O Occupy Wall Street (OWS), segundo sua página na internet, é “um movimento de resistência sem líder, com pessoas de vários gêneros, cores e inclinações políticas”, que “empodera pessoas reais para criar mudança real de baixo para cima”. A falta de líderes nas ocupações, que começaram em Nova York e hoje ocorrem em cerca de 100 cidades americanas, é uma das características mais comentadas do movimento. Para alguns observadores, entretanto, a inovação do OWS não é falta de líder, mas o fato de que qualquer um pode ser líder.
O OWS é um protesto open source em que a liderança é fluida – ninguém tem posição fixa – e limitada – cada um cuida de apenas uma função, diz o blogueiro John Robb. Ele lista alguns elementos que evitam com que surja uma liderança abrangente que controle todo o movimento: o processo de decisão por consenso, a descentralização geográfica, a inexistência de hierarquia e burocracia, a transparência dos processos.
Uma das ativistas que participou da ocupação em Nova York disse que as pessoas confundem a estrutura não hierárquica do OWS com um vácuo de liderança. Segundo ela, não se trata de um movimento sem um líder, mas com vários líderes. A mídia, viciada que é em figuras carismáticas, busca apontar as pessoas mais influentes e visíveis dentro do movimento.
Essa vontade de nomear líderes coaduna com a teoria histórica de que “eventos extraordinários são movidos por indivíduos igualmente extraordinários cuja visão e liderança inspiram e coordenam a ação de muitos”, como escreve o autor e blogueiro Ducan Watts. Mas ele destaca que pensadores como o francês Gustave LeBon – que escreveu sobre a psicologia das multidões –, e o filósofo britânico Isaiah Berlin – que explorou a visão histórica de Leon Tolstoy – apontaram uma visão alternativa da mudança social. “Movimentos bem sucedidos obtêm sucesso por razões outras que a presença de um grande líder, [uma figura] que é tão conseqüência do sucesso do movimento como sua causa”, resume.
Ao explicarmos eventos históricos importantes a partir da ação de algumas poucas pessoas, argumenta Watts, confundimos as verdadeiras causas desses eventos, que são complexas e dependem da ação de muitos indivíduos, cujos nomes não entrarão para a história. Por outro lado, quando analisamos o mundo natural, o elemento detonador de mudanças não é tão importante, pois entendemos que as mudanças dependem de um contexto de condições ambientais de larga escala.
O campo da ciência que se dedica a estudar sistemas complexos adaptativos como ecossistemas e sistemas humanos não foca em líderes para explicar mudanças, mas sim em padrões que emergem de interações entre agentes. Nessa perspectiva, qualquer indivíduo pode ser um agente de mudança local desde que aja de acordo com seu contexto e a estrutura de sua rede. Líderes como os que povoam os livros de história não são provocadores da mudança, mas provocados pela atividade social de seu tempo.
Ducan Watts palpita que o OWS vai acabar apontando seus líderes, não só para poder se comunicar com os que vêem a história como resultado da ação de super-homens, mas porque se quiser crescer e promover mudanças radicais na sociedade, provavelmente acabará desenvolvendo algum tipo de hierarquia. “Líderes, em outras palavras, são necessários, não porque são a fonte da mudança social. Mas porque sua verdadeira função é ocupar o papel que permite que o resto de nós compreenda o que está acontecendo”, escreve.
O fato de que um grande número de indivíduos – líderes em potencial – anda mandando sinais, seja em Wall Street, no Cairo ou em Madri, indica que há mudança em gestação. Como disse o escritor uruguaio Eduardo Galeano, “há um outro mundo na barriga deste mundo, esperando. É um mundo diferente e de parto complicado, não é fácil seu nascimento, mas com certeza pulsa no mundo em que estamos”.