçado.
É preciso reativar as políticas ambientais e revalorizar as entidades ambientais, tanto na União como nos Estados e municípios, e reforçar a participação da sociedade civil na política do setor. Só assim evitaremos prejuízos tão grandes ao nosso meio ambiente e para as populações que dependem da natureza para a sua sobrevivência.
*Presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam)