A humanidade dispõe de dinheiro, tecnologia e conhecimento para mudar a rota que conduz a uma alta catastrófica da temperatura no planeta. A bola está com atores políticos e econômicos, que têm pouco mais de um ano para fechar um acordo global decisivo
As notícias não foram boas nos últimos meses. Apesar de estagnada desde 2008, a economia mundial não consegue reduzir as emissões de carbono no ritmo necessário. Para manter o aquecimento global em 2 graus [1] até 2100, teríamos de emitir 6,2% a menos ano após ano. Em 2013, a redução foi de só 1,2%, de acordo com relatório da consultoria PwC. No ritmo anual, caminhamos facilmente para um aquecimento de 4 graus. Entre os dois cenários – de 2 e de 4 graus –, a diferença é um abismo: ou um planeta mais difícil de viver, com desastres frequentes, falta de comida e de água, populações deslocadas, ou uma mudança climática descontrolada e completamente inóspita para a civilização (ver gráfico 1).
[1] Dois graus é o aumento mínimo que o planeta sofrerá, no cenário mais otimista desenhado pela comunidade científica. Mesmo assim, imporá uma forte mudança nas formas de vida na Terra
Já os oceanos, responsáveis por segurar boa parte do aquecimento global, estão esquentando a uma velocidade superior à prevista, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês). Assim, fica ainda mais estreito o ultimato para encontrar soluções climáticas. Em setembro, a ONG WWF anunciou que, nos últimos 40 anos, por efeito da ação humana, a população mundial de animais vertebrados caiu à metade, enquanto a distância entre a oferta de recursos naturais do planeta e as demandas do sistema econômico só cresce (ver gráfico 2).
Gráfico 1
Gráfico 2
A sucessão de dados negativos acrescenta uma dose de urgência ao esforço de controlar o acúmulo de carbono na atmosfera e, assim, reduzir boa parte da nossa pegada ecológica.
Depois de anos em que negociações multilaterais esbarraram na incapacidade de encontrar um terreno comum para um acordo entre políticos de diversos países, é cada vez maior a convicção, em sociedades ao redor do mundo, de que não se pode mais postergar uma solução por motivos políticos.
A 21a Conferência da ONU para o clima (COP 21), que ocorrerá em Paris em dezembro de 2015, torna-se tão mais decisiva para o futuro da civilização quanto mais se aproxima a data. Negociadores e ativistas esperam conseguir até lá chegar a um acordo climático eficaz. A COP 20 ocorrerá em dezembro deste ano em Lima (Peru), mas só no ano seguinte os ativistas acreditam que se produzirá algo concreto.
“Se fizermos tudo que pode ser feito, há 75% de chance de conseguirmos manter o aquecimento global dentro dos 2 graus até 2100”, diz o ecologista Tom Athanasiou, diretor- executivo da ONG americana EcoEquity, citando estudos do IPCC.
Athanasiou separa a questão em duas: técnico-científica e político-econômica. “Temos o dinheiro, a tecnologia e a ciência para fazer uma redução emergencial rápida o suficiente para segurar a linha de 2 graus. É um declínio global de emissões muito veloz e que ainda seria muito perigoso, porque envolveria o dobro do aquecimento que tivemos até hoje [de 0,8 grau]”, diz. “Mas com o ‘business and politics as usual’ , duvido que dê para evitar os 3 graus ou até 4 graus.”
MECANISMOS DE MERCADO
Segundo o sociólogo Sérgio Abranches, que edita o site Ecopolítica, o fato de os modelos climáticos terem margens de erro elevadas resulta em discordância entre cientistas sobre a possibilidade de a temperatura ficar abaixo dos 2 graus de aquecimento. O resultado se reflete sobre a política, porque “a política trabalha com certezas. Se alguém manifesta qualquer dúvida sobre um ponto, os políticos adiam a decisão, e é isso que tem acontecido”.
Muitas das propostas para reduzir as emissões ao redor do mundo envolvem mecanismos de mercado, propiciados pelo Protocolo de Kyoto, baseados no cap-and-trade, que impõe um limite de emissões e cria créditos que podem ser negociados. Mas, sem poder de sanção e sem o apoio de países importantes como EUA e China, o protocolo é considerado um fracasso.
