O novo formato institucional adotado no governo paulista é apontado como uma estratégia de desmonte de políticas públicas ambientais, na mesma esteira das que já vêm ocorrendo no governo federal
Douglass C. North, laureado com o Prêmio Nobel de Economia, escreveu em seu livro Instituições, mudança institucional e desempenho econômico (Três Estrelas, 2018) que “as instituições são as regras do jogo em uma sociedade ou, em definição mais formal, as restrições concebidas pelo homem que moldam a interação humana.” Instituições estruturam incentivos no intercâmbio humano, sejam eles políticos, sociais ou econômicos.
North explica que as instituições reduzem a incerteza ao conferir uma estrutura à vida cotidiana, representam um guia para a interação humana e abrangem quaisquer formas de restrição que os indivíduos engendrem para moldar essa interação. Nesses termos, o principal papel das instituições em dada sociedade seria reduzir a incerteza, ao estabelecer uma estrutura estável a fim de regular a interação entre seres humanos.
O vencedor do Nobel de Economia de 1993 afirma que, em termos institucionais, a estabilidade é alcançada mediante um complexo conjunto de condicionamentos que abrange regras formais hierarquizadas, além de restrições informais, que são extensões, aprimoramentos e retificações das regras, que passam, inclusive, a fazer parte dos hábitos. Assim, rotinas, costumes, tradições e convenções são palavras que usamos para denotar a persistência das restrições informais. E é a complexa interação de regras formais e restrições informais, junto com o modo pelo qual elas são aplicadas, que molda nosso cotidiano e nos orienta em seu caráter predominantemente convencional. Embora a combinação de regras e normas varie, esta nos proporciona a confortante sensação de sabermos o que estamos fazendo e para onde estamos indo.
Assim, a estabilidade institucional representaria algo positivo para a economia, e, apesar de não garantir por si só eficiência, apresenta-se como atributo desejável em termos microeconômicos desenhados por North, podendo-se afirmar, deste modo, a importância, no âmbito econômico e socioambiental, da previsibilidade nas relações e da segurança traduzida nesse processo, sobretudo a segurança jurídica.
Em termos econômicos, vale mencionar aqui um importante trabalho que estima o custo do chamado retrocesso ambiental. Trata-se de um estudo publicado na Nature Climate Change, um dos mais renomados veículos científicos sobre mudanças climáticas. O estudo, denominado The threat of political bargaining to climate mitigation in Brazil, é assinado por seis professores e pesquisadores da Coppe/UFRJ, três pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e um da Universidade de Brasília (UnB). A pesquisa se originou em razão de ações do governo que sinalizaram o aumento do desmatamento a proprietários de terra, colocando em risco a contribuições assumidas perante o Acordo de Paris.
Na pesquisa, que apresentou três cenários de governança, concluiu-se (no pior cenário) que o retrocesso ambiental poderá ter impacto financeiro de US$ 5 trilhões até 2050. Nessa hipótese, analisada e desenhada pelos dez cientistas, haveria um quadro de governança fragilizado ao extremo, com o desmatamento seguindo de maneira feroz no País, e a necessidade de se comprar créditos de carbono no exterior para cumprir sua parte no esforço global de reduzir a emissão de gases-estufa.
O estudo esclarece que a meta brasileira de redução de gases que provocam o efeito estufa foi construída na expectativa do controle do desmatamento. Contudo, Roberto Schaeffer, um dos autores da pesquisa, afirma que, “em troca de apoio político, o presidente Michel Temer assinou medidas provisórias e decretos que diminuíram exigências para o licenciamento ambiental e suspenderam demarcação de terras indígenas, facilitando que grileiros se beneficiem de recursos de áreas desmatadas ilegalmente.”
Raoni Rajão, outro autor do trabalho, explica que, a partir de 2025, a estimativa é que as emissões dos setores produtivos cresçam, já que o potencial hidrelétrico do Brasil está no limite, e há projeções para o crescimento da indústria e do agronegócio no país. Nesses termos, a “gordura” que se poderia tirar, para se permitir que os setores que geram o PIB nacional emitam os gases-estufa, está no desmatamento, que é vinculado à tomada de terra ilegal e à especulação imobiliária, sem ganho para a economia (mais nesta reportagem).
