Poucos dias antes de sua cerimônia de posse, Barack Obama parece ter definido o tema de seu segundo mandato: o controle de armas. As indicações são de que o presidente está mais do que disposto a enfrentar o lobby da National Rifle Association. Outras brigas ainda estão de lado, especialmente a batalha para iniciar algum processo de mitigação das mudanças climáticas.
Apesar do caráter sangrento e horrível das chacinas que a desregulamentação do posse de armas permite nos EUA, pode-se traçar um paralelo entre essa questão e os efeitos que as mudanças climáticas terão sobre as futuras gerações.
“Nos próximos dias, eu pretendo usar todo o peso que o meu cargo tenha para tornar (as regras mais duras para o posse de armas) uma realidade”, disse o presidente. “Se há pelo menos uma vida que pode ser salva, então temos a obrigação de tentar”.
A determinação de Obama em garantir a segurança das crianças americanas é admirável. E leva à questão: por que o presidente não se sente obrigado a proteger todas as crianças cujo futuro está em risco devido às mudanças do clima causadas pela emissão de gases de efeito estufa para manter uma economia em eterno crescimento.
A Casa Branca, segundo a imprensa americana, enxerga uma brecha política para enfrentar o lobby das armas depois da tragédia de Newtown, onde mais de 20 alunos da escola elementar Sandy Hook foram assassinados. Ė de se perguntar se a seca que domina a maior parte do território americano, os prejuízos causados pelo furacão Sandy e a confirmação de que 2012 foi o ano mais quente da história dos EUA não abrem brecha suficiente para que o presidente enfrente o lobby contra a ação climática.
Alternativas para lidar com o problema não faltam e nas últimas semanas a mídia americana tem debatido uma, em particular, que abriria a porta para que os EUA enfrentasse nao só o abismo climático, mas o fiscal. Um imposto nos moldes Pigouvianos ajudaria a direcionar a economia para um caminho de baixo carbono e geraria recursos para o governo federal.
A ideia, claro, nao é nova. O economista britânico Arthur Cecil Pigou viveu de 1877 a 1959 e elaborou o conceito de externalidade. Ou, como explicou artigo recente no The New York Times, “as coisas que fazemos que afetam outros e que o mercado é incapaz de precificar”. Uma externalidade negativa é o equivalente a ir jantar fora com três amigos e, sabendo que vai pagar apenas um quarto da conta, pedir um prato bem caro. “Pigou disse que há tantas coisas danosas que fazemos – ouvir música alta, dirigir agressivamente –, que provavelmente faríamos menos se tivéssemos que pagar por elas”.
A lógica é tão simples que até o economista N. Gregory Mankiw, que foi assessor de George W. Bush e do candidato republicano Mitt Romney, defende a adoção de impostos Pigouvianos. Defensores de um imposto sobre o carbono citam a Irlanda como um caso de sucesso. Fortemente abalado pelos efeitos do estouro da bolha imobiliária em 2007, o país está em franca recuperação econômica desde que aprovou um imposto sobre o carbono que gera não só verbas para o governo como bons resultados ambientais.
O artigo do The New York Times questiona se os impostos Pigouvianos funcionam para qualquer tipo de ação danosa, e lembra que a economia não oferece critérios objetivos para que decidamos quais externalidades taxar e quanto taxar. “Ainda assim, nas últimas semanas, tem havido uma intensa discussão entre alguns economistas sobre uma externalidade em particular: o custo social do porte de armas”, diz o autor.
Embora estimativas coloquem esse custo entre 100 e 1800 dólares por arma, nem toda arma causa danos à sociedade. Alguns economistas defendem, entretanto, que um imposto sobre a compra de armas seria mais eficaz em quebrar o impasse político sobre a questão do que um aperto na regulamentação.
O argumento, pelo jeito, não convenceu o presidente. O pacote legislativo e a série de medidas executivas que Obama anunciou na quarta-feira visam apertar o controle sobre os tipos de armas disponíveis no mercado e quem pode ter acesso a elas. Impostos continuam engavetados, tanto no caso das armas, como no do clima. A disposição do presidente de encarar o nó do controle de armas é louvável, e o lobby da National Rifle Association se diz preparado para “a luta do século”.
Oxalá Obama esteja só esquentando as baterias para enfrentar um lobby ainda mais duro e atacar o problema do século