Olha isso!
Em 1980, um estudo publicado no Journal of Public Economics realizou 12 experimentos para identificar a tendência de pessoas ao comportamento que a Economia chama de “carona” (free riding). Em 11 desses experimentos, que variaram elementos do jogo submetido aos voluntários (estudantes do Ensino Médio de Madison, em Wisconsin, EUA), o comportamento de carona foi menos observado que seria esperado pela literatura. No 12º experimento, entretanto, o comportamento finalmente ficou evidente. A diferença? Este último foi realizado entre estudantes de Economia da Universidade de Wisconsin.
Frequentemente nesta coluna apresento alguns resultados surpreendentes, ou no mínimo curiosos, de experimentos de psicologia comportamental, mostrando um pouco da nossa capacidade de autoengano, dos nossos inúmeros vieses cognitivos e da irracionalidade (previsível, complementa Dan Ariely) que acompanha o comportamento humano. Os estudos seguem metodologias consagradas, e o trabalho passa pela revisão dos pares. Do ponto de vista da ciência, esses trabalhos poderiam ser aceitos como descrições razoáveis da realidade. Mas seriam elas descrições universais do comportamento humano?
Pesquisa publicada no periódico Behavioral and Brain Sciences argumenta que não. Fazendo uma revisão sistemática da literatura empírica sobre economia, psicologia e ciências cognitivas sob aspectos do comportamento humano considerados universais, uma informação saltou de cara ao analisar o perfil dos voluntários envolvidos nos experimentos: 96% deles vêm de países industrializados do Ocidente (sendo 68% apenas dos Estados Unidos).
Apropriadamente intitulado “Weirdest people in the world?” (As pessoas mais estranhas do mundo?), o trabalho então buscou fontes de dados disponíveis comparando o comportamento desse grupo de pessoas, batizadas de Weird – Western, Educated, Industrialized, Rich, and Democratic (Ocidentais, educadas, industrializadas, ricas e democráticas) –, com o de vários outros grupos: ocidentais industrializados vs não ocidentais industrializados, americanos vs demais ocidentais, americanos com vs sem diploma universitário, universitários vs adultos fora da universidade etc.
Os resultados indicam grande variabilidade entre os diversos grupos pesquisados, sendo os Weird frequentes outliers (casos anômalos, pontos fora da curva). Isso invalidaria as pesquisas publicadas cujos voluntários tinham esse perfil? Não, mas indica que elas não podem a priori generalizar suas conclusões como um comportamento humano universalmente esperado, a não ser que o mesmo experimento seja conduzido também em outros lugares, ou utilizando uma amostra (muito) mais socialmente diversa.
Assim como em muitas outras esferas das relações humanas, a ciência (e, por tabela, as nossas universidades) também só tem a ganhar ao abraçar a diversidade como um valor desejado.
*Doutor em Administração Pública e Governo pela FGV-SP