Assim, as premissas de boa governança até aqui registradas apontam para a estabilidade e previsibilidade das instituições, e o quanto isso é importante para a economia de um país. Além disso, mencionou-se importante estudo que demonstra a possibilidade de prejuízos econômicos abissais que a má gestão do meio ambiente poderá trazer na atualidade.
Então qual seria a relação de tais premissas com o atual cenário político-institucional brasileiro? Recentemente, em âmbito federal, o presidente da República chegou a anunciar a pretensão de extinção do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e sua submissão à pasta da Agricultura, mas, em razão de forte repercussão negativa na sociedade civil, voltou atrás e manteve a autonomia daquele ministério.
Contudo, mesmo com a manutenção do MMA, sob a condução de Ricardo Salles (condenado em primeira instância por fraude na elaboração de plano de manejo em uma Área de Proteção Ambiental em favor de empresas mineradoras), editou-se uma série de decretos, entre outras medidas, que diminuíram sobremaneira a sua autonomia e capacidade de atuação.
A partir de então, em termos ambientais, a imprensa nacional, especializada ou não, revela cotidianamente uma fase marcada pelo desfazimento de conquistas importantes, e retrocessos no que tange especialmente ao desmatamento; violência contra indígenas e quilombolas; liberação de agrotóxicos considerada recorde, alguns, inclusive, há muito tempo proibidos na União Europeia, Estados Unidos e China.
De outro vértice, no âmbito estadual o fenômeno se repetiu, só que com êxito. O governador João Doria, por meio do Decreto n° 64.059 de 2019, promoveu a fusão das antigas secretarias de Meio Ambiente, Saneamento e Recursos Hídricos e Energia e Mineração, dando origem à atual Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado (Sima).
No plano de governo de Doria consta que “meio ambiente, recursos hídricos, saneamento básico e energia são temas estruturantes das sociedades contemporâneas. São sistêmicos, estão intimamente ligados e são interdependentes, não podendo se pensar em soluções de forma isolada, somente poderão ser idealizados considerando o todo do problema, adotando uma visão integradora dos mais diversos atores.” Consta, ainda: “Para que estas propostas se tornem realidade em nossa gestão haverá novo formato interinstitucional para conferir agilidade e eficiência na operação dos serviços de governança hídrica, agilidade no licenciamento ambiental”.
Nesse caso, observa-se que as palavras e frases acima citadas fariam muito sentido desde que deslocadas do novo modelo institucional, em um outro contexto. A integração, a interdependência e a harmonização de questões ambientais com os demais setores podem significar tanto o respeito às normas ambientais, quanto a ineficácia destas, dependendo do conteúdo das normas e temas por elas tratados; das regras que viabilizam o processo na prática; e da perspectiva e viés hermenêutico que lhe são conferidos.
O fato é que esse novo formato institucional vem sendo apontado, por ambientalistas e especialistas na matéria, como uma estratégia de desmonte de políticas públicas ambientais, na mesma esteira das que já vêm ocorrendo no governo federal.
Argumenta-se que, na gestão do governador paulista, o processo de reestruturação tem sido conduzido sem qualquer participação das equipes técnicas e administrativas das áreas afetadas e tampouco do restante da sociedade. Nesses termos, a fusão das secretarias motivou um protesto dos funcionários da Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sima), em 12 de março, contra a política ambiental do governo e a falta de transparência nas decisões a respeito da nova pasta.
Entre as medidas mais polêmicas está a transferência da Sima para a Secretaria da Agricultura e Abastecimento (SAA) de boa parte da Coordenadoria de Biodiversidade e Recursos Naturais (CBRN). Esta coordenadoria era, entre outras atribuições, o setor responsável pelo Programa de Regularização Ambiental (PRA) e pelo Cadastro Ambiental Rural (CAR), estabelecidos na Lei nº 12.651 de 2012, do novo Código Florestal.
