A legislação federal sobre compras públicas sustentáveis ainda atrai pouco interesse de gestores
POR FLÁVIO CARRANÇA
As compras públicas sustentáveis têm sido vistas como um dos mais poderosos instrumentos de incentivo à transição da economia marrom para a verde. No Brasil, apenas as aquisições da administração pública com verbas federais equivalem a 15% do PIB, segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Mas o interesse dos gestores públicos ainda se mostra reduzido.
Faz pouco tempo que o governo federal passou a tratar o tema como política pública. O primeiro mecanismo legal a regular o assunto no âmbito federal foi a Instrução Normativa 1 (IN 1), editada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), em janeiro de 2010.
A norma estabeleceu critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens e contratação de serviços e obras e ganhou ainda mais força com a publicação da Lei no 12.349, de dezembro de 2010, que incluiu o desenvolvimento sustentável como um dos objetivos das licitações públicas, reguladas pela Lei no 8.666/93.
Para incentivar gestores públicos a seguirem as novas regras, foi criada uma plataforma na página do MPOG na internet para a inserção voluntária de editais e contratos sustentáveis realizados por órgãos da administração federal. Contudo, apenas seis editais foram postados na plataforma – um de 2008, dois de 2009 e quatro de 2010 (mais em cpsustentaveis.planejamento.gov.br). Também não há canal público com dados que permitam avaliar o grau de implementação da IN 1.
O MMA informou à reportagem que poderia solicitar as informações ao MPOG, que levaria alguns dias para responder ao pedido. Um bom exemplo da aplicação das regras da IN 1 foi a compra compartilhada de materiais de escritório em setembro de 2010 por oito órgãos federais instalados na cidade do Rio de Janeiro. Além das vantagens ambientais dos produtos adquiridos, o gasto do governo com a compra compartilhada foi quase 50% menor do que o valor estimado na pesquisa de preços antes do pregão, representando economia de R$ 723 mil.
No entanto, a nascente legislação ainda enfrenta questionamentos pesados do setor privado, estratégico para o sucesso dessa política. “A IN 1 contém muitas imprecisões, incorreções e problemas conceituais, o que a torna difícil ou impossível de ser implementada”, critica Nelson Pereira dos Reis, diretor do departamento de meio ambiente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Um dos questionamentos refere-se à menção na IN 1 de atendimento às normas da série ISO 14000 de gestão ambiental para obras e serviços de engenharia. “A adoção da ISO 14001 (certificação mais adotada da série ISO 14000) só alcançou até hoje 5 mil empresas. Isso é muito pouco, quando comparado ao número de companhias que o governo mobiliza para suas compras”, assinala Reis. Superadas as querelas legais, novos desafios estarão colocados para as empresas, que precisarão investir centenas de milhões de reais em adequação ambiental, levando em consideração apenas o estado de São Paulo, prevê o diretor da Fiesp.
“O poder público poderia fomentar novos negócios sustentáveis ao cobrar tributação mais baixa das empresas e sobretaxar produtos inadequados sob os prismas social e ambiental”, afirma Luciana Stocco Betiol, coordenadora do programa Consumo Sustentável do GVces.
Segundo ela, o uso de licitações sustentáveis é previsto em duas leis federais recentes – a Política Nacional de Resíduos Sólidos, de agosto de 2010, e a Política Nacional sobre Mudança do Clima, de dezembro de 2009. Apesar do papel estratégico das compras públicas na economia verde, o Rascunho Zero da declaração final da Rio+20, divulgado em janeiro pela ONU, menciona o tópico apenas de passagem.[:en]A legislação federal sobre compras públicas sustentáveis ainda atrai pouco interesse de gestores
POR FLÁVIO CARRANÇA
As compras públicas sustentáveis têm sido vistas como um dos mais poderosos instrumentos de incentivo à transição da economia marrom para a verde. No Brasil, apenas as aquisições da administração pública com verbas federais equivalem a 15% do PIB, segundo o Ministério do Meio Ambiente (MMA). Mas o interesse dos gestores públicos ainda se mostra reduzido.
Faz pouco tempo que o governo federal passou a tratar o tema como política pública. O primeiro mecanismo legal a regular o assunto no âmbito federal foi a Instrução Normativa 1 (IN 1), editada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), em janeiro de 2010.
A norma estabeleceu critérios de sustentabilidade ambiental na aquisição de bens e contratação de serviços e obras e ganhou ainda mais força com a publicação da Lei no 12.349, de dezembro de 2010, que incluiu o desenvolvimento sustentável como um dos objetivos das licitações públicas, reguladas pela Lei no 8.666/93.
Para incentivar gestores públicos a seguirem as novas regras, foi criada uma plataforma na página do MPOG na internet para a inserção voluntária de editais e contratos sustentáveis realizados por órgãos da administração federal. Contudo, apenas seis editais foram postados na plataforma – um de 2008, dois de 2009 e quatro de 2010 (mais em cpsustentaveis.planejamento.gov.br). Também não há canal público com dados que permitam avaliar o grau de implementação da IN 1.
O MMA informou à reportagem que poderia solicitar as informações ao MPOG, que levaria alguns dias para responder ao pedido. Um bom exemplo da aplicação das regras da IN 1 foi a compra compartilhada de materiais de escritório em setembro de 2010 por oito órgãos federais instalados na cidade do Rio de Janeiro. Além das vantagens ambientais dos produtos adquiridos, o gasto do governo com a compra compartilhada foi quase 50% menor do que o valor estimado na pesquisa de preços antes do pregão, representando economia de R$ 723 mil.
No entanto, a nascente legislação ainda enfrenta questionamentos pesados do setor privado, estratégico para o sucesso dessa política. “A IN 1 contém muitas imprecisões, incorreções e problemas conceituais, o que a torna difícil ou impossível de ser implementada”, critica Nelson Pereira dos Reis, diretor do departamento de meio ambiente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Um dos questionamentos refere-se à menção na IN 1 de atendimento às normas da série ISO 14000 de gestão ambiental para obras e serviços de engenharia. “A adoção da ISO 14001 (certificação mais adotada da série ISO 14000) só alcançou até hoje 5 mil empresas. Isso é muito pouco, quando comparado ao número de companhias que o governo mobiliza para suas compras”, assinala Reis. Superadas as querelas legais, novos desafios estarão colocados para as empresas, que precisarão investir centenas de milhões de reais em adequação ambiental, levando em consideração apenas o estado de São Paulo, prevê o diretor da Fiesp.
“O poder público poderia fomentar novos negócios sustentáveis ao cobrar tributação mais baixa das empresas e sobretaxar produtos inadequados sob os prismas social e ambiental”, afirma Luciana Stocco Betiol, coordenadora do programa Consumo Sustentável do GVces.
Segundo ela, o uso de licitações sustentáveis é previsto em duas leis federais recentes – a Política Nacional de Resíduos Sólidos, de agosto de 2010, e a Política Nacional sobre Mudança do Clima, de dezembro de 2009. Apesar do papel estratégico das compras públicas na economia verde, o Rascunho Zero da declaração final da Rio+20, divulgado em janeiro pela ONU, menciona o tópico apenas de passagem.