“Os mecanismos de mercado já mostraram que (sozinhos) não são suficientes”, diz Abranches, citando o exemplo dos créditos de carbono europeus, que não foram capazes de reduzir as emissões no continente. “Não é possível fazer o mercado funcionar só com incentivos. É preciso combiná-los com penalidades que tornem os incentivos mais atraentes para empresas emissoras.”
Para o sociólogo, o único instrumento econômico eficaz é o imposto sobre o carbono, adotado por vários países e recentemente aprovado no Chile, que também contém um sobrepreço aplicado a importações de países que não têm o imposto. A Organização Mundial do Comércio (OMC) publicou no ano passado uma portaria em que aprova o imposto de carbono e não o considera como prática desleal de concorrência. “O imposto precifica de forma penalizadora as emissões, e as empresas buscam formas de se adequar. Esse é o único jeito de fazer com que o mercado tome iniciativas para reduzir suas emissões”, argumenta (mais sobre a eficácia dos mecanismos de precifição do carbono em reportagem).
Athanasiou lembra que as catástrofes climáticas dos últimos anos ocorreram no contexto de um aquecimento ainda na casa dos 0,8 grau. Uma lista exaustiva pode ser encontrada no website do Centro de Pesquisa em Epidemiologia de Desastres (Cred), da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica . “Um aquecimento de 2 graus causará imensa destruição e sofrimento, mas não significa o fim da civilização humana”, diz o ativista, que antevê um cenário de migrações massivas, fome, extinções e guerra constante caso cheguemos a 3 ou 4 graus. Athanasiou falou à PÁGINA22 enquanto se preparava para viajar até Bonn, na Alemanha, onde ocorreu uma conferência preparatória para a COP 20, em Lima.
O Cred informa que na década de 1940 houve 120 desastres hidrometeorológicos (que podem ter tido origem humana) contra 52 geológicos (eventos naturais). De2000 a 2005, foram 233 geológicos contra 2.135 hidrometeorológicos. O resultado sugere que o ser humano é que tem cada vez mais causado desastres ambientais.
Na ONG EcoEquity, que ele mantém com outros especialistas do clima, foi desenvolvido o conceito de Global Development Rights. Trata-se de um cálculo destinado a orientar um futuro sistema de impostos globais, cujo foco está na convicção de que nenhum acordo será obtido sem atacar o problema da desigualdade. Daí a divisão entre a responsabilidade – o quanto um país, empresa ou indivíduo polui – e a capacidade de enfrentar o problema – o quanto é capaz de contribuir para reduzir as emissões.
“A crise do clima é uma crise global dos comuns. Mas a habilidade de pagar pela transição é geográfica e economicamente separada de onde a transição deve acontecer. É preciso mover a finança e a tecnologia através do pla- neta, e muito, para atingir as taxas altíssimas de descarbonização necessárias para estabilizar o sistema climático”, explica.
MARCHA DO CLIMA
A maior tentativa de mobilizar as sociedades de todo o mundo para pressionar governantes e negociadores de acordos climáticos ocorreu em 21 de setembro, com a Marcha Popular Global do Clima [2]. Em Nova York, dois dias antes do encontro de líderes mundiais que a cidade sediou, 400 mil pessoas foram às ruas, acompanhadas à distância por manifestações em centenas de cidades ao redor do mundo, incluindo Rio de Janeiro e São Paulo (mais em reportagem).
[2] Mais sobre as marchas ao redor do mundo aqui
Os organizadores da marcha foram os membros da ONG 350.org, dedicada a conscientizar a população quanto aos perigos ligados à mudança climática. O número que dá nome à instituição, “350”, corresponde ao limite de concentração, em ppm (partes por milhão), de partículas de gases de efeito estufa, abaixo do qual ainda é possível controlar o aquecimento global. No ano passado, porém, a marca de 400 ppm foi ultrapassada.
Alguns organizadores da marcha esperavam que Nova York recebesse até 1 milhão de manifestantes, a exemplo de protestos semelhantes na década de 1970, contra os armamentos nucleares ou em prol das primeiras leis ambientais. Os 400 mil foram um número expressivo, mas abaixo do desejado. Segundo Sérgio Abranches, o principal motivo é o desencanto das populações com a ação política: as pessoas passaram a considerar que não adianta se mobilizar para pressionar políticos que não reagem às pressões.
