Por falta de gente, eventos são cancelados e estandes ficam às moscas
Cheguei à sala Saxo Grammaticus no Bella Center para um evento paralelo na COP-15 da Associação Internacional do Comércio de Emissões (Ieta, na sigla em inglês) marcado para começar às 20 horas. Havia apenas meia dúzia de pessoas na sala aguardando por alguém da Ieta e pelos expositores. Por volta de 20h15, uma dinamarquesa que trabalha no apoio logístico da COP-15 comunicou que o evento fora cancelado.
Infelizmente, o cancelamento desse evento não foi fato isolado nesta quinta-feira. Os seis eventos paralelos programados para o horário de 20h00 a 21h30 foram cancelados, à exceção de um organizado pela Áustria sobre autonomia energética no âmbito local dos governos, que contou com menos de 20 pessoas na plateia. Vários eventos parelos ao longo do dia também foram suspensos ou tiveram audiência raquítica.
Por causa da megarrestrição às ONGs imposta esta semana pelo Secretariado da Convenção do Clima (UNFCCC na sigla em inglês) em coordenação com o governo da Dinamarca, comenta-se que somente 300 representantes de organizações não-governamentais (ONGs) puderam ingressar no Bella Center nesta quinta-feira. Dessa forma, os eventos não foram realizados simplesmente porque a maior parte dos expositores e do público foi impedida de entrar no local. Para amanhã, estava autorizada a entrada de meros 90 representantes das ONGs.
A situação é tão absurda que mesmo Carlos Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e um dos principais climatologistas do mundo, não conseguiu adentrar no Bella Center na segunda-feira (dia 14) e na terça-feira (15), segundo uma fonte. Finalmente, Nobre foi bem-sucedido na quarta-feira em sua terceira tentativa de entrar no local, possivelmente graças à intervenção do Itamaraty.
É melancólica a imagem da área onde se localizam os estandes das organizações. Livros, relatórios, folhetos e cartões de visita permanecem sobre as mesas, mas praticamente não mais se encontra uma alma viva no lugar. Ou melhor, é possível encontrar grupos reunidos aproveitando as cadeiras vazias, que até o início desta semana eram bastante disputadas, ou gente utilizando as mesas dos estandes como suporte para a cerveja que bebem.
Além de prestar informações sobre as atividades da organização e distribuir materiais, os representantes das entidades funcionavam como uma espécie de ponto de contato entre delegados dos países, executivos, ativistas e jornalistas. Sem eles, o trabalho de todo mundo ficou ainda mais complicado.
Jornalistas estão tendo de procurar fontes em hotéis da cidade, sujeitando-se aos atrasos de trens, ônibus e metrô por causa da neve que cai em Copenhague há três dias, enquanto as negociações seguem no Bella Center. Negociadores agora dependem apenas do telefone para consultar especialistas de centros de pesquisa ou ONGs.
Outra razão apontada para o aperto ainda maior no bloqueio a partir desta última quarta-feira foi a necessidade de reforçar a segurança do local com a chegada dos chefes de Estado e Governo. O que ocorre agora, porém, é o inverso. Como somente 300 pessoas ligadas às ONGs puderam entrar no Bella Center nesta quinta-feira, possivelmente a lotação desse imenso lugar não deve ter ultrapassado 10 mil participantes, cinco mil a menos que a capacidade do local.
O sítio mantido pelo governo dinamarquês para prestar informações sobre a COP-15 avisou hoje que dois espaços foram reservados na área central de Copenhague para receber os participantes credenciados (Forum a partir de quinta-feira, dia 17, e Øksnehallen desde quarta-feira, 16). Poderão assistir sessões da COP-15 por telão e participar de eventos paralelos antes programados para acontecer no Bella Center. Em Øksnehallen, a entrada estará livre também para quem não conseguiu credenciamento. O detalhe é que a COP-15 termina oficialmente amanhã, dia 18, podendo ser estendida até sábado caso as negociações assim obriguem.
Será que os organizadores da tão aguardada Conferência do Clima de Copenhague não poderiam ter se antecipado aos problemas e montado um espaço temporário de eventos nas proximidades do Bella Center, onde há amplas áreas desocupadas?
Muitos comentavam no Bella Center que a restrição às ONGs teria sido atitude deliberada para enfraquecer sua influência sobre os negociadores. Talvez a opinião seja exagerada, mas nada melhor que um inquérito público para investigar a (des)organização da 15ª Conferência das Partes da Convenção sobre Mudanças do Clima (COP-15). Uma atitude respeitosa para com os participantes barrados no baile do clima seria o ressarcimento parcial ou total dos gastos dos participantes que foram registrados pela UNFCCC para participar da COP-15.
O esvaziamento removeu muito da energia e da alegria que coloriam o ambiente bastante cinzento e tenso das negociações.