Pela primeira vez na história das COPs, o texto resultante mencionou a importância de uma transição energética que reduza a dependência do mundo dos combustíveis fósseis e promova as energias renováveis. Também houve avanços em temas como Perdas e Danos, financiamento climático e adaptação, embora bem aquém do necessário
Por Fernanda Macedo
Apesar das controvérsias acerca da escolha dos Emirados Árabes Unidos como país sede da 28ª Conferência do Clima da ONU (COP 28), o encontro de quase 200 países apresentou resultados significativos para o combate a principal ameaça ao clima: a produção e o consumo dos combustíveis fósseis.
Pela primeira vez na história das COPs do Clima, o texto resultante menciona a importância de uma transição energética que reduza a dependência do mundo dos combustíveis fósseis e promova as energias renováveis. Mais especificamente, o documento apela aos países para que tomem medidas em escala global para triplicar a capacidade de energia renovável e duplicar a eficiência energética até 2030.
Além disso, inclui também a aceleração dos esforços para a redução progressiva da energia a carvão não-mitigado (unabated), a eliminação progressiva dos subsídios ineficientes para energia fóssil e outras medidas considerando que os países desenvolvidos devem assumir a liderança dessa transição, já que são os principais responsáveis pelas mudanças climáticas.
É um passo importante, mas a necessidade de ter metas mais claras sobre a redução do uso de fósseis já estava evidenciada desde 1992, quando a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (conhecida como ECO 92) aconteceu no Rio de Janeiro e trouxe em seu relatório final que os fósseis são a principal fonte de emissões de gases de efeito estufa do mundo. Mais de 30 anos depois, a COP 28 incluiu em seu texto a necessidade de esforços globais para endereçar esse tema.
“Depois de tantos anos sem que esse tema [combustíveis fósseis] entrasse nas COPs, ele está sendo tratado e isso já é uma demonstração de algo inédito ao longo de 31 anos”, comentou Marina Silva, ministra do Meio Ambiente do Brasil.
Por isso, a COP 28 tem sido considerada como “o início do fim” da era dos combustíveis fósseis. “Embora não tenhamos virado a página da era dos combustíveis fósseis em Dubai, este resultado é o início do fim”, disse o secretário-executivo da Convenção do Clima da ONU, Simon Stiell, no seu discurso de encerramento. “Agora, todos os governos e empresas precisam transformar estes compromissos em resultados para a economia real, sem demora.”
Essa decisão faz parte do primeiro “balanço global” (Global Stocktake, ou GST) do mundo para acelerar a ação climática antes do final da década. O GST reconheceu a ciência que indica que as emissões globais de gases de efeito estufa precisam de ser reduzidas em 43% até 2030, em comparação com os níveis de 2019, para limitar o aquecimento global a 1,5°C em relação ao nível pré-industrial.
Outros avanços
Além do GST com menção à transição energética e o reforço à meta de limitar o aquecimento global 1,5°C, a COP28 teve resultados relevantes também para temas como Perdas e Danos, financiamento climático e adaptação, embora bem abaixo do necessário.
Logo nos primeiros dias, durante o World Climate Action Summit, que reuniu 154 Chefes de Estado e de Governo, os países chegaram a um acordo histórico sobre a operacionalização do fundo de Perdas e Danos e dos acordos de financiamento. Foi a primeira vez que uma decisão substantiva foi adotada já nos primeiros dias da conferência. Os compromissos para o fundo começaram a surgir momentos após a decisão ter sido tomada, totalizando mais de US$ 700 milhões até à data. No entanto, segundo matéria publicada pelo jornal britânico The Guardian, esse valor cobre apenas 0,2% das perdas que os países em desenvolvimento sofrem enfrentando o aquecimento global anualmente. As estimativas do custo anual dos danos variam entre US$ 100 bilhões e US$ 580 bilhões.
O financiamento climático ocupou o centro das atenções na conferência. Seis países prometeram novos financiamentos ao Fundo Verde para o Clima (GCF) na COP 28, com compromissos totais atingindo agora um recorde de US$ 12,8 bilhões de 31 países.
Oito governos anunciaram compromissos para o Fundo dos Países Menos Desenvolvidos e para o Fundo Especial para as Mudanças Climáticas, totalizando mais de US$ 174 milhões; e outros novos compromissos de quase US$ 188 milhões foram feitos ao Fundo de Adaptação na COP 28. No entanto, esses compromissos financeiros estão muito aquém dos bilhões eventualmente necessários para apoiar os países em desenvolvimento nas transições para energias limpas e na implementação dos seus planos climáticos nacionais.
A COP 28 deu um passo importante também ao apresentar um primeiro texto para a Global Goal on Adaptation (Meta Global de Adaptação, em inglês). Mas especialistas acreditam que seria necessário ter um texto mais claro no que se refere aos objetivos individuais de cada país. Karen Oliveira, diretora de Políticas Públicas e Relações Governamentais da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, avaliou o texto como positivo, afinal “traz diretrizes para 2025 e metas condizentes com a redução de desigualdades para 2030. No entanto, não estabelece como obrigatório que países apresentem metas sobre adaptação em suas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas – os compromissos de cada país no Acordo de Paris), ou seja, ainda é uma grande carta de intenções”.
Olhando para frente
Cerca de 85 mil pessoas participaram da COP 28, segundo a UNFCCC, e agora as atenções estão voltadas para o caminho rumo à COP 30, em Belém. No próximo ano, o país a sediar a COP29 será o Azerbaijão e foi anunciado um grupo dos países sede dessa e das próximas duas COPs (Emirados Árabes Unidos, Azerbaijão e Brasil) para coordenar ações até a COP 30, em 2025. Será o momento em que o Acordo de Paris completará 10 anos e este é o prazo estabelecido para a revisão das NDCs dos países, a partir do GST resultante da COP 28 como base para apresentar novas metas climática e, finalmente, colocar o planeta rumo à meta de limitar o aquecimento global a 1,5° C.
“Devemos continuar com o trabalho de colocar o Acordo de Paris em pleno funcionamento”, disse Stiell. “Minha mensagem final é para que as pessoas comuns em todos os lugares do mundo levantam suas vozes em prol da mudança. Cada um de vocês está fazendo uma diferença real. Nos próximos anos cruciais, as suas vozes serão mais importantes do que nunca. Ainda estamos nesta corrida.”