Athanasiou considera que o comparecimento foi satisfatório, mas afirma que não é o mais importante. Aos poucos, diz, os grupos de ativistas de todo o mundo estão convergindo para uma agenda comum. “É no ano que vem, em Paris, que vamos precisar juntar 1 milhão de pessoas”, crava. “A Europa tem um monte de verdes! Vamos juntá-los em Paris!”
A 350.org também é promotora da iniciativa “Divesting from Fossil Fuel” (Desinvestir em Combustíveis Fósseis), lançada em 2012 . A estratégia consiste em convencer fundos de investimento, universidades, filantropos e outras entidades a retirar seus investimentos de empresas petrolíferas.
Os membros da ONG consideram que a iniciativa já pode ser considerada como bem-sucedida, porque gerou discussões na mídia e conseguiu adesões de universidades e fundos filantrópicos ao redor do mundo. Uma adesão recente tem sabor particularmente irônico: os descendentes do magnata do petróleo John D. Rockefeller, fundador da Standard Oil, anunciaram que vão retirar gradativamente seus investimentos em empresas petrolíferas (mais em reportagem).
ALGO A COMEMORAR
Nem todas as notícias foram ruins este ano. Em grande medida graças à iniciativa alemã de ampliar a participação de usinas eólicas e painéis solares em sua matriz energética, o custo das fontes renováveis de energia está cada vez mais competitivo. Ainda não é certo, porém, que a transição para uma matriz energética mais limpa ocorra na velocidade necessária. “A mudança da matriz energética mundial está impulsionando o desengarrafamento de alguns problemas tecnológicos urgentes”, diz Abranches. “Um ponto que vai nos levar a um novo patamar em energia eólica é a armazenagem, que ainda não está resolvida.”
O cientista político cita também o desenvolvimento de biocombustíveis de segunda geração, cuja produção não compete com produtos de alimentação. “Claramente,esta é uma transição longa e gradual. Não temos ainda uma fonte que possa substituir o petróleo nas mesmas condições de eficiência energética e variedade de uso em curto prazo”, afirma o cientista político (leia reportagem sobre o pré-sal brasileiro).
[:en]A humanidade dispõe de dinheiro, tecnologia e conhecimento para mudar a rota que conduz a uma alta catastrófica da temperatura no planeta. A bola está com atores políticos e econômicos, que têm pouco mais de um ano para fechar um acordo global decisivo
As notícias não foram boas nos últimos meses. Apesar de estagnada desde 2008, a economia mundial não consegue reduzir as emissões de carbono no ritmo necessário. Para manter o aquecimento global em 2 graus [1] até 2100, teríamos de emitir 6,2% a menos ano após ano. Em 2013, a redução foi de só 1,2%, de acordo com relatório da consultoria PwC. No ritmo anual, caminhamos facilmente para um aquecimento de 4 graus. Entre os dois cenários – de 2 e de 4 graus –, a diferença é um abismo: ou um planeta mais difícil de viver, com desastres frequentes, falta de comida e de água, populações deslocadas, ou uma mudança climática descontrolada e completamente inóspita para a civilização (ver gráfico 1).
[1] Dois graus é o aumento mínimo que o planeta sofrerá, no cenário mais otimista desenhado pela comunidade científica. Mesmo assim, imporá uma forte mudança nas formas de vida na Terra
Já os oceanos, responsáveis por segurar boa parte do aquecimento global, estão esquentando a uma velocidade superior à prevista, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês). Assim, fica ainda mais estreito o ultimato para encontrar soluções climáticas. Em setembro, a ONG WWF anunciou que, nos últimos 40 anos, por efeito da ação humana, a população mundial de animais vertebrados caiu à metade, enquanto a distância entre a oferta de recursos naturais do planeta e as demandas do sistema econômico só cresce (ver gráfico 2).
Gráfico 1
Gráfico 2
A sucessão de dados negativos acrescenta uma dose de urgência ao esforço de controlar o acúmulo de carbono na atmosfera e, assim, reduzir boa parte da nossa pegada ecológica.
Depois de anos em que negociações multilaterais esbarraram na incapacidade de encontrar um terreno comum para um acordo entre políticos de diversos países, é cada vez maior a convicção, em sociedades ao redor do mundo, de que não se pode mais postergar uma solução por motivos políticos.
