Texto originalmente publicado no TerraMagazine.
Atenção, eleitores! Trabalhar menos dias por semana fortalece a democracia, pois as pessoas teriam mais tempo de participar de atividades locais, engajar-se em movimentos e campanhas, acompanhar e monitorar o que os políticos locais e nacionais fazem e deixam de fazer.
Esta é uma das 10 razões listadas por aqueles que defendem uma semana mais curta de trabalho. Hoje, 5a feira, por exemplo, já estaríamos de folga. Não se trata de piada de escritório, há uma turma debruçada em estudos sobre os benefícios de se ter quatro ou até três dias de trabalho por semana, como mais recentemente defendeu o bilionário das telecomunicações Carlos Slim, em um encontro de negócios no Paraguai.
Quem reúne boa parte dessas informações é o think-tank New Economics Foundation (NEF), nome acompanhado do britanicamente irônico slogan – Economics as if People and the Planet Mattered (“A Economia como se as pessoas e o planeta tivessem importância”).
Mas vamos lá às demais nove justificativas, antecedidas por um habeas corpus da NEF: estão falando de uma grande transição, não de soluções instantâneas. De fato, listadas assim de bate pronto, soam até ingênuas de tão impossíveis dada a atual engrenagem do modelo econômico em que vivemos – basicamente movido pela ideia de trabalhar muito para poder consumir mais, enquanto as demandas sociais não são atendidas e o desequilíbrio ambiental se aprofunda. Em síntese, trabalha-se para manter o sistema, em vez de o sistema trabalhar a favor das pessoas e do planeta.
Por isso a NEF sustenta que países com menos horas de trabalho, como o Reino Unido, tendem a uma pegada ecológica menor, e esta é uma das principais razões para se buscar uma semana de trabalho mais curta. Não que isso enfraqueça a economia, ao contrário: a segunda razão listada é justamente o oposto, uma economia mais forte, com maior equidade, e menor dependência de um crescimento alimentado pela dívida – elementos que fazem uma economia ser mais robusta, como a da Alemanha e da Holanda, onde se trabalha menos que nos Estados Unidos, por exemplo.
Trabalhar menos horas levaria também à criação de melhores empregos, pois a quantidade de horas será substituída pela qualidade: com menos tempo de trabalho, tende-se a buscar maior produtividade. Pessoas que trabalham menos horas estão menos propensas ao absenteísmo e formam uma força de trabalho mais comprometida.
Mais razões: menor desemprego, pois a semana mais curta ajudaria a redistribuir tarefas entre os que trabalham muito e os que estão sem trabalho; e aumento do bem-estar, com mais tempo disponível para buscar a saúda física e mental, e para refletir sobre o que de fato vale a pena na vida além de ir ao shopping.
As pessoas teriam mais tempo para cultivar o relacionamento com familiares, amigos e vizinhos, fortalecendo os laços sociais. Os custos com o cuidado das crianças diminuiriam, e haveria uma melhor divisão de tarefas não remuneradas (como as domésticas) entre homens e mulheres. A aposentadoria também seria um processo mais suave, com diminuição gradual de horas trabalhadas, evitando traumas e depressão causadas pela mudança repentina no ritmo de vida.
Não há como pensar a sério nessas mudanças que não sob a ótica da transição de longo prazo, de uma transformação profunda de modelo, valores, cultura. Basta ver o que aconteceu com a economia brasileira em junho e julho últimos, em que foi assolada por uma quantidade atípica de feriados e dias parados por conta de jogos da Copa do Mundo. Um estrago.
Também é preciso transpor essa argumentação dos que defendem uma semana mais curta para países em desenvolvimento como o Brasil. O que funciona nos países ricos serviria para cá?
E, mais que questões estruturais econômicas, há as de ordem comportamental. Quantas pessoas nós conhecemos (talvez nós mesmos) que se afundam no trabalho para esquecer os problemas pessoais? Queremos ter mais tempo para a sogra, para o marido, para a mulher, para a lição de casa dos filhos, para estar a só consigo mesmo descobrir os próprios defeitos? Queremos mesmo conviver com os vizinhos?
Nós, que nos julgamos tão importantes por estarmos sempre ocupados, na correria, como lidaremos com o tempo ocioso e nossa real insignificância? Afundando o nariz nos smartphones para não cumprimentar quem entra no elevador? Talvez haja mais que 10 razões para muita gente querer uma semana de trabalho longa, até mesmo invadindo o fim de semana.
Foto: Alan Cleaver/Flickr (Creative Commons)