Brasil rejeita ideia, enquanto Greenpeace defende papel distinto para emergentes no regime climático
O vazamento para o jornal britânico The Guardian do rascunho de um documento secreto preparado pelo governo da Dinamarca reacendeu o debate sobre a conveniência de separar grandes economias emergentes do grupo dos países pobres na negociação do futuro acordo climático.
No rascunho, há um anexo B, relativo aos compromissos de redução nos gases-estufa nos países em desenvolvimento, exceto os menos desenvolvidos. Apesar de a proposta não especificar critérios para a divisão do grupo dos países em desenvolvimento, ela indica nas entrelinhas que as economias mais avançadas do mundo em desenvolvimento deveriam assumir papel distinto das nações mais pobres e mais vulneráveis às mudanças climáticas.
“O que mais me causou espécie foi a parte do documento que trata do mecanismo financeiro”, disse Sérgio Serra, embaixador especial do Brasil para mudança do clima, em entrevista coletiva concedida à imprensa brasileira no início da noite desta última terça-feira no escritório da delegação brasileira na COP-15.
A proposta não detalha o montante de recursos que seria disponibilizado anualmente a ações de mitigação e adaptação nos países em desenvolvimento a partir de 2013. Há clareza apenas quanto ao valor da ajuda anual emergencial de US$ 10 bilhões para o período de 2010 a 2012, que seria prestada pelos países desenvolvidos. Entre 2013 e 2020, a assistência financeira seria promovida em função do Produto Interno Bruto (PIB) e do nível de emissões de gases-estufa dos países, o que sugere a inclusão das economias emergentes na operação.
Serra foi incisivo quanto à separação das nações em desenvolvimento em dois grupos: “Esse seria um assunto que rejeitaríamos [nas negociações do acordo climático]”.
Não é nova a tentativa de modificar a tradicional divisão dos signatários da Convenção do Clima em dois grupos -os países do Anexo 1 (desenvolvidos e economias em transição) e os não-Anexo 1 (mundo em desenvolvimento). Em setembro, a Comissão Europeia aprovou proposta sobre o mecanismo financeiro da Convenção do Clima que partilha a carga da ajuda com as economias avançadas do mundo em desenvolvimento. Na época, o Brasil rechaçou a ideia, alegando que a Convenção do Clima prevê obrigações financeiras de assistência apenas para os países ricos.
Para o Greenpeace, não faz sentido países do porte do Brasil serem tratados similarmente a nações pobres como Bangladesh, tanto em relação a compromissos de mitigação dos gases-estufa como também no acesso ao fundo climático que será criado pelo novo acordo. “O Brasil faz o papel de pobrezinho desde os tempos do barão do Rio Branco”, alfineta Paulo Adário, diretor da campanha da Amazônia do Greenpeace.
Segundo ele, a ascensão econômica do país e sua crescente importância nas negociações internacionais nas áreas de comércio e ambiente demandam atitude mais colaborativa no acordo climático, mesmo na destinação de recursos ao fundo da Convenção. O dirigente do Greenpeace também não vê motivo para o Brasil disputar grandes volumes de dinheiro no fundo.
“A forte queda no desmatamento da floresta amazônica vem sendo alcançada com dinheiro doméstico. Além disso, boa parte dos recursos do Redd irá para o Brasil, que tem o melhor sistema de monitoramento do desmatamento no mundo”, diz Adário, que está em Copenhague sobretudo para acompanhar as negociações do mecanismo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd). O instrumento deverá integrar o regime climático a partir de 2013, valorizando a contribuição das florestas para o equilíbrio do clima global.
Quase um quinto das emissões mundiais anuais proveem do desflorestamento. Por meio do Redd, ações de diminuição no desmatamento e conservação florestal poderão receber incentivos financeiros e até gerar créditos de carbono para facilitar o cumprimento das metas de corte no carbono pelos países desenvolvidos.