A 21a Conferência da ONU para o clima (COP 21), que ocorrerá em Paris em dezembro de 2015, torna-se tão mais decisiva para o futuro da civilização quanto mais se aproxima a data. Negociadores e ativistas esperam conseguir até lá chegar a um acordo climático eficaz. A COP 20 ocorrerá em dezembro deste ano em Lima (Peru), mas só no ano seguinte os ativistas acreditam que se produzirá algo concreto.
“Se fizermos tudo que pode ser feito, há 75% de chance de conseguirmos manter o aquecimento global dentro dos 2 graus até 2100”, diz o ecologista Tom Athanasiou, diretor- executivo da ONG americana EcoEquity, citando estudos do IPCC.
Athanasiou separa a questão em duas: técnico-científica e político-econômica. “Temos o dinheiro, a tecnologia e a ciência para fazer uma redução emergencial rápida o suficiente para segurar a linha de 2 graus. É um declínio global de emissões muito veloz e que ainda seria muito perigoso, porque envolveria o dobro do aquecimento que tivemos até hoje [de 0,8 grau]”, diz. “Mas com o ‘business and politics as usual’ , duvido que dê para evitar os 3 graus ou até 4 graus.”
MECANISMOS DE MERCADO
Segundo o sociólogo Sérgio Abranches, que edita o site Ecopolítica, o fato de os modelos climáticos terem margens de erro elevadas resulta em discordância entre cientistas sobre a possibilidade de a temperatura ficar abaixo dos 2 graus de aquecimento. O resultado se reflete sobre a política, porque “a política trabalha com certezas. Se alguém manifesta qualquer dúvida sobre um ponto, os políticos adiam a decisão, e é isso que tem acontecido”.
Muitas das propostas para reduzir as emissões ao redor do mundo envolvem mecanismos de mercado, propiciados pelo Protocolo de Kyoto, baseados no cap-and-trade, que impõe um limite de emissões e cria créditos que podem ser negociados. Mas, sem poder de sanção e sem o apoio de países importantes como EUA e China, o protocolo é considerado um fracasso.
“Os mecanismos de mercado já mostraram que (sozinhos) não são suficientes”, diz Abranches, citando o exemplo dos créditos de carbono europeus, que não foram capazes de reduzir as emissões no continente. “Não é possível fazer o mercado funcionar só com incentivos. É preciso combiná-los com penalidades que tornem os incentivos mais atraentes para empresas emissoras.”
Para o sociólogo, o único instrumento econômico eficaz é o imposto sobre o carbono, adotado por vários países e recentemente aprovado no Chile, que também contém um sobrepreço aplicado a importações de países que não têm o imposto. A Organização Mundial do Comércio (OMC) publicou no ano passado uma portaria em que aprova o imposto de carbono e não o considera como prática desleal de concorrência. “O imposto precifica de forma penalizadora as emissões, e as empresas buscam formas de se adequar. Esse é o único jeito de fazer com que o mercado tome iniciativas para reduzir suas emissões”, argumenta (mais sobre a eficácia dos mecanismos de precifição do carbono em reportagem).
Athanasiou lembra que as catástrofes climáticas dos últimos anos ocorreram no contexto de um aquecimento ainda na casa dos 0,8 grau. Uma lista exaustiva pode ser encontrada no website do Centro de Pesquisa em Epidemiologia de Desastres (Cred), da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica . “Um aquecimento de 2 graus causará imensa destruição e sofrimento, mas não significa o fim da civilização humana”, diz o ativista, que antevê um cenário de migrações massivas, fome, extinções e guerra constante caso cheguemos a 3 ou 4 graus. Athanasiou falou à PÁGINA22 enquanto se preparava para viajar até Bonn, na Alemanha, onde ocorreu uma conferência preparatória para a COP 20, em Lima.
O Cred informa que na década de 1940 houve 120 desastres hidrometeorológicos (que podem ter tido origem humana) contra 52 geológicos (eventos naturais). De2000 a 2005, foram 233 geológicos contra 2.135 hidrometeorológicos. O resultado sugere que o ser humano é que tem cada vez mais causado desastres ambientais.