No texto Decreto nº 64.122, de 01/03/2019 a coordenadoria foi suprimida da lista de órgãos com representação no Conselho Estadual do Meio Ambiente de São Paulo (Consema). Os Decretos n° 64.131 e n° 64.132 de 2019 extinguiram a CBRN, dividindo suas atribuições entre a agora chamada Coordenadoria de Fiscalização e Biodiversidade (CFB/SIMA) e a Secretaria da Agricultura e Abastecimento (SAA). Dentro da SAA, foi criada a Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS), substituindo a denominação da já consolidada Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati/SAA)
Setores especializados argumentam que esse novo engenho político representa uma desvalorização e rebaixamento da Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) e dos trabalhos de estímulo à biodiversidade paulista. Afirmam que o novo modelo tira o foco das ações de fiscalização ambiental, não sendo possível, com isso, assegurar a efetiva proteção e recuperação da biodiversidade e o cumprimento da Política Estadual do Meio Ambiente. Alega-se que, apesar da interdependência da produção rural e a conservação ambiental, o desenvolvimento sustentável na zona rural deveria ser resultado do trabalho conjunto entre a Sima e a SAA, cada uma com suas atribuições, vocação e missão. Ademais, com o enfraquecimento da Cati – órgão de mais de 50 anos de existência, instituição renomada e de com marca amplamente conhecida pela sociedade e que agora perde sua identidade –, abre-se um potencial de afetar milhares de pequenos e médios produtores rurais com a redução da assistência técnica e extensão rural.
Em termos gerais, a união de temas com interesses e funções práticas tão antagônicas, como meio ambiente e infraestrutura, aponta para diretrizes políticas que visam privilegiar “obras” em detrimento da “preservação ambiental”, por meio da fragilização dos órgãos que respondem pelo licenciamento de projetos de empreendimentos e pela fiscalização de crimes ambientais. Isso porque agora se trata de uma única secretaria, com um único secretário à frente de questões que envolvem infraestrutura e meio ambiente.
Para se ter uma ideia de onde essa questão chegou, hoje estão reunidas, na mesma secretaria, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). Isso significa que atualmente ocupam a mesma pasta órgãos licenciadores e fiscalizadores, e os que solicitam as licenças e são fiscalizados.
Parece surreal, mas infelizmente tal desenho político-institucional é o vigente no Estado. Fundiram-se secretarias que possuem interesses, missões e funções estruturalmente diferenciadas, não havendo como agrupá-las de forma racional, de modo a garantir a autonomia e a efetividade tão necessárias em termos de governança ambiental. Nesse ponto, merecem destaque as palavras do secretário de Meio Ambiente do Guarujá, Sidnei Aranha:
“É tão antagônico o secretário que faz a obra ser o mesmo que vai licenciar e fiscalizar, exercendo o controle ambiental. Via de regra, estamos voltando ao direito penal medieval, no qual o acusador era quem fazia prova e julgava.”
O governador está autorizado a dispor, mediante decreto, sobre a organização e funcionamento da administração estadual. Porém, existem limites ao exercício dessa competência. O Poder Executivo estadual atua, nesse caso, mediante atos de natureza eminentemente política e discricionária, tidos, de forma geral, como imunes ao controle por parte de outros atores estatais, em particular do Poder Judiciário. Contudo, mesmo essa discricionariedade encontra limites quando influencia negativamente a efetividade de direitos essencialmente sensíveis, direitos fundamentais, como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Cabe destacar, aqui, que figura entre as condições basilares de eficácia das normas de direitos fundamentais (ambientais) o estabelecimento de adequada estrutura, inclusive organizacional, em termos político-institucional. Sem esta, normas relativas à seara ambiental tendem a virar “letra morta”, ou seja, não serem aplicadas no plano dos fatos (mais em Eficácia das normas ambientais, Saraiva, 2010). Uma adequada estrutura e desenho institucional também são fundamentais para uma boa governança e uma eficiente realização de políticas públicas.
