A restauração de paisagens degradadas gera empregos, renda e arrecadação de impostos. Mas ainda é necessário disseminar informação científica e técnica de qualidade, além de desenvolver incentivos econômicos para os produtores
Em todo o planeta, mais de 1 bilhão de hectares degradados – uma área maior do que o Brasil – oferece oportunidades de restauração. Os bens naturais e serviços ecossistêmicos são, com frequência, vistos como externalidades no contexto econômico e não entram, como deveriam, no “fluxo de caixa” da produção, tampouco em índices usados para medir economias globais e desenvolvimento humano.
Se o atual modelo econômico não for revisto, as externalidades negativas da degradação ambiental recairão sobre a sociedade, como já tem ocorrido – basta observar as últimas tragédias e catástrofes ambientais relacionadas à mudança climática.
A solução da crise econômico-financeira global que perdura desde 2008 está na adoção de um novo modelo econômico em que a restauração da vegetação nativa tem destaque. A recuperação dos ecossistemas degradados poderá constituir em uma nova atividade econômica, fortalecer as cadeias extrativistas já existentes e expandir a oferta de serviços ecossistêmicos já escassos em várias regiões do mundo, como purificação de água, mitigação da mudança climática e conservação do solo.
O Brasil poderia estar em uma posição privilegiada para iniciar a transição rumo a uma economia de baixo carbono. O cumprimento do Acordo de Paris tem potencial de gerar centenas de milhares de empregos no País, valorizar o capital natural e movimentar cadeias produtivas fundamentais.
Em oposição ao recente recuo dos EUA, várias nações, governos subnacionais e empresas reafirmam seus compromissos com o Acordo de Paris; os brasileiros têm a chance de assumir um papel de liderança global nesse desafio – tanto pela relevância que o País possui na agenda climática quanto pela sua capacidade de encontrar boas soluções.
Durante o Acordo de Paris, o Brasil se comprometeu a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em 43% (em relação aos níveis de 2005) até 2030. Isso seria feito por meio de ações como zerar o desmatamento ilegal na Amazônia, restaurar 12 milhões de hectares de florestas, garantir o cumprimento do Código Florestal e aumentar a eficiência agropecuária.
A restauração de paisagens degradadas gera empregos, renda e arrecadação de impostos. Mas ainda é necessário disseminar informação científica e técnica de qualidade, além de desenvolver incentivos econômicos para os produtores realizarem a restauração.
No livro A Economia da Restauração Florestal, que acaba de ser lançado durante a 7ª Conferência Mundial sobre Restauração Ecológica, em Foz do Iguaçu, no Paraná, a The Nature Conservancy (TNC) demonstra que o custo de restauração de um hectare na Mata Atlântica pode variar enormemente, entre a técnica mais simples e a mais complexa. Há caminhos para se reduzir o custo da restauração, ao mesmo tempo em que se pode gerar emprego e renda em áreas restauradas.
A recuperação de biomas degradados pode trazer mais de 1/3 da absorção de carbono de que o mundo precisa para alcançar os compromissos do Acordo de Paris. Um de muitos exemplos que a TNC participa é o Projeto Conservador da Mantiqueira, liderado pelo município de Extrema (MG) e no qual a organização e parceiros trabalham para viabilizar a restauração de 1,2 milhão de hectares, que corresponde a 10% da Contribuição Nacionalmente Determinada brasileira (NDC, na sigla em inglês).
O Brasil tem a oportunidade de ser líder nesses novos rumos que o Acordo de Paris trouxe ao mundo. Atitudes como aderir ao Desafio de Bonn, que tem como meta restaurar 150 milhões de hectares até 2020, e o recém promulgado decreto federal, que cria a Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, evidenciam que estamos na busca de modelos inovadores de desenvolvimento econômico – e não apenas na busca do combate ao desmatamento, ou da recuperação da vegetação nativa.
Outro aspecto que pode contribuir é a intensificação sustentável da agropecuária, a qual pode ser uma aliada da restauração da vegetação nativa, suprindo a demanda de alimentos da sociedade ao mesmo tempo que libera áreas menos aptas à produção para a restauração da vegetação, como tem ocorrido em algumas regiões do Espírito Santo, Norte do Pará, entre outras. A restauração pode gerar milhões de empregos no mundo e prover renda, principalmente em comunidades rurais e marginalizadas, contribuindo para a transição econômica e inserção social que o mundo tanto carece.
Ações na prática de restauração da vegetação nativa ocorre ainda de maneira muito difusa e com gestão deficiente dos processo. Entretanto, há claros sinais de avanços recentes. Exemplos disso são sistemas de gestão de banco de áreas em restauração, como os Sistemas Integrados de Restauração da TNC, que contribuíram para a formação do Sistema de Gestão Espacial do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica e do Portal do Programa Reflorestar no Espírito Santo. Esses sistemas facilitam a operacionalização do cadastramento de áreas em restauração e aumentam a gestão de projetos de restauração em até 400%. Eles contribuirão para saber a quantidade de hectares em processo de restauração no Brasil e entender sua distribuição geográfica, assim como contribuirá para um sistema de monitoramento eficiente.
Se consideramos que a ciência da restauração é relativamente recente e muito tem se aprendido e desenvolvido nos últimos anos, o cenário é promissor, uma vez que tecnologias inovadoras começam a ser empregadas e os custos de restauração tendem a ser decrescidos em função do ganho de escala e da adoção de técnicas mais eficientes.
* Rubens de Miranda Benini é Gerente da Estratégia de Restauração da The Nature Conservancy Brasil e um dos autores do livro Economia da Restauração Florestal