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A memória já me falha, mas lembro que os comandos do LOGO eram algo parecido com isso. Não tinha nem 10 anos de idade, mas ver a tartaruguinha andar pela tela do computador através dos comandos que eu digitava era uma sensação inesquecível. A década, a de 1980. O computador de casa (um CP-400 Color II da Prológica) tinha que ser ligado na televisão, e os programas eram lidos e gravados em fitas cassete, usando um gravador comum, também conectado ao computador. Na 6ª série, lembro de passar regularmente por uma banca de revistas voltando da escola e procurar pelas revistas de programação, chegar em casa e começar a fuçar os códigos-fonte, mexer aqui e acolá e aprender na prática diferentes linguagens (BASIC, Clipper, Pascal, C etc.).
Já na virada do século, a finlandesa Linda Liukas, aos 14 anos, montou seu primeiro website, uma fan page dedicada à sua paixão adolescente, o ex-vice-presidente americano Al Gore. Isso acabou acendendo o fogo de uma nova paixão, a programação. Por meio dela, Liukas encontrou uma maneira de se expressar e exercer sua criatividade e vem se dedicando a ensinar crianças do mundo inteiro a fazer o mesmo, a “criar algo do nada pelo puro poder da lógica” (ver sua palestra TED).
Mitch Resnick, professor e pesquisador do MIT Media Lab, é outro entusiasta da “alfabetização digital” das crianças (ver sua palestra TED). Sua equipe desenvolveu uma ferramenta na qual as crianças são capazes de desenvolver pequenas rotinas sem precisar conhecer a sintaxe das linguagens de programação. Resnick percebeu que as crianças não estavam apenas aprendendo a programar. Ao programarem, também estavam aprendendo e aplicando conceitos mais amplos: princípios de design, como testar ideias, decompor problemas complexos em problemas menores solúveis, colaborar com outras pessoas etc. Também aprendiam a aplicar muitos dos conceitos que viam em outras matérias em sala de aula.
Em 2012, a Estônia tornou-se o primeiro país a incluir programação no currículo do Ensino Fundamental. Dois anos depois, foi seguida pelo Reino Unido, começando com noções básicas já aos 5 anos de idade. Outros países também analisam incluir programação em seu currículo escolar. Mais do que simplesmente ensinar linguagens de programação, o objetivo é promover o “pensamento computacional”: ser capaz de reconhecer padrões, decompor problemas, abstrair e criar algoritmos.
Hoje os computadores não estão mais apenas sobre nossas mesas. Também estão nos carros e geladeiras, em cartões de crédito e até mesmo em um par de óculos. Computadores pequenos e muito baratos como o Raspberry Pi e plataformas abertas como o Arduino estão hoje ao alcance de muitas pessoas, para as aplicações mais diversas possíveis, de automação do lar à robótica. Com uma placa controladora Arduino de US$ 10 e mais alguns componentes eletrônicos, por exemplo, foi possível desenvolver um sistema de medição da salinidade do solo que, em 2015, conseguiu reduzir em 25% o volume de água de irrigação em uma vinicultura na Califórnia, economizando o equivalente a 1,6 milhão de litros de água. O Vinduino (vinícola + Arduino, embora possa ser usado em qualquer tipo de plantação) é um projeto de licença aberta e, assim como muitos outros projetos dessa plataforma, entusiastas podem modificar o projeto e seu código-fonte livremente.
Saber programar é também uma maneira cada vez mais importante de participar diretamente das questões públicas. O movimento de aumento da transparência no serviço público e, mais especificamente, da disponibilização pública de dados governamentais deu origem a uma série de iniciativas, no Brasil e no mundo, para a construção de aplicativos que acessam, analisam e apresentam para a sociedade informações relativas a serviços públicos, transportes, execução orçamentária do governo etc. Os hackathons, maratonas de programação na qual hackers se reúnem por horas, dias ou até semanas em torno de um objetivo, têm sido explorados por diversos governos, incluindo as prefeituras do Rio e de São Paulo.
Linguagens de programação são, de fato, uma espécie de “esperanto digital”: o código-fonte de um programa pode ser lido e compreendido da mesma forma por brasileiros e nepaleses e ajudar a resolver problemas comuns a ambos. Neste século, saber programar pode se mostrar algo tão importante quanto conhecer uma segunda língua, pois nos permitirá “conversar” com os objetos ao nosso redor e tomar as rédeas da tecnologia, usando-a em prol da humanidade.