Quem diria que uma pequena aldeia nos confins de uma ilha japonesa se tornaria exemplo mundial em reciclagem de lixo? A sabedoria milenar que conseguiu plantar arroz no meio da floresta dá agora à vila de Kamikatsu, na ilha de Shikoku, a possibilidade de se transformar na primeira comunidade japonesa com zero desperdício.
Tudo começou com a dificuldade da prefeitura local em incinerar todo o lixo produzido na região. Ficou impossível respeitar o controle do nível de dioxinas (substâncias altamente tóxicas) produzidas pelo processo de incineração de todo o material descartado. Em 2001, o prefeito decidiu então parar de investir nesses equipamentos e implementou o Projeto Resíduo Zero.
A partir do ano seguinte, os 2.000 habitantes da aldeia passaram a selecionar, em suas próprias casas, todo o lixo em 34 categorias. Olha o trabalho que dá: as garrafas devem ser separadas de suas tampas e classificadas por cores e substâncias que abrigavam. Todas elas, além de latas e embalagens de plástico, devem ser lavadas. Jornais e revistas são organizados em pacotes amarrados com um fio fabricado a partir de caixas de leite recicladas. Até os pauzinhos de madeira são descascados e transformados em papel.
Os materiais são entregues no único centro de coleta da cidade, a Academia Resíduo Zero. O que é orgânico é transformado em adubo nas próprias casas dos moradores: praticamente todas elas contam com uma composteira.
Na Academia, os moradores também aprendem noções que vão desde a etiquetagem das substâncias a serem descartadas até maneiras de evitar a contaminação do solo ao manuserem toxinas. Para incentivar a adesão ao projeto, foram presenteados bilhetes de loteria e bônus para a compra de alimentos. A meta é alcançar 2020 com todos os incineradores e o aterro sanitário desativados.
O mais interessante da história é pensar que, apesar das exigências – quase puritanas – no processo de seleção dos materiais, a população local aderiu à iniciativa e o projeto deu muito certo: a taxa de reciclagem em Kamikatsu subiu de 55%, há uma década, para cerca de 80%. O exemplo ficou famoso no Japão, que quer ampliar o projeto para outras regiões.
Alguns moradores ainda reclamam do trabalho de seleção dos materiais, principalmente pelo tempo que levam para organizar tudo. No entanto, como afirma a representante da Academia, Fujii Sonoe, “tudo que se pode fazer é falar com os que duvidam e explicar a importância do que estão fazendo”. A mensagem fundamental: é possível.
Quem quiser conferir matéria do britânico The Guardian sobre a cidade, pode clicar aqui.