Na ONG EcoEquity, que ele mantém com outros especialistas do clima, foi desenvolvido o conceito de Global Development Rights. Trata-se de um cálculo destinado a orientar um futuro sistema de impostos globais, cujo foco está na convicção de que nenhum acordo será obtido sem atacar o problema da desigualdade. Daí a divisão entre a responsabilidade – o quanto um país, empresa ou indivíduo polui – e a capacidade de enfrentar o problema – o quanto é capaz de contribuir para reduzir as emissões.
“A crise do clima é uma crise global dos comuns. Mas a habilidade de pagar pela transição é geográfica e economicamente separada de onde a transição deve acontecer. É preciso mover a finança e a tecnologia através do pla- neta, e muito, para atingir as taxas altíssimas de descarbonização necessárias para estabilizar o sistema climático”, explica.
MARCHA DO CLIMA
A maior tentativa de mobilizar as sociedades de todo o mundo para pressionar governantes e negociadores de acordos climáticos ocorreu em 21 de setembro, com a Marcha Popular Global do Clima [2]. Em Nova York, dois dias antes do encontro de líderes mundiais que a cidade sediou, 400 mil pessoas foram às ruas, acompanhadas à distância por manifestações em centenas de cidades ao redor do mundo, incluindo Rio de Janeiro e São Paulo (mais em reportagem).
[2] Mais sobre as marchas ao redor do mundo aqui
Os organizadores da marcha foram os membros da ONG 350.org, dedicada a conscientizar a população quanto aos perigos ligados à mudança climática. O número que dá nome à instituição, “350”, corresponde ao limite de concentração, em ppm (partes por milhão), de partículas de gases de efeito estufa, abaixo do qual ainda é possível controlar o aquecimento global. No ano passado, porém, a marca de 400 ppm foi ultrapassada.
Alguns organizadores da marcha esperavam que Nova York recebesse até 1 milhão de manifestantes, a exemplo de protestos semelhantes na década de 1970, contra os armamentos nucleares ou em prol das primeiras leis ambientais. Os 400 mil foram um número expressivo, mas abaixo do desejado. Segundo Sérgio Abranches, o principal motivo é o desencanto das populações com a ação política: as pessoas passaram a considerar que não adianta se mobilizar para pressionar políticos que não reagem às pressões.
Athanasiou considera que o comparecimento foi satisfatório, mas afirma que não é o mais importante. Aos poucos, diz, os grupos de ativistas de todo o mundo estão convergindo para uma agenda comum. “É no ano que vem, em Paris, que vamos precisar juntar 1 milhão de pessoas”, crava. “A Europa tem um monte de verdes! Vamos juntá-los em Paris!”
A 350.org também é promotora da iniciativa “Divesting from Fossil Fuel” (Desinvestir em Combustíveis Fósseis), lançada em 2012 . A estratégia consiste em convencer fundos de investimento, universidades, filantropos e outras entidades a retirar seus investimentos de empresas petrolíferas.
Os membros da ONG consideram que a iniciativa já pode ser considerada como bem-sucedida, porque gerou discussões na mídia e conseguiu adesões de universidades e fundos filantrópicos ao redor do mundo. Uma adesão recente tem sabor particularmente irônico: os descendentes do magnata do petróleo John D. Rockefeller, fundador da Standard Oil, anunciaram que vão retirar gradativamente seus investimentos em empresas petrolíferas (mais em reportagem).
ALGO A COMEMORAR
Nem todas as notícias foram ruins este ano. Em grande medida graças à iniciativa alemã de ampliar a participação de usinas eólicas e painéis solares em sua matriz energética, o custo das fontes renováveis de energia está cada vez mais competitivo. Ainda não é certo, porém, que a transição para uma matriz energética mais limpa ocorra na velocidade necessária. “A mudança da matriz energética mundial está impulsionando o desengarrafamento de alguns problemas tecnológicos urgentes”, diz Abranches. “Um ponto que vai nos levar a um novo patamar em energia eólica é a armazenagem, que ainda não está resolvida.”
O cientista político cita também o desenvolvimento de biocombustíveis de segunda geração, cuja produção não compete com produtos de alimentação. “Claramente,esta é uma transição longa e gradual. Não temos ainda uma fonte que possa substituir o petróleo nas mesmas condições de eficiência energética e variedade de uso em curto prazo”, afirma o cientista político (leia reportagem sobre o pré-sal brasileiro).