Por que a lógica que estabelece metas e monitora os setores econômico e fiscal não é aplicada à educação, ao meio ambiente, à saúde? Uma medida importante, a ser proposta por uma coalizão entre associações setoriais, fundações, empresas e organizações, é a aprovação de uma lei de responsabilidade social, a fim de que governos trabalhem por resultados concretos também nas áreas sociais e ambientais
No futuro pós-pandemia será necessário repensarmos as regras políticas e a gestão pública no Brasil. Os governos precisam trabalhar por resultados concretos nas áreas sociais e ambientais. Uma medida importante, a ser proposta por uma coalizão entre associações setoriais, fundações, empresas e organizações, é a aprovação de uma lei de responsabilidade social. No entanto, tentativas de aprovação de projetos nesse sentido no Congresso Nacional nunca foram à frente.
Os setores econômico e fiscal do Brasil deram um enorme salto, não somente pela aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal mas, também, por diversas medidas tomadas após o ano de 1994, como a coleta sistemática de dados, a série histórica de indicadores, as metas finalísticas (metas de inflação, superávit primário e outras), a punição pelo descumprimento e o monitoramento constante com total transparência. Monitoramento este que, no caso da área econômica, é feito e cobrado pelos stakeholders da sociedade civil, como mercado financeiro, organizações da sociedade civil e associações setoriais. Não à toa, espera-se que o titular da pasta da Economia seja alguém com qualificações técnicas mínimas para assumir as funções.
E por que essa lógica não é aplicada para outros ministérios, como educação, o meio ambiente, a saúde? Esse período crítico de pandemia só confirma que essas áreas, bem como inúmeras outras como infraestrutura, segurança, transformação digital, são essenciais e estratégicas para o País. Se planejamento e boa gestão são fundamentais para a organização das famílias, empresas ou quaisquer outros setores, deveriam ser também na administração dos recursos de todos os brasileiros, ainda mais quando sabemos o quanto as ações do poder público impactam, para o bem e para o mal, na vida de todos os cidadãos e cidadãs.
Ter um planejamento, estabelecer metas e mensurar é crucial, caso contrário, o País está à deriva. E na maior parte dos “departamentos” dos governos não há planos de longo prazo com metas finalísticas, nem a obrigação de que elas sejam alcançadas. Por isso, não temos aqui sistemas de informação integrados de forma nacional com a mesma metodologia. Temos dados desagregados do nível federal ao municipal. Essa situação inviabiliza a gestão do País, pois nem sequer conseguimos analisar onde estamos e para onde queremos ir.
A necessidade de se ter, com transparência, dados, planos e metas parece batida e banal, mas esse é um requisito primordial para que possamos realmente propor discussões políticas sérias e independentes de preferências pessoais relacionadas a políticos, partidos ou linhas ideológicas.
A falta de argumentos coesos e embasados em evidências que contribuam com um diálogo qualificado – situação que é bem diferente no setor econômico – afeta, diretamente, a escolha de nossos governantes.
Uma métrica de monitoramento e um sistema de punição ajudariam a nortear os caminhos. Assim, seria possível tomar medidas que solucionem a falta de resultados. Estaríamos, acredito, menos propensos a cair no conto do “salvador da pátria” ou nos “achismos” políticos.
No entanto, os anos passam, os mandatos vêm e vão, as linhas ideológicas mudam, mas nós continuamos com os mesmos problemas: desigualdade social e econômica, educação de má qualidade e serviços deficientes. Sabemos que políticas podem variar de liberais a de um papel mais presente do Estado, e as escolhas eleitorais, democráticas, são para isso. Em todo caso, os indicadores devem ser usados sempre para apontar se estamos indo na direção certa.
Planejamentos devem ser feitos com técnica e visão de longo prazo, e os resultados devem servir para definir quem fica ou não à frente da gestão pública. Isso deveria ser, inclusive, uma obrigação dos partidos políticos e um compromisso obrigatório dos candidatos na realização de suas propostas de campanhas políticas.
Esse tema é um dos entraves estruturais para o desenvolvimento social do País. Um engajamento coletivo com um plano e um foco na aprovação de uma lei de responsabilidade social é uma das ações para mudar as regras do jogo, pois, sem alterar as regras, podemos continuar com os mesmos resultados. A sociedade civil precisa se engajar em temas que são comuns a todas as causas e delimitam quais são as condições sob as quais queremos que este país seja governado. Isso é fundamental se quisermos resultados concretos que nos direcionem a um desenvolvimento social, ambiental e econômico.
*Daniela Castro é advogada e economista, diretora executiva da Impacta Advocacy e autora do livro Advocacy, como a sociedade pode influenciar os rumos do Brasil
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