No entanto, as medidas adotadas pelo governo do Estado de São Paulo apontam para a supressão e desestabilização das estruturas organizacionais e procedimentais indispensáveis para a consecução, de forma eficaz, os deveres estatais vinculativos — no caso, o dever de proteção ambiental. Isso em razão, por exemplo, da descaracterização da figura do Cati e submissão à pasta da Agricultura de questões ambientais essenciais, sem falar nos órgãos que, apesar serem palco de interesses antagônicos, estão sob a tutela do mesmo secretário.
Assim, não há outra conclusão lógica senão que a pasta do Meio Ambiente do Estado perdeu sua necessária e fundamental autonomia, conferindo-se condições para o desmonte de políticas públicas ambientais até então conquistadas, e para a inexistência ou precariedade das políticas públicas vindouras. Está-se diante, no mínimo, de uma potencial violação da proibição de retrocesso ecológico, princípio este já consolidado na doutrina jurídica ambiental brasileira.
Outra questão apresentada por representantes da sociedade civil é que todo o processo de reestruturação tem sido feito sem um mínimo de diálogo com os principais agentes envolvidos. No dia 22 de fevereiro, a Associação de Especialistas Ambientais do Estado de São Paulo (Aeaesp) e Executivos Públicos Associados do Estado de São Paulo (Epaesp), juntamente com a Associação dos Engenheiros e Engenheiros Agrônomos da SMA (Aeeasma), divulgaram uma carta aberta afirmando que “após cinco solicitações de audiência para tratar do assunto, todas ignoradas, viemos a público manifestar nossa indignação quanto à falta de transparência e nossa preocupação quanto aos prováveis resultados negativos que comprometerão o equilíbrio e proteção do meio ambiente.”
Em se tratando do direito constitucional à participação, outro ponto importante diz respeito ao Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema), criado em 1983 e previsto pela Constituição do Estado de 1989. O Consema é órgão máximo consultivo, normativo e recursal integrante do Sistema Ambiental Paulista. Cuida-se de um fórum democrático de discussão dos problemas ambientais, sendo uma instância catalisadora de demandas e propositora de medidas que visam aprimorar a gestão ambiental no Estado. Um espaço que reúne governo, segmentos organizados da sociedade, ambientalistas, sindicatos, universidades, setor produtivo e órgãos de classe.
Com a nova reestruturação estabelecida pelo governo paulista, por meio do Decreto n° 64.122/2019, a presidência do Conselho passou a ser ocupada pelo secretário da Sima, que representa as três antigas secretarias, deflagrando um claro conflito de interesses também no âmbito daquele Conselho Ambiental, por reunirem o licenciado, o licenciador e o fiscalizador na mesma pessoa que responde, em última análise, por essas funções.
Outro fato polêmico foi a recente paralisação do Consema. O Conselho realiza ao menos uma reunião ordinária por mês e, pela primeira vez em muitos anos, as reuniões mensais previstas para janeiro e fevereiro não ocorreram. A justificativa foi a reforma administrativa. Contudo, justamente dentre as atribuições do Conselho, está a competência de “emitir pronunciamento prévio a respeito da Política Estadual do Meio Ambiente e acompanhar sua execução” (art. 3º, III, do Regimento Interno), além de “avaliar as políticas públicas com relevante impacto ambiental”.
Assim, a ausência de manifestação do Consema, no atual contexto, fere disposições regimentais. É, no mínimo, questionável a modificação da estrutura da Administração Pública, com a criação e extinção de órgãos e diretrizes institucionais, sem um debate público, especialmente no âmbito do Consema. Nesse caso, além do princípio constitucional da participação, a grande preocupação é com a transparência necessária ao posicionamento dos diversos atores da sociedade civil, sobre os rumos que estão sendo definidos em termos de políticas públicas ambientais estaduais, isso porque o Conselho sempre teve um papel central na política ambiental do Estado.
Importantíssima a redação do artigo 193, da Constituição Estadual, que estabelece a obrigação do Estado de criar, mediante lei, um sistema de administração da qualidade ambiental, proteção, controle e desenvolvimento do meio ambiente e uso adequado dos recursos naturais, para organizar, coordenar e integrar as ações de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta, assegurada a participação da coletividade, com vários fins e, dentre eles, a proposição de uma política estadual de proteção ao meio ambiente. No parágrafo único do artigo ainda se determina que o referido sistema deverá ser integrado pelo Consema e pelos órgãos executivos incumbidos da realização das atividades de desenvolvimento ambiental.
