Duas décadas atrás, o Canadá era visto como líder na área ambiental, sediou a conferência que originou o Protocolo de Montreal para conter gases que destroem a camada de ozônio e, na figura de Maurice Strong, coordenou a Rio 92. Os relatos são de que nessa Rio+20 que acaba de terminar o país nada mais fez do enfraquecer qualquer tentativa de aprovar compromissos, inclusive votando contra um tratado de proteção de águas internacionais. Ao final do encontro, o ministro do Meio Ambiente canadense, Peter Kent, disse estar “muito contente, muito satisfeito” com os resultados.
A posição do governo do conservador Stephen Harper destoa das convicções de muitos no Canadá, país que detém uma vasta área de floresta boreal e que deu origem a um dos mais emblemáticos movimentos em favor do meio ambiente, o Greenpeace. Há alguns anos, entretanto, o Canadá vive um boom em uma das formas de energia mais sujas existentes, o petróleo de areias betuminosas (veja aqui imagens da Nasa que mostram as mudanças na região produtora de 1984 a 2011) .
Além disso, o país quer capitalizar o apetite por recursos na Ásia e espera que o desbloqueio de rotas marítimas no Ártico – devido às mudanças climáticas – permita a exportação de vastas quantidades de minérios. Para facilitar a empreitada, o governo apresentou uma revisão da legislação ambiental com vistas a acelerar avaliações ambientais, limitar a participação pública nas consultas, diminuir a proteção de habitats e espécies ameaçadas, entre outras medidas. A revisão, embutida em uma lei orçamentária, foi aprovada há cerca de 10 dias pelo parlamento.
Com menos obstáculos a frente, a intenção é acelerar a construção de oleodutos para carregar o petróleo da província de Alberta para a costa oeste. Um dos projetos em análise prevê aumentar a capacidade do oleoduto que liga as regiões produtoras a Vancouver, considerada a cidade com a mais alta qualidade de vida do mundo. Outro, o Northern Gateway Pipeline, prevê a construção de dois dutos paralelos ao longo de 1.170 km para carregar até um milhão de barris de petróleo por dia, passando por um delicado ecossistema aquático no interior do estado de British Columbia.
Nos últimos meses oleodutos existentes sofreram uma série de derramamentos – no caso do petróleo de areia betuminosa a remediação é mais difícil do que em acidentes com óleo leve. Os derramamentos elevam a rejeição popular aos oleodutos – embora a maioria dos canadenses, segundo as pesquisas, declarem-se a favor da exploração das areias betuminosas – e, na costa oeste, a indústria e o governo terão de enfrentar comunidades aborígenes e a população de British Columbia, considerada uma das províncias mais liberais do Canadá.
“É uma justiça poética que Vancouver, o local de nascimento do Greenpeace, esteja entre o último grande deposito de óleo da Terra e os mercados em expansão da Ásia”, disse o ambientalista Ben West ao The New York Times. “Minha previsão é de que levará anos para que [o oleoduto] seja construído”.
Apesar da crescente oposição, o governo quer garantir o escoamento da produção, prevista para crescer de 2 milhões para 3,3 milhões de barris por dia até 2020. E mesmo que demore anos, Harper parece decidido a transformar não só a economia do Canadá, mas sua imagem perante a comunidade internacional.