Nesses termos, destaca-se ainda o art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988, que prevê o dever de observância pela administração pública, inclusive dos Estados, aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e publicidade. Observa-se, aqui, que a transparência nas ações do governo deverá ser demonstrada também em razão do atendimento a essa diretriz constitucional.
Destaca-se que a Constituição Federal de 1988 reforça e fundamenta todas as questões relacionadas ao meio ambiente, quando determina, em seu art. 225, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
Assim, no âmbito da governança ambiental em território paulista, o que se constata é um claro conflito de interesses congregados na mesma moldura, com grande potencial para inviabilizar ou diminuir a eficácia das normas ambientais, num modelo cuja pasta ambiental perdeu conceitualmente sua autonomia, abrindo-se um potencial prejuízo para questões que envolvem fiscalização, controle, licenciamento e, enfim, políticas públicas ambientais e sua eficaz execução.
Reforça-se que, a despeito da grande margem de poder discricionário nas ações do Executivo – em termos de sua estruturação, organização e funcionamento –, essas ações encontram limites nos direitos fundamentais e no comprometimento de sua eficácia. Isso porque não se vive num Estado absolutista, onde vigeram poderes absolutos imunes a outros órgãos ou setores. No século XXI, a atual constituição brasileira alicerça o chamado Estado Democrático de Direito, onde a sociedade civil deve ser ouvida e os direitos fundamentais de caráter ambiental, respeitados.
As mudanças, as evoluções sociais são bem-vindas, mas isso quando promovem melhorias e ganhos à sociedade e ao meio ambiente, e envolvam o respeito aos princípios da transparência e da participação da sociedade civil. Contudo, retrocessos, propiciados por funcionários que ocupam cargos públicos sazonais não podem passar em branco, sem a vigilância e reação de uma população que sentirá as conseqüências na saúde, na qualidade de vida, no seu dia a dia. Não se pode mais ceder às chantagens daqueles que, para aprovar projetos absurdos e prejudiciais à qualidade de vida da coletividade, afirmam, de tempos em tempos, que não há outro caminho a ser percorrido, exceto seus planos, sob pena da redução de postos de trabalho, entre outros prejuízos, que muitas vezes se concretizam por outros motivos, e não em razão da manutenção da qualidade ambiental.
A continuidade do desenvolvimento (econômico) no Estado de São Paulo é algo desejável, mas esse desenvolvimento não poderá ter o custo da diminuição da qualidade de vida da população, resultado de retrocessos socioambientais escondidos sob um argumento desenvolvimentista que, em muitos casos, mascaram outros interesses menos nobres. Há que se observar atentamente as recentes ações, já que as mudanças institucionais apresentadas, além de inviabilizarem políticas públicas ambientais tão importantes para a população do Estado, ainda podem trazer grandes prejuízos econômicos em razão da incerteza, conflito de interesses e instabilidade institucional, na esteira do que leciona o Nobel de Economia Douglass C. North.
Por fim, o processo hoje claro e contínuo de enfraquecimento e desmantelamento dos órgãos ambientais; do Ministério do Meio Ambiente; o novo modelo institucional da pasta ambiental paulista; o aumento do desmatamento, entre outros, são exemplos de políticas públicas alijadas de uma visão sistêmica em termos ambientais e econômicos, com potencial de prejuízos (inclusive financeiros) presentes e futuros, este infelizmente ainda não percebido e encampado pelos setores da agricultura e da indústria. Talvez uma maior conscientização e orientação sejam necessárias para que aqueles setores atentem às questões ambientais, modernizando, desse modo, o atual estilo de governança, adaptando-se às necessidades dos novos tempos, tanto em atendimento a questões que representam benefícios à coletividade, quanto em termos de observância de diretrizes macro e microeconômicas de vanguarda.
*Conselheira do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema) de São Paulo